quarta-feira, dezembro 26, 2007

Tem músicas das quais a gente não gosta numa primeira escutada
Aí então a gente ouve de novo
e ela se incorpora e toma forma na nossa alma
Mas para percebê-la era preciso estar com os sentidos dispostos

Porque senão seria apenas mais uma canção
que a gente não guarda no coração, não lembra na madrugada
que fica, com toda sua beleza e graça, cantarolando sozinha no ar
cantando até se acabar
porque ninguém a pôs de novo pra tocar.
Às vezes pego os anseios do futuro
e os sinto como se fossem recordações
é um tal convencimento das ilusões
que me faz tomar premonições por antigos acontecimentos

Nunca vi maior fingimento
Fazer do desejo que nunca aconteceu
Um retrato na estante

Mas, não são anseios, lembranças e sonhos
coisas semelhantes?

segunda-feira, dezembro 24, 2007

Sobre as coisas que eu não considero importantes

Eu não considero o natal importante. Nem colação de grau. E tive que ouvir boas broncas nessa semana por não dar a mínima pra esses dois eventos. Foram broncas das boas, que me fizeram rever algumas das minhas convicções.

Está certo. Eu admito. Deixei de gostar do natal desde que aprendi essas coisas sobre a celebração do consumismo na adolescência através das bandas de rock. É verdade, eu virei ateísta desde que me deparei com a tal da dúvida que move todos os debates filosóficos na faculdade. E, no meu caso, a dúvida levou ao ateísmo. Daí eu não me emociono mais ao ver um presépio, eu passei a odiar ouvir Simone cantando uma versão brasileira Herbert Richards de "What a wonderful world", eu não sinto vontade de dizer Feliz Natal, etc etc etc...

Agora vamos à colação de grau. Eita negocinho sem graça dos infernos. Eu fui ver a colação de uma amiga, mas pense na zuada, naquela ruma de gente gritando, e apitando, e o calor, a falta de cadeiras pra sentar... PUTA QUE PARIU ODIEI EIN. Também já vendi rifas pra festinha de formatura, e odiei igualmente encher o saco dos outros pra vender rifa de DVD, MP4, a porra... E PIOR, passar a manhã inteira debaixo do sol numa feira de roupas usadas!!! Resultado: desisti dessas celebrações de formandos... Pra colação de grau não vou nunca mais, nem pra minha! E acabei não indo para a de outra aminha minha que colou grau recentemente.

Bem, mas, como havia dito anteriormente, eu tive que rever isso tudo. Está certo que o natal não é importante pra mim, mas e se minha mãe quer que eu esteja com ela nesta data? E se ela quiser que eu vá à missa com ela? Fazer o quê? E a minha amiga, que fez a colação e eu não compareci, passou uma hora me dando sermão porque não fui. Só quando vi os olhos dela cheios de lágrimas, que não chegaram a sair, é que me dei conta do quanto aquilo era importante pra ela. "Eu passei dois anos planejando tudo isso", disse, indignada.

É, se era importante o natal pra minha mãe e a colação de grau pra minha amiga, eu também deveria dar a devida importância em respeito a elas. Lembrei-me de quando eu me apresentei no colégio na quadrilha... Recordo que chorei porque queria muito que ela estivesse lá, mas ela não considerava importante...

quarta-feira, dezembro 19, 2007

O remorso da ausência
é saber que é tudo culpa minha

terça-feira, dezembro 11, 2007

Tal mãe, tal filha

Para a minha mãe eu gostaria de dedicar todos os sonhos que ela não realizou em si mesma
e realizou em mim

Mãe, obrigada por tudo
Desculpa se às suas expectativas todas,
Eu não atendi

Pelo que eu não fiz, me perdoa como se perdoa a si mesma
E por tudo que fiz,
Viva como se pertencesse a ti.

terça-feira, dezembro 04, 2007

Não adianta. Eu tenho a leve impressão de que a gente sabe, desde o primeiro encontro, se vai se apaixonar por alguém. Não que a gente se apaixone assim, de cara, mas é aquele lance de "alguma coisa acontece no meu coração..." Há alguma forma de encantamento, uma vontade de estar junto, uma admiração repentina... E se isso não ocorrer desde a primeira vez, não ocorrerá nunca mais. Podem até passar juntos meses, anos, mas nunca será como a paixão que toma a gente por inteiro.

E de cara é possível perceber, assim, que este será só mais um caso... É interessante aproveitar os casos na sua autêntica forma. Apreciar a aventura que o amor romântico não oferece: conhecer novas pessoas, mesmo que superficialmente, encanta. Não superficialmente no sentido pejorativo da palavra, mas entenda que trata-se de se deleitar com os pequenos gestos do outro que logo irá partir, ou você irá partir, entenda que é tudo pela efemeridade. E a efemeridade nada tem de inferior à "eternidade" prometida no amor romântico. A efemeridade é apenas a falta de promessas. Há também beleza nisso, pois há beleza até naquilo que não se tornou uma grande paixão. E é uma beleza simples, às vezes até nem permanece na memória.

Dá pra saber que eu nunca vou me apaixonar por você. Dá pra saber que eu nunca ia me apaixonar por você. Dá pra saber que eu ia me apaixonar por você.

Dá pra saber, mas, no fim de tudo, aquilo que não se tornou amor, o que não doeu nem trouxe tanta felicidade, o que não mereceu uma música, um porre no bar, uma declaração no meio da praça, o que não dá nem saudade, tem a sua própria beleza. A beleza do que, na vida, não teve muita importância. E boa parte da vida é feita do que não tem tanta importância.

terça-feira, novembro 27, 2007

Aprendo mais com abelhas do que com aeroplanos.
É um olhar pra baixo que eu nasci tendo.
É um olhar para ser menor, para o
Insignificante que eu me criei tendo.
O ser que na sociedade é chutado como uma barata - cresce de importância para o meu olho.
Ainda não entendi porque herdei esse olhar para baixo.
Sempre imagino que venha de ancestralidades machucadas.
Fui criado no mato e aprendi a gostar das coisinhas do chão- antes que das coisas celestiais.
Pessoas pertencidas de abandono me comovem:
tanto quanto as soberbas coisas ínfimas.

Manoel de Barros

segunda-feira, novembro 26, 2007



Câmeras fográficas, repórter maquiada se preparando pra ser filmada, mais jornalistas do que público. Tudo isso pra assistir a uma exposição de xilogravuras financiada pelo Programa BNB de Cultura, e apoiada pela Secretaria de Cultura do Estado. Tratavam-se de xilogravuras feitas por crianças e adolescentes de escolas públicas residentes em pequenos municípios de Sergipe. Os meninos e meninas estavam lá para presenciar a exposição, que mais parecia palco para personalidades "importantes" desfilarem a sua enorme estima pelas autênticas manifestações culturais do povo brasileiro. As paredes da biblioteca que abrigava a exposição estavam repletas de xilogravuras produzidas por crianças e adolescentes que aprederam em alguns poucos meses as técnicas milenares da xilogravura mescladas à tradição da literatura de cordel.

Eu estava lá para escrever uma matéria de assessoria de imprensa, e tinha a impressão de que já tinha visto cenas parecidas em outros lugares: mais jornalistas, mais grandes personalidades do que público em si, do que gente que foi ali só pra dar uma passada. Observava os fotógrafos tentando disfarçar nas imagens que ali havia pouquíssima gente. E eu tinha que fazer o meu papel de repórter, então dirigi-me a um pirralho pra lhe perguntar sobre sua xilogravura.

- E aí, o que você quis retratar nesse desenho?

- Moça, na verdade eu queria fazer um retrato da minha mãe, só que não deixaram. Disseram que era pra fazer alguma coisa de cultura popular.

domingo, novembro 25, 2007

Na solidão reconheço a minha imagem no espelho
E me beijo e me beijo
Como quem se apaixona por si mesma
Mas não é por mim essa paixão
É, sim, pela própria solidão
Pela ausência de estar toda para o mundo
Pela indecência de poder ser tudo o que há
E muito mais

Eu quero estar só
Para poder ser tudo ao mesmo tempo
Eu quero estar só
Distante dos cartórios, dos livros assinados
Das dívidas eternas
Das falsas promessas
Porque só consigo prometer a mim mesma
O que nunca vou cumprir
Que talvez agora eu esteja aqui
Um dia ali
E confesso que só quero o que não me mantém aqui ou ali

Promiscuidade dos lugares, dos sentidos, das emoções
Promiscuidade por sons, toques, cheiros, sensações
Em mim tudo o que permanece
É ânsia, somente ânsia
Nada além da ânsia

- Nem sequer as lembranças.
Decerto que as lembranças em mim nada são além do vagar pelo tempo devido a tanta ânsia.
Esta mesma ânsia que, quando estou aqui, me faz querer ir a outro lugar
Esta mesma ânsia que me faz partir sempre com o desejo de voltar
E a minha grande aventura, a minha eterna vontade
É ser para sempre
toda ânsia e saudade.

- Sou toda ânsia e saudade.

sexta-feira, novembro 09, 2007

Surpresas musicais


Surpresa número 1- Quando meu irmão, menino fanático por Radiohead por influência minha, veio me dizer que a banda tinha lançado CD novo, e que esse CD poderia ser adquirido por preço determinado pelo consumidor através do site do Radiohead, eu só pensei numa coisa: legal. Isso, legal, apenas. Na verdade, eu achava que o CD seria um albunzinho mais ou menos, nada comparado a um OK Computer da vida. Ora ora, na minha crença bandas boas vão ficando cada vez mais fraquinhas com o passar do tempo, e seu destino é ou terminar por intriga dos músicos ego-inflados, ou acabar porque o vocalista morreu de overdose, para então essas tão maravilhosas bandas ficarem na nossa memória como algo sagrado.
Esse não parece ser o caso do Radiohead. Esse é uma grupo que fica melhor a cada dia que passa. Escuto o som dos caras desde meus 16 anos, e já estou com 22, e mesmo assim eles não têm uma obra falida ou que perdeu a graça. Muito pelo contrário, esse novo álbum, o In Rainbows, me soa como o melhor CD que o Radiohead já fez. As músicas têm muito, mas MUITO feeling, e parecem ter sido feitas numa convulsão de idéias de seus autores. São músicas intensas, bastante intensas, tanto nas letras quanto nos arranjos, e há uma confluência entre essas duas intensidades.

Só digo uma coisa: por mim o Radiohead ficava assim, lançando álbuns novos sempre melhores até eu ficar bem velhinha.

Surpresa número 2- A primeira vez que ouvi falar do Sean Lennin foi na MTV, e sei que foi algo como "ele coloca elementos de bossa nova nas músicas, ele é fã do Tom Jobim". É isso. Pra mim ele era só o filho do John Lennon. Tá, ele era o filho do John Lennon que gostava de música brasileira. Pronto. No mais, não passava do filho de alguém famoso, que nem Sandy e Júnior, que nem Vanessa Camargo, que nem Maria Rita. E eu tenho um preconceito SERÍSSIMO contra filhos de famosos. Porque pra mim eles não passam de filhos de famosos, ou, pra ser mais exata, impostores.
Mas aí eu tava hoje ouvindo rádio, que eu tinha deixado de ouvir há muito tempo, mas agora retomei o costume por estar trabalhando na Fundação Aperipê, que abarca rádios Aperipê AM e FM, além da Aperipê TV. Pois bem, então eu estava ouvindo a Aperipê FM, e no programa Especial das 10, que traz parte da discografia de um único artista durante todo o programa, o homenageado de hoje era Sean Lennon. Depois de já ter ouvido uma música, e gostado muito por sinal, é que soube que o artista era o bendito filho de John Lennon. Ainda bem, porque senão eu simplesmente teria desligado o rádio e ido dormir ou fazer qualquer outra coisa que não fosse ouvir um suposto impostor. Mas o cara é muito mais do que o filho de John Lennon, ele é bom mesmo, sim. Até estou no momento baixando alguns álbuns dele.

Foi bom porque aprendi: nunca subestime o talento de filhos de artistas famosos. Quem sabe né?




quinta-feira, novembro 08, 2007

Toda religião é uma forma cretina de explicar o mundo
Toda paixão é uma forma cretina de admirar
e admirar é tomar distância das coisas do mundo

Mas eu preciso de admiração
eu preciso de uma religião
um ofício, uma arte, um alguém
algo que me dê paixão

Eu quero trabalhar
na mais nova e grande idéia
Eu quero participar
da insurreição de quem vive na miséria
Eu quero a revolução

Toda revolução é envolvida por paixão
E toda paixão é uma revolução
dos sentidos
Mas o que sinto é uma grande vazio
incorporado
esse vazio incorporado na forma de tédio
- e ó tédio na forma de verbo-

Eu olho para as ruas e vejo que é tudo sempre igual
Eu olho para as caras e não vejo nada de especial
Meu grande amor não está por aí
A canção que ouço não é a canção que eu fiz
O ônibus do trabalho não viaja para onde eu quero ir
O céu está enevoado e deus eu nunca vi

Todos os deuses morreram
e essa é a minha perdição
Para viver é preciso ter deuses
-mas foi pelos deuses que eu sempre vivi!-
Pois quando eu disse: deus está morto
eu matei foi a mim.

domingo, novembro 04, 2007

Coisas que tenho de fazer antes de morrer...

- Ir a um show do Radiohead.

- Conhecer a França.

- Visitar um templo budista.

- Subir uma montanha.

- Pular de pára-quedas.

- Viajar de trem pela Europa. Tomar um café quentinho e observar pela janela do trem a bela vegetação e sentindo frio.

- Andar de barco nas ruas de Veneza.

- Passar um ano numa aldeia hippie.
Minha mãe sempre reclama que saio muito, que não sabe o que tanto faço na rua, que não paro quieta num lugar, etc etc etc. Mas aí, justifico:

- Ô mãe, num mundo grande desse, eu vou ficar presa entre as quatro paredes de uma casa? Se pudesse eu ia bem mais longe...

sábado, novembro 03, 2007

Minha cachorra parece criança. Se cai um biscoito no chão, ela vai correndo pegar, se meu irmão facilita e deixa um hamburger dando bobeira em cima da mesa, ela sobe no banco e come o hamburger. Agora, se eu deixo cair um pouco de salada, ela dá uma cheiradinha, e tchau, BEIJOS, ela ignora a salada.

Nude

Don't get any big ideas
They're not gonna happen
You paint yourself white
And feel up with noise
But there'll be something missing

Now that you've found it, it's gone
Now that you feel it, you don't
You've gone off the rails

So don't get any big ideas
They're not going to happen
You'll go to hell for what your dirty mind is thinking
Sometimes thom adds this verse when performing:
She stands stark naked and she beckons you to bed
Don't go, you'll only want to come back again

by Raiohead

sexta-feira, novembro 02, 2007

Família pós-moderna

Gente, então de repente eu me sinto culpada porque só vivo no msn e não tenho conversado tanto com minha mãe e tals, aquela coisa de, nossa, antigamente as famílias se reuniam na porta de casa, na sala de estar pra falar coisas sobre o céu, a Terra, a água e o ar. Aí chego pra minha mãe, que acabara de preparar o seu hamburger "pós-moderno", e digo:

- Ô mãe, senta aqui, vamos jantar juntas, vamos conversar...

- Eu não, tô indo ver a novela.

Da minha tara por GAYS

Gentém, ok, eu tenho tara por gays, como o título acima mesmo diz. Gosto de ver homens se beijando, essas coisas. Não, o pior é que tenho uma certa tendência a me interessar por homossexuais. Sinto atração por aqueles caras um tanto quanto afeminados... Nenhum problema, vocês gays entendam uma coisa: ser gay é coisa do passado, é too narrow-minded, too conservative (ok, aprendi no cursinho de inglês).

Minha gente, as pessoas hoje em dia são todas bissexuais, não tem ninguém hetero nem homo não!

HETEROS SÃO CONSERVADORES!

HOMOSSEXUIAIS SÃO ULTRAPASSADOS!

quinta-feira, novembro 01, 2007

Uma das coisas mais escrotas que já vi na vida foi meu avô contando uma piada. Era assim: um cara foi à missa e o padre disse que o casamento era um santo sacramento, eterno, FOREVER, etc. Nisso o tal cara era casado há 5o anos. Então ele convida o padre para passar uma semana em seu querido lar.

Logo no primeiro dia, o cara serviu um delisioso prato ao padre, para a felicidade do sacerdote. Entretanto, a satisfação do religioso não demorou muito, pois durante todos os dias o anfitrião sempre lhe servia a mesma comida, até que o santo homem não aguentou:

- Essa comida é muito boa, mas assim também não dá. Só como a mesma coisa há dias!

- Ah é, padre? Então imagine passar 50 anos comendo a mesma coisa!

Enfim. Meu avô contou essa piada pra mim, quando eu ainda era criança, bem na frente de minha avó, e na época em que eles comemoravam suas bodas de ouro.

Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa

Enquanto uns caras até "se apaixonam" de tanta vontade que têm de fuder com uma determinada garota, algumas meninas inventam que estão apaixonadas e querem ter sempre um namorado a tira colo pra ter aquela boa e velha foda certinha.

Minha gente, sem eufemismos ok!
Já senti saudade, já fiz muita coisa errada, já dormi na rua, já pedi ajuda

quarta-feira, outubro 31, 2007

Tradução da cartinha... é bem simples, coisa de inciante mesmo!

Querida amiga,

Eu vou partir em breve para o Brasil. Espero meu avião para retornar ao meu país. Acho que minha estadia na França foi magnífica. Eu visitei muitos lugares e adorei principalmente as discotecas, pois adoro sair à noite e dançar, divertir-me. Visitei o museu e vi um Monet. Você me conhece e sabe que eu adoro observar quadros.

Um dia eu fui à praia e encontrei vários brasileiros lá. Amiga, eu amo a França, mas há um pequeno problema: eu não vi o sol! Mas as pessoas são agradáveis e a França é um bom lugar para morar. Há muitas coisas pra fazer por aqui!

Acho que voltarei à França no próximo verão. Talvez eu viverei aqui, mas não sei, pois adoro o Brasil também, e minha família e meus amigos moram lá. É a vida!

Gostaria que você viesse ao Brasil um dia. Nós poderíamos ir à praia, comer uma refeição brasileira... A cultura do meu país é formidável!

Eu te espero, e retornarei um dia...

Um abraço,

Tatiana.

segunda-feira, outubro 29, 2007

Chère amie,

Je vais partir tout de suite au Brésil. J'attends mon avion pour rentrer dans mon pays. Je pense que mon séjour en France a été magnifique. J'ai visité beaucoup de places et j'ai aimé sourtout les discotèques parce que j'aime sortir au soir et danser, m'amuser. J'ai visité le musée et j'ai vu un Monet. Tu me connais et tu sais que j'adore observer les tableaux.

Un jour, je suis allée à la plage et j'ai rencontré beaucoup de brésiliens là bas. Amie, j'aime la France, mais il y a un petit problème: je n'ai pas vu le soleil! Mais les gens sont agréadables et la France est une bonne place pour vivre. Il y a beaucoup de choses à faire ici!

Je pense que je vais retourner en France l'été prochain. Peut-être je vais vivre ici, mais je ne sais pas, parce que j'aime le Brésil aussi, et ma famille et mes amis habitent là bas. C'est la vie!

Je voudrais que tu viennes au Brésil un jour. Nous pouvons aller à la plage, manger un repas brésilien... La culture de mon pays est formidable!

Je t'attends et je vais retourner un jour...

Je t'embrasse,

Tatiana.

Minha primeira carta em francês. Tudo fantasia, claro, nunca fui à França!

domingo, outubro 28, 2007

Humf!


Então você percebe, numa noite de domingo sem sentido, que não há ninguém que te tire do sério. E incrivelmente você sabe, que por mais que você esteja mais recatada nas emoções, por mais que, na verdade, você não esteja a fim de se apaixonar, ainda resta alguma coisa dentro de você que quer perder os brios. Mas logo passa...

Se bem que acho bonito se melar que nem criança ao tomar sorvete, ou dizer ODEIO, ODEIO, ODEIO alguma coisa de uma forma meiga.

Adeus.
Adieu.
Goodbye.
No we never gonna survive unless we get a little crazy!

Nous allons à la plage

Meninas nerds não deveriam ir à praia. Não pra vestir maiô preto, usar protetor solar infantil, esconder-se do sol no sombreiro e olhar ao redor apertando os olhinhos protegidos na medida do possível e enxergando na medida do possível pelo óculos de grau.

As meninas da praia, ah, elas sim! Com todo a sua graça se estendem nas cadeiras de praia pra se estirar diante do sol latejante com a pele encobreada pelo bronzeador, com seus biquínis milimétricos, com seus óculos escuros que dão o ar da sensualidade no semblante.

Mas eu não sou uma menina da praia! pfffff!
Por que um cara interessante, legal, inteligente, bonito, nerd, engraçadíssimo, maluco mora longe? pfffff!!

domingo, outubro 21, 2007

Rebelião

Conheço um cara que estava trabalhando como monitor num colégio particular. O tal colégio mais parece um Big Brother, cheio de câmeras por todos os lados para vigiar (e depois punir) os alunos. Um modelo educacional bastante repressivo e que chega a colocar alunos aplicados em salas distintas das dos estudantes mais bagunceiros. Uma instituição que quando quer parecer mais humana manda os alunos pros psicólogos do colégio que os fitam de cima abaixo, e os colocam de castigo numa sala quando chegam atrasados. Um lugar onde as mães dos estudantes chegam com suas pulseiras de ouro, sua autoridade, seu ar de quem está pagando por um bom filho pronto diretamente saído daquela instituição.

Então, o cara que conheço, ao ver um desses alunos gazeando pediu para que ele retornasse à sala de aula.

- Tá pensando que você manda em mim? Tá pensando que manda em mim, que nem a vaca da minha mãe?

Meu amigo se assustou, é claro. Mas ele se espantou mais ainda quando ocorreu o episódio fatídico em que o tal guri ia incendiar o colégio jogando perfume no lixeiro e tascando fogo. Quando perguntaram ao garoto, ele negou com a frieza de um adulto psicopata no banco de réus.

- Eu não fiz nada disso. Se eu quisesse botar fogo nesse colégio eu ia começar por algo que queimasse logo tudo e não por um lixeiro.

sábado, outubro 20, 2007

Madrugada sem nexo diante do computador. Regresso cedo para casa em pleno sábado. Boas companhias ao msn. Muitas pessoas falam comigo sobre seus segredos mais profundos. Acho que as deixo a vontade. Acho que gosto de ver as pessoas mais de perto. Acho que elas sabem disso.

I wanna live life and never be cruel
I wanna live life and be good to you

And I wanna fly and never come down
And live my life and have friends around

We never change, do we? no, no
We never learn, do we?

So I wanna live in a wooden house
I wanna live life and always be true
I wanna live life and be good to you
And I wanna fly and never come down
And live my life and have friends around

We never change, do we? No, no
We never learn, do we?

So I wanna live in a wooden house
where making more friends would be easy
Oh, and I don´t have a soul to save
Yes, and I sin every single day

We never change, do we?
We never learn, do we?

So I wanna live in a wooden house
Where making more friends would be easy
I wanna live where the sun comes out ...

We never change, Coldplay

Amor fati

Desejo aprender a ver cada vez mais belo a necessidade das coisas: é assim que serei sempre daqueles que me tornam as coisas belas. AMOR FATI (amor ao destino). Seja assim, de agora em diante, ao meu amor. Não pretendo fazer guerra ao que é feio. Não pretendo acusar, nem mesmo aos acusadores. Desviarei o meu olhar, será essa agora, de agora em diante, a minha única negação! E, em uma palavra, portanto: não quero, a partir de hoje, ser outra coisa, senão a pessoa que diz SIM.

Nietzsche, A Gaia Ciência.

sexta-feira, outubro 19, 2007

Cabeça de gente é um abismo.

terça-feira, outubro 16, 2007

Medieval


Você me pede
Pra ser mais moderno
Que culpa que eu tenho
É só você que eu quero
Às vezes eu amo
E construo castelos
Às vezes eu amo tanto
Que tiro férias
E embarco num tour pro inferno

Será que eu sou medieval?
Baby, eu me acho um cara tão atual
Na moda da nova Idade Média
Na mídia da novidade média

Olha pra mim, me dê a mão
Depois um beijo
Em homenagem a toda
Distância e desejo

Mora em mim
Que eu deixo as portas sempre abertas
Onde ninguém vai te atirar
As mãos vazias nem pedras

Eu acredito nas besteiras
Que eu leio no jornal
Eu acredito no meu lado
Português, sentimental
Eu acredito em paixão e moinhos lindos
Mas a minha vida sempre brinca comigo
De porre em porre, vai me desmentindo

Será que eu sou medieval?
Baby, eu me acho um cara tão atual
Na moda da nova Idade Média
Na mídia da novidade média

Cazuza

Militância em movimentos coletivos e obtenção de capital político: da busca pelo bem comum às regras do jogo

1- Introdução

Governador do estado, secretário municipal de Educação, presidente da república. Antes de ocupar cargos que expressam capital político objetivado, muitos desses profissionais da política passaram pelos chamados movimentos sociais, sejam eles o Movimento Estudantil, o Movimento dos Sem Terra, entidades ligadas à Igreja Católica, sindicatos, associações de moradores, organizações não-governamentais, entre outros.

O presente artigo traz uma breve avaliação da relação entre a militância em movimentos coletivos e a obtenção de capital político. O prestígio conquistado por aqueles que militaram nesses movimentos costuma ocorrer nos partidos de esquerda, que têm uma maneira militantista de conceber a política, e apresentam certa proximidade com tais movimentos. Dessa forma, este trabalho traz as avaliações de Coradini e Gaglietti a respeito da socialização política dos militantes do Partido dos Trabalhadores (PT) em Porto Alegre.

Ambos os autores citados anteriormente são muito influenciados pela perspectiva de Bourdieu em seus estudos. O conceito de habitus, de que fala Bourdieu, será aplicado neste trabalho para ajudar na compreensão da relação entre militantismo e obtenção de capital político. Essa noção será fundamental para entender a forma como a passagem dos militantes por movimentos sociais contribui para o conhecimento a respeito das regras do jogo da política.

Novamente, Bourdieu foi de fundamental importância para compreender melhor a conduta dos militantes através da sua avaliação a respeito do interesse. Bourdieu dirime a visão encantada e ingênua a respeito do desinteresse dos militantes, que muitas vezes se apresentam ou são vistos como pessoas desinteressadas, pois seriam indivíduos comprometidos acima de tudo com a coletividade. A noção de lucro simbólico e as recompensas encontradas na sociedade para o “desinteresse”, de que trata Bourdieu, ajudam a construir uma perspectiva mais aprofundada a respeito das diversas motivações e recompensas da militância pela atuação em movimentos coletivos.

Se este trabalho apresenta as aproximações entre o campo político e o campo militante, é importante ressaltar também as distinções entre essas duas esferas, diferenças essas que contribuíram para a tentativa de definição de um conceito de capital militante, proposta por Frédérique Matonti e Franck Poupeau. Ao mesmo tempo em que se afastam, os capitais político e militante se aproximam na medida em que o capital militante pode ser convertido em capital político.

Se a entrada nos movimentos sociais pode estar relacionada à defesa de “causas” ligadas ao bem comum, nos movimentos coletivos também podem ser dados os primeiros passos de futuros prefeitos, governadores, entre outros, no sentido de acumular conhecimentos sobre como se movimentar no campo político. Através da militância em movimentos sociais, os profissionais da política podem tanto obter algum aprendizado necessário para serem bem sucedidos no jogo da política, como podem conseguir prestígio dentro da política partidária, em se tratando dos partidos de esquerda, que valorizam a participação em movimentos coletivos.

2- Primeiros passos na militância

Mauro Gaglietti (2003), em seu estudo sobre os militantes do Partido dos Trabalhadores da cidade de Porto Alegre, observa que a maior parte dos militantes do PT passa primeiro pelo engajamento em algum movimento coletivo para então adentrar na política partidária. Os dados apresentados por Gaglietti (2003, p. 88) apontam que 63% dos militantes começaram a atuar no PT quando estavam no Movimento Estudantil, 8.5% em sindicatos, e 23% nos movimentos de juventude ligados à Igreja Católica.

Percebe-se que a maioria dos militantes do PT iniciou a militância quando integrava o Movimento Estudantil. Gaglietti (2003, p.94) mostra que grande parte dos militantes estudou em instituições públicas, entidades onde o Movimento Estudantil é mais forte devido à influência dos discursos de esquerda de determinados professores e do contato que os estudantes têm com manifestações como a greve.

Segundo Coradini (2002, p. 109), a política partidária, para os militantes dos partidos de esquerda, nunca está desvinculada de outras esferas de militância, como as associadas ao Movimento Estudantil, sindicatos e movimentos apoiados por igrejas. Coradini (2002, p.114) mostra ainda que o baixo nível de escolaridade é compensando em alguns momentos pela atuação em movimentos sociais, como é o caso da responsável pelo Gabinete de Relações Comunitárias, uma ocupante de cargo do primeiro escalão sem curso superior, mas vasta experiência na “militância comunitária”. Já Gaglietti (2003, p.93) aponta que o baixo nível de escolaridade é compensando pelo capital político acumulado em movimentos sociais principalmente entre aqueles que participaram de organizações clandestinas de esquerda nas décadas de 60 e 70 e no início de 80.

Coradini (2002, p. 109) ressalta que a militância em movimentos sociais influencia a forma de os militantes do PT lidarem com a administração pública. Os militantes levam para sua atuação uma forma militantista de conceber a política, e instrumentalizam seus conhecimentos obtidos em instituições como a universidade. Eles aproveitam diversos valores defendidos por movimentos sociais, como “participação popular” e “gestão democrática”, como também utilizam de forma instrumental teorias das Ciências Sociais, do Direito, entre outros, para colocá-las a serviço da prática. Essa perspectiva militantista de ver a política dá um sentido de manifestada ideologização do trato das políticas públicas, indo para além da valorização da competência técnica e marcando a administração com um sentido de missão em busca de justiça social.

3 – “Desinteresse” e militantismo

Na definição de Gaglietti (2003, p. 138) a respeito dos padrões de militância, muitos militantes advindos dos movimentos sociais se enquadram em seu primeiro padrão, chamado de missão. De acordo com Gaglietti, esses militantes atribuem uma função messiânica à política, baseada na devoção a uma “causa” vinculada aos ideais socialistas e à Teologia da Libertação. Tais militantes eram influenciados pelas teorias marxistas e buscavam a construção de uma sociedade comunista, ou, no caso dos militantes cristãos, traçavam o vínculo entre o comunismo de Marx e os valores de amor ao próximo defendidos por Cristo. O exercício de um cargo por esses militantes é visto como uma oportunidade de contribuir para o bem coletivo, e não como uma forma de ascender na hierarquia política.

Dessa forma, muitos militantes podem parecer desinteressados no desempenho de suas funções. Entretanto, Bourdieu (1988, p.137) tem uma noção de interesse que vai para além das finalidades econômicas e que abarca os conceitos de lucro simbólico, capital simbólico, interesse simbólico. De acordo com o autor, a noção de interesse funciona como um instrumento de ruptura com a mistificação das condutas humanas. Ele afirma que os agentes sociais não realizam atos arbitrários e que não fazem sentido para as Ciências Sociais, mas suas ações são motivadas por interesses, manifestos ou não, estratégicos ou não.

“Ao introduzir a noção de capital simbólico (e de lucro simbólico), de certa maneira, radicalizamos o questionamento da visão ingênua: as ações mais santas – a ascese ou o devotamento mais extremos- poderão ser sempre suspeitas (e historicamente o foram, por certas formas extremas de rigorismo) de terem sido inspiradas pela busca do lucro simbólico de santidade ou de celebridade” (Bourdieu, 1988, p.150)

Bourdieu (1988, p.152) defende que o desinteresse acontece nos universos sociais onde ele é reconhecido, como é o caso do campo militante. Destarte, um ato aparentemente desinteressado pode trazer lucro simbólico para o agente social. No campo militante, em que a dedicação total à “causa”, e a submissão ao bem coletivo são vistos com bons olhos pelos demais agentes sociais, o militante obtém capital simbólico na sua dedicação aos valores de justiça social. Como afirma Bourdieu (1988, p. 153), a universalização apresenta seus lucros, já que em quaisquer sociedades a submissão ao bem comum é tida como conduta virtuosa.

Gaglietti (2003, p.127) mostra os fatores que influenciam na conquista de um cargo na administração pública, entre eles, o tempo de dedicação ao partido, a intensidade do engajamento, a fidelidade à legenda, a defesa das chamadas minorias, e, por último, a atuação em movimentos sociais. De acordo com o autor, os militantes mais ligados a esses movimentos coletivos têm mecanismo mais sofisticados para ocultar qualquer forma de interesse numa suposta compensação pela sua militância. Os militantes não costumam defender a sua nomeação para algum cargo, o que geralmente é feito por outro militante. Segundo Gaglietti (2003, p. 127), quanto maior é a influência dos ideais socialistas e da Teologia da Libertação sobre o militante, mais forte é a ocultação de possíveis interesses na obtenção de cargos ou na ascensão na hierarquia partidária.

4- As regras do jogo

“Com efeito, nada é menos natural do que o modo de pensamento e de ação que é exigido pela participação no campo político: como o habitus religioso, artístico ou científico, o habitus do político supõe uma preparação especial. É, em primeiro lugar, toda a aprendizagem necessária para adquirir o corpus de saberes específicos (teorias, problemáticas, conceitos, tradições históricas, dados econômicos, etc.) produzidos e acumulados pelo trabalho político dos profissionais do presente e do passado ou das capacidades mais gerais tais como o domínio de uma certa linguagem e de uma certa retórica política, a do tribuno, indispensável nas relações com os profanos, ou a do debater, necessária nas relações entre profissionais. (Bourdieu,1930, p. 169)

A política é descrita por Bourdieu como um jogo, e o bom jogador é aquele que conhece as regras do jogo. A noção de habitus descrita por Bourdieu (1988, p. 144) define que o habitus estrutura a percepção do universo em questão, bem como as formas de agir nesse universo. No campo político, o habitus abarca as competências cognitivas para compreensão desse mundo, constitui um conjunto de conhecimentos que permite interpretar os signos próprios do âmbito da política, bem como o sentido de como movimentar ‘as peças no tabuleiro’.

De acordo com Bourdieu (1989, p. 22), o habitus representa um conjunto de práticas distintivas de um determinado espaço social. As diferenças que tornam o espaço político um espaço diferente de outros espaços sociais formam uma linguagem, uma série de signos distintivos, de esquemas classificatórios e de categorias de percepção.

A leitura desses signos, o domínio da linguagem própria do espaço político e a incorporação dos seus princípios de di-visão do mundo social, são apreendidas inicialmente na militância em movimentos coletivos e, posteriormente, na militância na política partidária. O engajamento em movimentos sociais forneceu recursos importantes para os militantes, recursos esses que foram potencializados na sua entrada num partido político, como foi observado por Gaglietti (2003, p. 112). Os militantes observados por Gaglietti (2003, p. 105) adquiriram no movimento estudantil competências como a capacidade de falar bem em público, qualidade adquirida após participarem de diversas reuniões, assembléias, entre outros. O domínio de uma linguagem e de uma retórica política de que fala Bourdieu (1930, p. 169) pôde ser adquirido em parte nos espaços de socialização política encontrados em movimentos sociais.

As diversas experiências que os militantes têm nos movimentos coletivos contribuem tanto para lhes auferir prestígio junto aos demais militantes do PT, como foi observado nos estudos de Gaglietti (2003) e Coradini (2002), como oferecem recursos para incorporação do habitus da política pelos militantes. A militância em movimentos sociais é um dos fatores levados em conta para a obtenção de cargos na administração pública.

De acordo com Bourdieu (1930, p. 195), quanto mais o capital político se institucionaliza, tanto mais os militantes se distanciam da “causa” e se infiltram na busca por clientes, ou eleitores, e se engajam na conquista do aparelho, que pode lhes oferecer um retorno material ou simbólico. Dessa forma, quanto mais o capital político se institucionaliza, quanto mais postos os militantes de um determinado partido ocupam na administração pública, maior é a dedicação à reprodução do aparelho. Com a entrada no partido e o contato com a máquina pública, os militantes costumam se afastar dos movimentos sociais, como mostra Gaglietti (2003, p. 91), ao afirmar que 85% dos seus entrevistados que ocupam cargos na administração pública não participam de movimentos sociais, sendo que 94,5% deles iniciaram a militância quando pertenciam a movimentos coletivos.

5- Capital militante e capital político

Apesar da aproximação entre os movimentos coletivos e a política partidária, e as formas de conversão da experiência em movimentos sociais em capital político, é importante traçar os limites entre capital militante e capital político. Frédérique Matonti e Franck Poupeau (2004) formularam uma tentativa de definição de capital militante por entenderam que este é um universo do qual o conceito de capital político não dá conta. De acordo com Frédérique Matonti e Franck Poupeau (2004, p. 4), o capital político funda-se na crença que um grupo dedica a uma pessoa socialmente designada, e é baseado numa espécie de fetichismo político através do qual o grupo se identifica e se reconhece na autoridade do portador do capital político. Já o capital militante é muito instável.

“Portanto, o capital militante distingue-se do capital político, o qual é em larga medida um capital de função nascido da autoridade reconhecida pelo grupo e, por essa razão, ‘instável’, incorporado sob forma de técnicas, de saberes e savoir-faire mobilizáveis em ações coletivas, lutas inter ou intra-partidárias, mas também exportáveis, conversíveis em outros universos, portanto, suscetíveis de facilitar certas ‘reconversões’” (Matonti e Poupeau, 2004, p.5)

O que diferencia, essencialmente, o capital militante do capital político é o fetichismo que envolve o capital político e a forma como ele é mais unificado e vinculado à crença na autoridade de uma pessoa socialmente designada e na autoridade da instituição, o partido, a que essa pessoa pertence. O capital militante é mais descentrado, e apresenta um aprendizado de técnicas, de um habitus, propriamente do campo militante, um saber acumulado em manifestações e demais ações coletivas, bem como na vivência dos conflitos dentro do partido e entre os militantes de diversas tendências, ou entre os militantes de diversos partidos. O capital militante pode ser convertido para outros universos, mas Poupeau e Matonti (2004, p. 9), afirmam que ainda é necessário buscar conhecer as lógicas pelas quais o capital militante é aproveitado em outros âmbitos.

Poupeau e Matonti (2004, p. 4) mostram que o capital militante é obtido e valorizado no campo político. Os autores renunciam à visão idealista do militantismo como engajamento em partidos e movimentos coletivos motivados unicamente pela submissão a uma “causa”, seja ela a causa dos trabalhadores, dos sem-teto, dos ambientalistas, e observam que através da militância os militantes aprendem uma série de noções de como se movimentar dentro do espaço político.

6- Conclusão

Os partidos de esquerda, como é o caso do PT, costumam estar vinculados a movimentos de defesa das chamadas “minorias”, pelo seu caráter de defesa dos “oprimidos” e pela busca de ideais de justiça social. Grande parte dos militantes observados por Gaglietti (2003) e por Coradini (2002) teve experiências em movimentos sociais antes de adentrar na política partidária. Os recursos obtidos nesses espaços de socialização política puderam ser aproveitados na entrada no partido, e a participação nesses movimentos proporcionou uma espécie de iniciação no espaço político.

O capital militante obtido nessas experiências pode ser convertido em capital político. Ao adentrar na política partidária, aqueles que atuaram em movimentos coletivos muitas vezes dão um sentido de “missão” no exercício dos cargos conseguidos na administração pública. Eles também costumam instrumentalizar o seu capital escolar, e vinculam o conhecimento de diversas ciências com a utilização prática.

Os militantes costumam se passar por desinteressados. Entretanto, sabemos que o interesse rege as condutas dos agentes sociais, é ele o elemento que dá sentido às atitudes desses agentes. O interesse nem sempre está vinculados a fins econômicos, e em determinados casos pode almejar um lucro simbólico. Alguns militantes encontram lucros simbólicos na sua passagem por movimentos sociais, ou mesmo lucros econômicos. A submissão aos ideais de universalização oculta o lucro simbólico obtido com o reconhecimento na sociedade obtido pela dedicação à causa, bem como a ascensão na hierarquia partidária. Quanto mais radicais são os ideais humanitários do militante, mais requintados são os eufemismos dos ganhos obtidos através da sua militância.
O capital militante pode ser convertido em capital político na medida em que os recursos acumulados na militância são potencializados com a entrada no partido político. O domínio da linguagem própria do espaço político, e a habilidade de falar em público são alguns dos recursos obtidos nessas experiências. Além disso, a militância em movimentos sociais é um dos fatores de peso para a ascensão na hierarquia partidária.

Na medida em que os militantes adentram nas instituições públicas, a tendência é o distanciamento dos movimentos sociais e o maior apego à manutenção do aparelho político. Apesar de os movimentos sociais constituírem uma espécie de iniciação em direção à política partidária, quanto mais envolvidos se encontram os profissionais da política com a administração pública, tanto mais se afastam das antigas “causas” e se afastam dos movimentos coletivos.

Referências Bibliográficas

GAGLIETTI, Mauro. PT: ambivalências de uma militância. Porto Alegre, 2003.

BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. RJ: Bertrand Brasil, 1998, 2° ed.

BOURDIEU, Pierre. Espaço social e espaço simbólico. Conferência proferida na Universidade de Todai em outubro de 1989.

BOURDIEU, Pierre. É possível um ato desinteressado? In: Razões práticas para uma teoria da ação. Tradução: Mariza Corrêa.

MATONTI, Frédérique e POUPEAU, Franck. O capital militante: tentativa de definição. Tradução: Ernesto Seidl. In: Actes de la Recherche em Sciences Sociales, n. 155, 2004, p. 5-11.

CORADINI, O.L. Escolarização, militantismo e mecanismos de participação política. In: Como se fazem eleições no Brasil / organizadoras: Beatriz M. A. de Heredita, Carla Costa Teixeira, Irlys A. F. Barreira – Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2002.

Artigo produzido por Tatiana Hora Alves de Lima, graduanda em Jornalismo na Universidade Federal de Sergipe.

sábado, outubro 13, 2007

Depois de alguns amores
De encontros e desencontros
Adiquiriu certa paranóia conceitual, linguística
Implicância patológica com terminologias
Palavras como amor, paixão, agora tinham uma nova significação

Dizia que paixão era uma ilusão, o amor uma invenção
- coisa criada por aqueles que fazem o cinema-

Mas não seria amor apenas uma palavra?

Palavra no lugar do medo
O medo no lugar da dor
- já dizia o Chico-
A dor no lugar do amor
O amor que parece nunca ter existido
E a palavra fica assim, vazia de sentido.

quarta-feira, outubro 10, 2007

Merda de ficar tentando dar explicações lógicas pra tudo na vida.

Bote uma coisa na sua cabeça, Tatiana: Não tente transformar em uma tese racional aquilo que é completamente irracional.
Eu sou do time dos sinceros. Dos que têm gestos que beiram à falta de elegância e bom senso, dos que falam as coisas sem eufemismos, dos que não aprenderam a mentir como adultos.

E eu odeio mentiras. Não tem coisa nesse mundo que me deixe mais puta do que a sensação de estar sendo enganada!

terça-feira, outubro 09, 2007

Pânico de semi-conhecidos

Há pessoas com as quais eu até vou com a cara, mas evito falar. Não, um semi-conhecido é sempre uma tortura psicológica pra mim. Pode parecer uma atitude esnobe da minha parte, mas a verdade é que não gosto de parar pra falar na rua com quem mal conheço. Sabe aquela pessoa, amigo de um amigo meu, Fulano que vi tal dia naquela festa, etc etc. Eu fico nervosa, olho pro lado, desvio o caminho, finjo que não vi. Tudo isso pra não ter que falar "oi, tudo bem?", nem dar tchauzinho, nem conversar sobre o tempo.
Tem gente que enche a boca pra dizer que não sabe o que quer, mas sabe o que não quer.

E eu que nem isso???!!!!

Homens de preto


Muito ouvir falar no curso de inglês, no trabalho, na faculdade sobre o aclamado Tropa de elite, que apesar de ainda nem ter estreado no cinema, já foi visto por muita, mas muita gente. Tanto falaram, mas tanto falaram, que acabei vendo o filme por acaso na casa de uma amiga, quando eu ia apenas visitá-la e falar um pouco da vida. Mas foi uma boa surpresa: um filme é fantástico, certamente um dos melhores filmes brasileiros que já vi, junto com Amarelo Manga e O cheiro do ralo. Aliás, esses filmes estão incluídos na minha lista de filmes favoritos, mas vamos à Tropa de elite.

O que mais me chamou a atenção no filme foi a forma como ele fala do tráfico. Esse foi o grande mérito. Se os filmes costumam sempre mostrar os traficantes que eram meninos pobres versus os policiais filhos da puta que entram na favela atirando, dessa vez a perspectiva mostrada é a do policial fudido, que tem medo de morrer, que tem família, e tem que subir num morro correndo risco de vida e ainda ganha um salário de fome no fim do mês.

Resultado: toda obra é pemeada pela perspectiva do policial, e ouvimos pérolas do tipo Ricos com consciência social não conseguem entender que guerra é guerra, Homem de preto qual é sua missão? Entrar pela favela e deixar corpo no chão!, ainda assitimos a uma cena em que um policial mata um traficante, para então perguntar ao estudante maconheiro:

- Quem foi que matou ele? Me diga, quem matou esse cara?

- Eu não sei, eu não vi...

- Me diga, porra, quem matou ele?

- Você.

- Eu? Eu? Quem matou foi VOCÊ. Seu maconheiro, viado, maconheiro, viado!!!!

É. De cara, eu achei o filme reacionário, afinal, parece que a violência na favela não tem jeito, e estamos numa guerra e acabou-se, e a culpa do mundo ser uma merda é de quem fuma um baseado. Mas pense bem: o filme é na perspectiva de um policial. E se você fosse um policial fudido que tem família, tem medo de morrer, e sobe num morro correndo risco de vida para ainda ganhar um salário de fome no fim do mês, certamente você pensaria numa coisa: traficante é bandido e merece morrer, e estudante maconheiro é filhinho de papai filho da puta que merece tomar uma surra.
Pra mim foi justamente por Tropa de elite não tentar ensinar o politicamente correto, mas sim mostrar o olhar do policial que entre "ser negligente, corrupto ou ir pra guerra, escolheu ir pra guerra". O filme conta uma história em que Capitão Nascimento, Mathias e Neto tentam lutar contra a corrupção da Polícia, e não conseguem porque há toda uma estrutra enraizada na falta de ética e nas relações de poder. Tropa de elite, ao invés de achar culpados e falar de bandidos e mocinhos, faz a gente pensar sobre as regras do jogo. E elas precisam ser modificadas.

domingo, setembro 30, 2007

Porque eu não gosto de quem não bebe

Pode me chamar de alcóolatra ou o que for, caro leitor politicamente correto. Pois bem. É isso mesmo, acho um saco pessoas que não bebem, não tenho um pingo de paciência nem vontade de sair com esse tipo de gente, a não ser pra programinhas mais lights como um cineminha e coisa e tal.

Você pode dizer que cada um faz da vida o que quiser. Concordo plenamente. Só que o problema das pessoas que não bebem é que elas não deixam os outros fazerem da vida o que querem. Implicam com quem bebe, dizem que todas as pessoas do universo são alcóolatras, sentem desperazo por bêbados, acham que quem bebeu demais tem que se foder mesmo, mandam o namoradinho ou a namoradinha parar de beber, afirmam categoricamente que amigos bebedores são más companhias, enchem a boca pra dizer que são alegres e sociáveis sem precisar de uma gota de álcool na boca, que os bêbados são pessoas irresponsáveis... RESUMINDO, se acham SUPERIORES a quem ingere algumas doses de álcool. São um SACO!

sábado, setembro 29, 2007

Tem situações a que você acha que vai reagir de uma forma, aí quando você realmente está lá, tudo parece diferente, e é estranho o descontrole sobre nossas emoções e o que esperamos de nós mesmos.

Eu não me conheço. Ponto.
A cada dia que passa fico mais cínica e mais forte. A força vem do cinismo. Faço piada da minha própria desgraça, dou risada das ofensas que antes me causavam sofrimento, não levo a sério boa parte dos atritos, dos conflitos, das coisas desagradáveis do dia-a-dia. No fim, tudo vira um balaio de sarcasmos e piadas politicamente incorretas a respeito do mundo e da conduta alheia. Quem antes me dava medo, agora virou objeto de zombaria suaves pela frente, e comentários maldosíssimos pelas costas.

Antes de tudo é bom lembrar: eles passarão, eu passarinho.

quinta-feira, setembro 27, 2007

Pelos monges de Mianmar


Hoje fiquei triste lendo o jornal. A imagem era de monges que protegiam uma corrente humana na luta contra ditadura imposta ao povo de Mianmar, numa manifestação que despertou a ira dos poderoso do país, e em que foram lançadas bombas de gás lacrimogênio nos protestantes, e com luta física resultante em alguns feridos. São diversos protestos acontecendo nos quatro cantos do país e agora o mundo teme que o massacre que ocorreu em 1988, que resultou na morte de três mil pessoas, se repita.

Ao mesmo tempo em que fiquei triste com a miséria humana, contentou-me o fato de ver mais de 100 mil pessoas envolvidas na luta contra um governo autoritário. Admirava-me ver gentes correndo sérios riscos de morrer numa manifestação de um povo que está cansado de ser explorado, silenciado, de ter seu grito contido. Depois de tantos protestos, o governo daquele país determinou que fica proibido haver grupos de mais de cinco pessoas nas ruas, mas a população continua protestando.

A tristeza que me causou a notícia, não era pra ser tristeza. Recolho-me, como muitos, diante da desgraça, e passo para a próxima folha do jornal. Não era pra me conter na apatia, o sentimento correto seria a indignação. Eu deveria fazer alguma coisa. Mas a grande pergunta é o quê.

Sei que muitos se sentem impotentes, como eu me sinto agora. E aí nós ocidentais ficamos recolhidos diante das desgraças humanas mostradas na televisão, como se elas fossem apenas o capítulo trágico de uma novela ruim. Ficamos do lado de cá nos sentindo integrantes de uma democracia, falamos mal das barbaridades dos orientais, e deixamos pra lá. Parece que somos livres. Agradecemos por sermos um país pacífico. Esquecemos que há não muito tempo vivemos numa ditadura militar que prendeu, torturou e matou centenas de pessoas.

Outra coisa que me chamou a atenção foi a relação entre religião e política. Vemos monges utilizando a sua áurea de homens sagrados para proteger a população. Sabemos que se algo fosse feito contra eles, o governo daquele país teria sérios problemas. E isso me fez lembrar dos padres da Teologia da Libertação, que lutaram por justiça social nos tempos de ferro. Pergunto-me sobre esses homens, que tanto me lembram Cristo, que lutam contra o mal na encarnação de todos aqueles exploradores.

Sem cair naquela velha conversa de falar do imperialismo americano, eu prefiro questionar agora onde é que está a força das nossas manifestações ou da nossa religião (e digo isso enquanto pessoa que não tem religião). Do lado de lá, tudo parece mais intenso, as cores são mais fortes, os valores mais rígidos, os sujeitos mais centrados nas suas convicções. Do lado de cá, uma certa apatia política, um catolicismo não-praticante, uma falta de consistência em tudo. No meio disso tudo, eu não acredito em Deus, nem num mundo justo, meu candidato favorito agora me parece um idiota, e alguns movimentos não me servem mais de referência. Fico triste lendo o jornal, sem acreditar em nada, e acabou-se. A notícia ruim continua sendo uma notícia ruim, como se tudo não passasse de um espetáculo trágico.

terça-feira, setembro 25, 2007

O que há

O que há em mim é sobretudo cansaço —
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.
A sutileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto em alguém,
Essas coisas todas —
Essas e o que falta nelas eternamente —;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.
Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada —
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...

E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço,
Íssimno, íssimo, íssimo,
Cansaço...

Álvaro de Campos

domingo, setembro 23, 2007

Não sei paquerar

Pra muita gente posso parecer a mulher com atitude, mas a verdade é que me falta tato para me aproximar das pessoas por quem me interesso. Não sei, eu me engasgo, eu não consigo encarar, chegar junto, essas coisas. Queria ser aquela mulher segura que fixa nos olhos e derruba qualquer um. Mas a verdade é que eu não sei paquerar... não mesmo!

quarta-feira, setembro 19, 2007

A recompensa

Contaram-me de uma propaganda de cerveja em que um cara, sempre que ia abrir a geladeira, tomava um choque. Mesmo assim, ele ia lá e abria a geladeira de novo para pegar a cerveja.

Isso me lembrou a minha cachorra. Sempre que nós a prendemos ou quando chega visita, ou quando vamos dormir, usamos a mesma tática. Jogamos um pedaço de pão na varanda, ela vai correndo, toda bobona, atrás do pão.

É. Nesses casos, o prazer proporcionado pelo objeto de desejo superou os riscos e os males que ele pode causar. Ah, foram tantas as vezes em que agi como minha cachorrinha ou como o cara da propaganda de cerveja, tsc tsc...
Vontade de ficar só

Longe da banalidade

Eu quero ficar longe da banalidade

Porque em muitos momentos não estamos sós por pura banalidade.
Apesar da minha ansiedade, da minha pressa, quando às coisas vão rápido demais eu simplesmente me entedio delas. Quero-as no tempo certo, mesmo que meu relógio esteja sempre adiantado.

domingo, setembro 16, 2007

Sei de muita gente que passa um tempão sofrendo por amor, ou qualquer coisa parecida com isso. Sei que já sofri muito. Mas hoje eu me recuso a ficar chorando, pois se tudo é tão efêmero, se um dia partimos, e se um dia outras pessoas vão embora também, precisamos entender a beleza disso. A beleza do que é passageiro. E eu me recuso a ser triste. Também não sei o que é ser feliz, se nunca estamos de fato satisfeitos. Sei apenas que há muita vida pra ser vivida lá fora. E é bonita, é bonita e é bonita.
Depois de quase ter sido expulsa de um ônibus sem um tostão no bolso por não estar com a carteirinha de passe pra comprovar que posso usar meia entrada, fiquei bem feliz por encontrar outro cobrador que me reconheceu correndo pra mais um dia de trabalho e pediu ao motorista pra esperar um pouquinho.

É. As pessoas têm sim alguma vontade de ajudar o próximo. Tanto é que muitas vezes saio de casa sem saber como chegar aonde quero ir, mas saio perguntando e chego lá.
É tão bom não esperar nada. As coisas estão aí na sua justa medida. Nada de adiantar ou afastar. Tudo é tão simples! Tornamos nossos enredos complicados por tentar saber demais, entender demais, prever demais.

Eu aqui tô bem, sem evitar nem querer nada.

quinta-feira, setembro 13, 2007


Amor, então,

também acaba?

Não, que eu saiba.

O que eu sei é que se transforma numa matéria-prima

que a vida se encarrega

de transformar em raiva.

Ou em rima.


Paulo Leminski

quarta-feira, setembro 12, 2007

Existem pessoas que adotam soluções catastróficas. Essas, na verdade, trazem problemas catastróficos. Do tipo mandar o professor tomar no cu porque tirou nota baixa, xingar no trânsito, enjoar do curso e trancar, terminar com o namorado porque ele não ligou, ser presidente dos Estados Unidos e explodir o mundo.

quinta-feira, setembro 06, 2007

O crime perfeito

Antigamente eu escrevia nesse blog todo dia. Pois bem, não tenho me inspirado muito não. Na verdade, às vezes me esqueço desse blog. Mas hoje eu tenho uma história escrota pra contar. É sobre gaia que uma boa moça de família colocou bem em cima da cabeça do namorado mentiroso dela.

Ela conheceu o cara no carnaval. Dizem por aí que amor de verão não dura, mas esse durou, e cerca de três anos. Só que desde o começo de toda essa história, o cara mentia pra caralho pra menina séria, estudiosa, que saía pouco de casa, ficava raramente com alguém, e demorou a perder a virgindade. A moça o chamava pra sair, e ele dizia que estava cansado e não sei mais o quê. Aí ela ligava pra casa dele e a mãe dele, cagueta toda, informava que o rapaz havia saído com os amigos.

A desconfiança foi aumentando. Depois de um mês de ficância, eles começaram a namorar. Isso é tão típico, selar compromisso depois de um mês! Então o moço ia à casa dela, naquele namorinho de portão, e saía às 21h. Ela achava ruim, fazia bico, mas ele dizia que precisava estudar, repare só no moço responsável. Aí depois ela descobria que ele tava farreando em algum show de axé da vida.

Ah, mas a moça de família não podia levar desaforo pra casa. Então, no primeiro mês de namoro, ela botou ponta nele. Sim, no PRIMEIRO MÊS, quando as pessoas costumam estar apaixonadas e cegas (isso foi redundante). E sabe com quem? Com quem?, você pergunta. Com o ex-namorado, o moço que tirou a virgindade dela depois de anos de luta.

O atual namorado da boa moça nunca desconfiou, nem cogitou a possibilidade de ser corno. Claro, como uma menina que vive estudando e só sai comigo iria enfeitar minha cabeça? O mundo é estranho, meu caro. Mas a personagem da nossa história me explicou o motivo de ter botado ponta nele.

- Nunca mais o traí, só dessa vez, e é claro que ele nunca soube. Foi a melhor coisa que já fiz na minha vida. Toda vez que ele me fazia raiva, que ele mentia pra mim, eu olhava pra dele e pensava: SEU CORNO! Era meu segredo, minha vingança silenciosa. Aí pronta, a raiva passava.

Não foi só dela que eu ouvi isso, meus caros. Uma senhora de meia-idade também foi traída e se vingou da mesma forma.

- A traição é horrível. Você pensa que a culpa é sua, que alguma coisa está errada em você, que não é suficiente pra ele. Mas aí eu me realizei numa traição, da qual ele nunca soube. O que aconteceu é só meu. Quando olho pro rosto dele, e digo que o perdoei, lembro-me que fui pra cama com outro.

Eu ainda queria entender porque o silêncio é tão prazerozo pra essas mulheres. Por que elas se realizam sem passar na cara dele a traição? Será que nesse jogo de poder elas preferem rir da ingenuidade do parceiro, será que elas querem mentir por último e mentir melhor? Ou será que elas querem se manter mulheres de bons modos perante os olhos de todos, mas é gostoso saborear o proibido? Quem sabe isso, quem sabe aquilo, quem sabe tudo.

quarta-feira, agosto 15, 2007

Fragilidade forte, força frágil


Mulheres como Florbela Espanca e Virginia Woolf estavam a frente do seu tempo. Com seus pensamentos anarquistas e feministas elas desafiaram a moral da sociedade de sua época. Entretanto, ao conferir suas histórias de vida, que terminaram ambas com o suícidio, pergunto-me o que tem a ver a tristeza e o romantismo dessas damas com sua força e alma desafiadora. É que romantismo e tristeza, na minha visão, combinam com as personagens de histórias da belle époque, mulheres submissas burguesas que viviam a tocar piano, tinham seu amante no centro do mundo e morriam de tuberculose.

Não que Florbela Espanca e Virginia Woolf tenham se matado por amor. Acredito que isso tem a ver com a depressão que elas carregavam desde a mais tenra idade. Florbela quando ainda criança já falava sobre como a morte lhe era atraente. Mas repito, a depressão não combina com mulheres guerreiras, só que quando olho para a história de vida dessas feministas me deparo com uma grande contradição.

Há mulheres no meu círculo de convivência que quando amam, amam com todas as forças, e não há tristeza maior para elas do que não poder ter ao seu lado seu objeto de desejo. Elas não vivem a ver novelas ou ler Capricho, mas, muito pelo contrário, militam em movimentos sociais e são cheias de vontade de mudar o mundo. São por um lado tão fortes e por outro tão frágeis.

Sempre aprendemos que o amor romântico é o sentido da vida. Somos educadas para sermos a mulher do verso de Vinicius de Moraes: “Uma mulher tem que ter qualquer coisa além da beleza, qualquer coisa de triste, qualquer coisa que chora, qualquer coisa que sente saudade... uma beleza que vem da tristeza de se saber mulher... feita apenas para amar, para sofrer pelo seu amor e para ser só perdão...”

E assim entende-se que a vida das mulheres é feita de açúcar e afeto, é tirar as meias do marido e massagear os seus pés quando ele chega do trabalho, é chorar de desespero por uma tal amante, é culpar a outra mulher pelo adultério e tentar lhe arrancar os cabelos com todo o ódio do mundo entre os dedos. É cair em prantos por não tê-lo ao seu lado e viver lembrando dos momentos com ele como uma forma mágica de tê-lo por perto.

Daí o motivo de eu estranhar mulheres como Florbela Espanca e Virginia Woolf serem tão românticas e tristes. Esperava que o amor delas fosse mais forte, realista, construído pelo tempo, e que terminasse em lágrimas justas e passageiras. Que não aparecesse assim, de repente e as tomasse por inteiro. Que elas não fossem tão tristes nem se entregassam à tristeza e ao cansaço de viver. Que elas lutassem mais por um mundo melhor ao invés de abandoná-lo. Mas dos meus ídolos eu não poderia exigir nada, nem de ninguém.

Será que as mulheres românticas também vêem o mundo com romantismo e sentem imensa vontade de mudar o mundo? Mas nessas histórias em particular elas desistiram do mundo e partiram. Virginia se apaixonou pelas águas de um rio e afogou-se nelas. Florbela escreveu em seu diário "e não haver gestos novos nem palavras novas" e ingeriu dois frascos de Veronal. Mas há aquelas que não desistem dos seus moinhos de vento.
Imagem: Virginia Woolf

terça-feira, julho 31, 2007

Saudades do tempo em que minha única preocupação era passar de ano.

Chegou a época da disputa pelos títulos, grandes cargos, altos salários...

Tempos em que você precisa ser alguém! Você já cresceu!

Ah, mas é tão gostoso ser ninguém, quando tudo é uma grande brincadeira!

Se eu não quiser um trono, vão dizer que sou infeliz ou incompetente

Mas se eu chegar a um trono, não quero ser igual a vocês

Saudades do trono

Trono que é pra cagar, e não pra ser rei

segunda-feira, julho 30, 2007

Já fiz as malas

É, tenho que confessar: se tem uma coisa que me dá um medo tremendo é o tal do sentimento de perda. Sim, é verdade, eu não consigo me desapegar das pessoas, e me renuncio a perdê-las. Prefiro antes partir ou dispensá-las a vê-las ir embora.

Pode chamar isso de orgulho, quem sabe. Ou talvez o medo da dor da perda seja muito forte. Quando você perde algo ou alguém a escolha não foi sua. Você tem que aceitar a perda do objeto de desejo. Já quando você renuncia ao que está apegado, a sensação é de que você não precisa daquilo de que é tão dependente.

Ainda arrisco dizer, pensei agora, que isso, na verdade, não é medo da perda, mas sim da rejeição. Afinal, abandonando ou não o objeto de desejo, nós sofremos a perda. Mas quando somos nós que abandonamos nos livramos de uma coisa: a rejeição.

Ah, as pessoas que temem a rejeição são controladoras! Elas o são no sentido mais vulnerável do termo! Controlam tudo pelo sentimento de que todas as cosias escorrem pelas suas mãos. Querem ditar o começo e o fim. Terminam um relacionamento como aqueles que merecem um relacionamento melhor, demitem-se de um emprego como aqueles que devem ser melhor pagos. Não admitem serem rejeitados e invertem o jogo. Dessa forma, despedem-se com sentimento de superioridade.

Será que o temor da rejeição não é nada além de orgulho?

quarta-feira, julho 18, 2007

Wellcome to the jungle


Então eu saio de uma prova em que acabara de escrever sobe maioridade penal, e no ponto de ônibus um guri me chega, oscilando entre os papéis de coitado miserável pedinte e de pequeno malaca.

- Ô moça, me dê dois reais aí pra eu comprar uma passagem pra ir embora, eu tô com uma faca, me dê dois reais aí, eu tô com uma faca, eu só quero ir pra casa, eu tô com uma faca...

Era bem assim mesmo. Depois de cada lamentação era proferida a ameaça. Ok. Não tive medo do guri, apenas não assimilava bem a situação, e vi duas moças que estavam no ponto se afastarem. Logo pensei na ironia do ocorrido, e me lembrei que tinha acabado de fazer uma prova em que eu contestava duramente a redução da maioridade penal.

- Pô, cara, eu não tenho dinheiro não, quer um passe?- e lhe estendi o passe que já estava em minhas mãos enquanto aguardava o ônibus.

- Não, eu quero dinheiro. Cadê? Eu tenho uma faca...

- Hum, apois, tô falando sério. Eu não tenho um tostão furado aqui.

- Ah, então tá bom.

Exatamente no momento em que lhe entreguei o passe, meu tão esperado ônibus chegou.

- Moça- gritou o guri- tchau! - e moveu a mão enquanto sorria.

Tá, era um menino. Não é porque ele ameaçou me cortar que vou começar a ser a favor da redução da maioridade penal. Ele e tantos outros garotos estão mergulhados na merda desde que nasceram, e quando me coloco no lugar de um deles, eu penso: se eu vivesse na rua sendo chamado de trombadinha, apanhando, sendo desrespeitado, vendo aquele povo por trás do vidro do carro me olhar com cara de nojinho, eu teria sangue no olho, eu cheiraria cola, porque a cola seria o único sentido da minha vida.

Aí quando foi um dia desses, estava em outro ponto de ônibus e o mesmo menino veio me pedir dinheiro dizendo que tinha uma faca. Ele pensa que eu sou cheia de dinheiro? Gente, quantas e quantas vezes eu saio na rua com dois passes! Não tenho grana não, caralho! Mas aí lá vem o guri de novo com a mesma conversa fiada, e num ponto próximo àquele onde antes ele já tinha me ameaçado.

Só que dessa vez eu estava com meu namorado. E tipo, num primeiro momento ele apenas disse que não tinha dinheiro, mas quando entendeu que o pirralho dizia ter uma faca, deu a peste nele. Não tem coisa que afete mais o ego masculino do que ver sua namorada ser ameaçada bem na sua frente. Deu no que deu: ele gritou e se aproximou furioso do guri, e então o menino foi parar no meio da pista. Depois, o garoto voltou para a calçada e sumiu pelas ruas após chamar meu namorado de viado umas 10 vezes.
- Ele podia ter se fudido. Podia ter sido atropelado, você viu que ele foi parar no meio da pista?- observou meu namorado, entre a preocupação e a raiva.
- Vi. E um dia ele pode se bater com um cara que lhe dê uma baita surra ou coisa pior.

Antes do menino, meu namorado e eu já havíamos sido abordados por crianças logo na semana anterior. Dessa vez eram três meninos indefesos que estavam vendendo adesivos na 13 de julho tarde da noite, e que pediram nossa ajuda.

- Tem dois guris com pedaço de pau atrás da gente, eles tentaram roubar o dinheiro que a gente juntou dos adesivos- disse o menino que depois descobri ser o mais escolarizado, e que tinha algo de mais polido do que os outros- quer um adesivo?

Vimos que, de fato, havia dois garotos com pedaços de pau escondidos no outro lado da avenida. Meu namorado botou os três meninos no seu carro, e os levamos até o Centro, onde eles disseram que iam pegar um táxi lotação pra ir pra casa, no Bairro Coqueiral. Eram três crianças no centro da cidade repleto de putas, travestis, moradores de rua deitados sob o teto de lojas e bancos, homens misteriosos encostados nas paredes ou andando sozinhos em ruas desertas. Nada contra putas, travestis, nem moradores de rua, só que esse, definitivamente, não é um ambiente para crianças.

Agora eu me pergunto se os meninos indefesos não se tornarão um dia um daqueles que correm atrás dos indefesos com pedaços de pau. Ou serão como o guri que me ameaçou com uma suposta faca que o fazia se sentir o dono da rua. Lembro que tanto os meninos amendrontados quanto o garoto hostil queriam voltar pra casa. Pra que casa? Eles precisam voltar pra casa... Um deles já parecia indeciso entre o papel de pobre vítima miserável e o de vilão. Mas nessa história toda eles aprendem desde cedo que o que vale é a lei do mais forte.


Imagem do filme Cidade de Deus

You lose

Às vezes eu me fodo e fico tentando achar alguma justificativa para o que aconteceu. Nãaao, aquilo não pode ter sido de todo ruim, deve ser bom para eu aprender alguma coisa, ou me levar para uma oportunidade melhor. Difícil é encarar que você pode ter se fudido MESMO, e ter perdido algo muito bacana.

É, como diria Lourenço... Avida é dura!

sábado, julho 07, 2007

Submisso como em todos os casais felizes

João, e aqui minto o nome do personagem para resguardar sua identidade, disse-me que estava com medo de se tornar vassalo em mais um de seus relacionamentos. Segundo ele, em sua trajetória de casos amorosos, as mulheres o trataram com desprezo depois que ele se tornou submisso. Ele disse que os dóceis costumam se foder, pois as pessoas, inconscientemente, não valorizam quem não se dá valor, nem respeitam que não exige respeito. Respeito seria uma coisa conquistada.

- Mas aí tem um porém... o que é ser submisso? Ser submisso pode ser bom. Eu sou e estou feliz assim.- disse um grande amigo meu- Nos casais felizes é a mulher quem manda. Repare que quando é o homem quem manda, os relacionamentos são infelizes.

Fiquei intrigada. Não vou defender algum tipo de femismo, não vou dizer que as mulheres devem inverter papéis e mandar nos homens. Nunca fui a favor disso. Acho que, homens ou mulheres, acima de tudo somos humanos. Só que essa afirmação do meu amigo me pareceu, de certa forma, verdadeira.

Ele não falava sobre não ter personalidade ou obedecer a todas as ordens de uma mulher autoritária. Falava antes daqueles casais em que o homem mima a mulher, faz suas vontades, bajula, esforça-se ao máximo para vê-la feliz. Os casais em que o homem fica encantado por sua mulher, e em que, inclusive, ele a ama mais.

Nos casais, há sempre alguém que ama com mais intensidade, mesmo que às vezes isso mude com o tempo, e ele fique mais apaixonado, depois ela, e por aí vai. Mas essa relação um tanto desigual só me parece ser harmônica quando é ele quem tem maior amor. Já vi casais em que, no começo, o rapaz era louco pela namorada, enquanto ela apenas tinha aprendido a amá-lo. Depois, quando ela começou a ser mais apaixonada do que ele, as coisas começaram a desandar, e ela chorava por falta de carinho.

Nunca vi, preciso que me apresentem, casais em que a mulher ama mais e eles são felizes. Nesses casos, a mulher fica carente, cobra mais atenção, tem ele no centro do seu mundo, se sujeita a algumas pequenas ou grandes humilhações, e sofre calada. Não sei, parece-me que a submissão da mulher é muito mais degradante, e certo tipo de servilismo do homem é muito mais doce.

Mas claro que há aqueles homens que são vassalos de forma mortificante. Esse é o tipo de submissão que não é saudável, segundo meu amigo. Eles também se calam e se humilham. Entretanto, segundo ele, isso nada tem a ver com aquele tipo de docilidade em que o homem dá todo tipo de regalias à sua amada. Ele a trata como um bom filho trata sua mãe.

Será que isso tem a ver com o tal de complexo de Édipo? Será que os homens precisam ser submissos a uma mulher como foram com sua querida mãe? Vejo que os bons filhos homens são aqueles que fazem as vontades da sua mãe, os filhos que às vezes deixam de sair para ela não dormir sozinha.

Talvez eu esteja enganada, mas antes quero que me apresentem um casal em que a mulher é submissa e os dois são felizes. Ainda acho que os homens procuram numa mulher um pouco de mãe, alguém que lhes dê aconchego, e também um rumo na vida.

segunda-feira, julho 02, 2007

Meninos não choram

Crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual são reféns do silêncio

Indignado, Ricardo de Souza Lima, coordenador do Programa Sentinela, abre a gaveta da sua mesa e retira uma pasta onde estão declarações de mais de 50 famílias que se negam a receber acompanhamento psicossocial. “Entre os meninos, a vergonha é ainda maior, já que, geralmente, eles são abusados por adultos do mesmo sexo. Além disso, na maioria das vezes, o agressor é da própria família ou alguém bem próximo”, declara Ricardo Lima.

De acordo com dados do Centro de Atendimento de Grupos Vulneráveis, no ano passado foram registrados 69 casos de abuso sexual cometidos contra crianças e adolescentes, dos quais 10 vítimas eram do sexo masculino. Em 2007, até o momento houve 23 ocorrências, das quais duas eram de abuso sexual contra meninos. “Não se sabe se esses números correspondem à realidade, já que os meninos têm muito mais vergonha de denunciar do que as meninas”, comenta a delegada Mariana Diniz.

O abuso e suas conseqüências- Segundo a psicóloga Aline Maciel, considera-se abuso sexual qualquer tipo de carícia feita em uma criança ou adolescente com o objetivo de obter satisfação sexual através de uma relação de poder. “O abuso causa uma excitação para a qual o menino ainda não está preparado, o que causa sérios problemas para seu desenvolvimento”, explica a psicóloga.

Segundo Aline Maciel, há casos em que o agressor seduz a criança com simpatia e carinho. “Algumas vezes a criança sofre ameaças do agressor, que a faz se sentir causadora da situação, e tem medo de contar a alguém. Em outros, ele convence a vítima de que o abuso representa amor, e ela é tão carente que não quer perder o ‘afeto’ recebido”, comenta.

De acordo com Aline Maciel, a criança ou adolescente que tem esse tipo de experiência precoce pode no futuro ter dificuldades de obter prazer em relações sexuais, ou até mesmo criar uma compulsão pela prática sexual. “O menino pode ainda vir a se tornar um agressor, dado que nós, seres humanos, temos o hábito de repetir experiências passadas”, afirma.

Ricardo Lima relata que já atendeu no Programa Sentinela meninos que abusaram da irmã ou do irmão. Em outros casos, os meninos vêm a se tornar garotos de programa. “Eles vendem seus corpos como objetos, pois foram como objetos que eles foram tratados”, declara a psicóloga Aline Maciel.

Além das conseqüências psicológicas, o abuso apresenta conseqüências físicas. A psicóloga Aline Maciel acompanhou o caso de Bruno*, de três anos. Bruno era muito apegado à babá e estava sempre em sua companhia. Até que um dia sua mãe descobriu que o filho contraiu gonorréia através de abuso sexual cometido pela babá.

De acordo com o conselheiro tutelar Jerônimo da Silva Sérgio, as vítimas são encaminhadas para a Maternidade Hildete Falcão para, depois de constatado o abuso, fazerem exames mais complexos e tomarem um coquetel Anti-AIDS que pode prevenir a doença até 72 horas depois do incidente.
Dilemas da legislação- Segundo Jerônimo da Silva, o único caso de suspeita de abuso sexual contra criança do sexo masculino registrado no ano passado na região do 3° Distrito, que abrange bairros como Grageru e 13 de Julho, não teve o processo levado adiante, pois a família retirou a queixa. “Depois o garoto, de apenas nove anos, veio a negar que havia sido abusado pelo tio. Entretanto, ele apresentava os sintomas, lavava-se frequentemente e seus desenhos se remetiam ao falo”, relata o conselheiro.

De acordo com o promotor Paulo Lima, há casos em que a família pode desistir do processo. “Na ação pública incondicionada, quando o acusado é pai ou responsável da vítima, a família não pode se retratar. Já na ação penal privada, em que a família faz a queixa e paga um advogado, a parte afetada pode retirar a queixa a qualquer momento, e termina o processo”, explica o promotor.

Programa Sentinela- Executado em Aracaju pela Secretaria Municipal da Assistência Social e Cidadania (Semasc), o Programa Sentinela funciona em Sergipe desde 2002, e ainda abarca apenas sete dos 75 municípios do estado, como Barra dos Coqueiros, Nossa Senhora das Dores, Estância, Nossa Senhora do Socorro e São Cristóvão, além de Aracaju.

O objetivo do programa é realizar atendimento social e psicológico às crianças e adolescentes vítimas de violência sexual. “O acompanhamento também deve envolver os familiares em conjunto e separadamente, para o sucesso do atendimento”, afirma o coordenador.

*O codinome foi utilizado com o intuito de preservar a identidade da criança.

Sintomas de abuso sexual

Agressividade
Agitação
Excesso de masturbação
Ansiedade
Queixa de dores nos órgãos sexuais
Falta de confiança em adultos
Mudança repentina de humor
Fala constante sobre temáticas sexuais

Disk Denúncia: 0800 791400

sábado, junho 23, 2007

Tenho muitas feridas
que não sei se serão curadas
porque se por uma lado meu amor insiste em te perdoar e me perdoar
e permanecer do seu lado
minha memória brinca com o presente
retorna ao passado
e tudo que foi perdoado não deixa de ser uma lembrança triste e sutil
que às vezes se transforma num medo ou numa ira infundada

Não sei se devo partir
Não quero voltar de novo
Mas a decisão de só partir pra nunca mais voltar
Mantém-me estática sem saber dos meus passos aonde vão dar

Sei que já me basta a incerteza
Sei que você diz que gosta de mim
Mas também gosto de cerejas

Posso dizer que te amo um dia
Mesmo sabendo que dirá que gosta de mim
Mas você também gosta de caminhar na praia de manhã cedo

Não tiro aqui o valor do aconchego e do ar de saudade da praia de manhã cedo
Se você gosta de mim assim
Como gosta de caminhar e sentir o vento da praia de manhã cedo
Sei que gosta bastante
Talvez eu é que esteja pedindo demais

Afinal, em algum lugar alguém disse
Que uns amam
e outros se contentam em ser amados.

quinta-feira, junho 14, 2007

Amor de cada um

o que era pra ser um post virou um texto...


ok. talvez eu leve essa enquete pra um lado sério, o que eu acredito que não seja objetivo tanto da enquete, como de toda a comunidade.

mas o lance é que existem duas idealizações que descarto completamente (e não descarto aqui nem relacionamento monogâmico, nem poligâmico, pois acredito serem ambos legítimos).

temos a idealização da monogamia. aquela idéia de que existe uma alma gêmea designada por Deus perdida no mundo esperando por você. sua alma gêmea vai te completar, vai preencher sua vida de felicidade, e vocês serão felizes para sempre.

por outro lado, temos também a idealização do amor livre. você poderá se relacionar com várias pessoas, amará todas igualmente, terá uma relação profunda com todas, e irá romper com sentimentos como ciúme e insegurança para ter um amor mais feliz.

só que quando voltamos à realidade...

vemos que essa tal alma gêmea do amor romântico não existe. percebemos que no mundo existem muitas e muitas pessoas compatíveis conosco.

e, novamente, quando regressamos à realidade, nos damos conta de que temos preferidos, e que não podemos ter intimidade com muita gente.

resta saber o que acontece com aqueles que acham que terão um amor plenamente feliz pra vida toda, resta saber o que vai acontecer com aqueles que se deparam com a realidade de que a paixão se desvanece com o passar do tempo, e que querem estar apaixonados eternamente.

resta saber também o que acontecerá com aqueles que têm preferidos, e que os outros terminam por ser os outros, e o que acontecerá com esses que são a segunda, a terceira opção.

resta saber o que acontecerá com aqueles que, muitas vezes, têm medo de cair de cabeça numa relação e se envolvem em múltiplos relacionamentos superficiais e descartáveis. porque se por um lado o amor livre é contra a tal falada posse do capitalismo, é contra o patriarcalismo, a propriedade sobre o parceiro, agora vemos relacionamentos adaptados à sociedade de consumo em que vivemos: rápidos, descartáveis, fast-food, assim como muitos produtos que consumimos.

relacionamentos monogâmicos dão certo? bem, minha avó mal brigava com meu avô, e eles se separaram quando meu avô faleceu.
Já Sartre e Beauvoir tinham um relacionamento aberto que durou 50 anos em que ambos tiveram amores com pessoas do mesmo sexo ou do sexo oposto.

cada um tem seu jeito de ser feliz. acredito que o acerto está em descobrir qual o seu jeito de ser feliz (e ser feliz não implica se isentar da dor).
o relacionamento aberto não é mais nobre porque as pessoas que os compõe são mais seguras. assim como o relacionamento fechado não é substancialmente melhor porque significa que "nele sim as pessoas se amam de verdade, pois quem ama só quer a pessoa que ama e acabou".

descobrir o que quer e ser honesto consigo mesmo e com a pessoa que está ao seu lado. honesto no sentido de ter uma relação aberta porque acredita nela e porque ama seu (a) parceiro(a), e não porque não se apaixonou. ser honesto no sentido de se envolver num relacionamento fechado e não trair a CONFIANÇA da pessoa.

no mais, não gosto do termo "amor livre" sendo aplicado somente a relacionamentos abertos. quem disse que o amor monogâmico é preso? se você tem uma namorada que não te enche o saco perguntando onde você está, se você preserva sua individualidade, sai com seus amigos, vive a sua vida, se você tem uma relação de amor e não de dependência com ela, quem disse que você está preso?

pra mim amor livre é amar e respeitar o outro. é reconhecer no outro seu direito de ir e vir, é aprender coisas novas e legais, e ensinar coisas novas e legais ao seu amor. é crescer juntos! é superar as dificuldades! é entender que existe a imperfeição! é melhorar a si mesmo e ajudar o outro a melhorar sempre!

isso pra mim é amor livre.

segunda-feira, junho 11, 2007

Quantas e quantas pessoas não querem mais saber de relacionamento, porque dá muito trabalho, porque já se feriu demais e quer ficar só. Mas eu ainda acho que somos responsáveis pelo amor, que o amor é o que a gente faz dele. Se alguns relacionamentos são infelizes, não é porque é condição inerente do amor ser assim. Na verdade, talvez nem tenha amado de tanto medo que tivera.
A verdadeira viagem de descobrimento não consiste em buscar novas paisagens, mas em ter novos olhos.

Marcel Proust

sexta-feira, junho 08, 2007

Minha terceira perna

Não tem sensação pior no mundo do que a de estar confusa. Não mesmo. Certamente você pode fazer a pior escolha possível, e você não se conhece o bastante. Não me agrada a idéia de eu não ter controle sobre mim, de não conhecer cada pensamento conscientemente e embasada nas minhas experiências da infância, nos exemplos dos meus pais, e mimimi à la Freud. Nada disso.

O que eu quero? Não faço a mínima idéia! Sei que quero alguma coisa e quero-a já! Talvez a coisa que eu mais quero é ter controle sobre isso tudo, é conhecer pelo menos a mim, oras! Mas muitas vezes de tanto querer chegar a uma decisão concreta, a gente acaba se ajeitando numa forma que não nos serve.

quarta-feira, junho 06, 2007

Estava hoje tendo aquela típica conversa de divã com uma amiga minha (eu sei que você já teve também, nem venha), quando ela me disse a seguinte frase, que ela viu em algum filme do qual não recorda o nome:

"Que Deus me dê a coragem de mudar as coisas que eu posso controlar e para aceitar as que eu não posso. E principalmente, que me dê a sabedoria pra diferenciar as duas".

Sartre e Beauvoir


Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir viveram um relacionamento pouco convencional que durou 50 anos. É um dos casais mais célebres da História. É impossível falar de um e não mencionar o outro. A paixão pela filosofia e pela literatura os uniu. Eles desafiaram a moral do seu tempo, vivendo muitos amores, assumindo compromissos públicos na contramão da mentalidade dominante em sua época. Foram reverenciados, mas também criticados e odiados. E escreveram livros que se transformaram em obras-primas. Na recém-lançada biografia Tête-à-Tête, da editora Objetiva, a escritora inglesa Hazel Rowley narra a agitada vida privada do casal existencialista, desde os seus primeiros encontros, em 1929, até a morte de ambos – ele em 1980, ela em 1986.

Foi na Austrália, entre o fim dos anos 1960 e início dos anos 1970, que Hazel teve contato com as idéias de Simone de Beauvoir. Ela chegou a entrevistar a escritora em 1976, em Paris, quando preparava sua tese de doutorado sobre Beauvoir e o existencialismo. O encontro foi intimidante, segundo Hazel. Afinal, ela estava diante de uma mulher que admirava por causa de sua relação de liberdade e estímulo intelectual com Sartre. E que muito havia contribuído para o desnudamento da condição feminina com ensaios como O Segundo Sexo, um de seus mais famosos.

Mas, apesar de brilhantes, Sartre e Beauvoir eram “estranhamente inseguros”, explica Hazel Rowley, e sempre se sentiam agradecidos às pessoas que os amavam. A despeito da feiúra notória, Sartre era um grande sedutor. E não foram poucas as mulheres que ele amou e abandonou, embora algumas ele continuasse sustentando financeiramente, numa atitude tipicamente machista. Um machismo, porém, que ele jamais manifestou com Simone de Beauvoir, afirma Hazel Rowley.

A notável cumplicidade do casal permitia que dividissem não somente interesses e preocupações, mas também amantes. E essa liberdade era exercida mediante um pacto incomum: eles contavam tudo um para o outro. Bonita, ícone do feminismo, Beauvoir era igualmente uma sedutora e teve muitos amantes homens, mas também se envolveu com mulheres, fato que ela sempre negou e que só se tornou público após a sua morte, com a divulgação de suas cartas.

Hazel Rowley lecionou na Universidade de Iowa, Estados Unidos, e na Deakin University, Austrália, e é autora dos livros Richard Wright: The Life and Times e Christina Stead: A Biography. Para escrever o duplo retrato de Sartre e Beauvoir, ela realizou entrevistas originais e pesquisou centenas de cartas inéditas. “Nunca gostei tanto de ter escrito um livro“, disse nesta entrevista concedida por e-mail de Nova York, onde mora.


Por que a senhora decidiu contar a história de Sartre e Beauvoir e focá-la no relacionamento do casal?

Estudei francês no Sul da Austrália no final dos anos 1960 e início dos anos 1970. Era o momento em que o movimento feminista estava no auge. Eu havia lido as memórias de Simone de Beauvoir e algumas de suas entrevistas, e fiquei muito inspirada. Ela parecia uma mulher realmente independente, e eu também queria viver daquela maneira. Eu gostava da idéia da relação livre, intelectualmente estimulante e mutuamente encorajadora que ela mantinha com Jean-Paul Sartre. Admirava o interesse deles pelas pessoas e pelo mundo, sua capacidade para trabalhar bastante, seu papel como intelectuais públicos e seu engajamento político. Tempos depois, já na meia idade, quis de repente examinar de novo aquela relação, e com mais objetividade. Era uma relação realmente admirável ou não? Beauvoir havia idealizado e representado em suas memórias? Eu queria conversar com os amantes e amigos do casal, para ver o que eles teriam a dizer.


Eles foram o casal mais famoso do Século 20?

Acho que sim. Eles ficaram famosos depois da Segunda Guerra Mundial, em outubro de 1945. Todos, no mundo inteiro, falavam dessa nova loucura, o “ existencialismo ” (mesmo que raramente entendessem o que isso significava). Sartre ficou famoso, e por algum tempo Beauvoir tornou-se famosa por causa dele. Mas depois ela adquiriu fama por seus próprios méritos, com a publicação do seu livro O Segundo Sexo, em 1949. Eles eram figuras muito controvertidas, de esquerda, e com sua literatura desafiaram as convenções sociais. Por isso muitos os odiavam. O Segundo Sexo foi considerado por muitos um livro chocante, o que levou Beauvoir a receber muitas cartas de ódio. Ela e Sartre se manifestaram contra a Guerra da Argélia (e contra o colonialismo em geral). Na França, durante os anos 1950 e início dos anos 1960, eles foram amplamente desprezados por essa posição.


Como ocorreu o seu encontro com Simone de Beauvoir? Como se sentiu ao estar diante da mulher que a inspirou?

Muito intimidada! Ela falava com muita rapidez – todos dizem isso a seu respeito –, e estávamos conversando em francês. Mas para mim foi também um momento muito importante. Naquela época, ela estava com 68 anos, e eu a achei ainda muito bonita. Naquele dia, ela não estava usando um turbante. Os cabelos estavam presos, o que dava a ela um visual melhor. E ela estava usando calça, enquanto que toda a vida havia usado vestidos, até aquele momento. Minhas perguntas foram respondidas automaticamente, e percebi que havia certas coisas sobre as quais ela não queria falar. Por exemplo, quando perguntei se ela e Sartre tinham alguma vez sentido ciúmes um do outro, ela respondeu: “ Não, nunca!” Não acreditei totalmente nela, nem naquela ocasião (quando escrevi meu livro, anos depois, aquilo pareceu uma bobagem. Beauvoir algumas vezes sentia muito ciúme das outras namoradas de Sartre).

Não parece contraditório que Beauvoir, que lutou por sua independência e tentou construir uma relação de igualdade com Sartre, fosse tão dependente dele? Não estou bem certa se ela era tão dependente dele. Sob alguns aspectos, acredito que ele precisou mais dela do que ela dele. Ele precisava dela como uma âncora, para lhe dar estabilidade. Algumas vezes Sartre esteve à beira da loucura. Nos anos 1950, ele estava muito deprimido, principalmente por causa da política. Ele bebia muito e tomava fartas doses de anfetaminas. Acabou se tornando completamente dependente de drogas. Acho que ele precisava de Beauvoir, que era uma espécie de figura materna, uma mulher que o conhecia muito bem e podia perdoá-lo infinitamente. Em termos de sua literatura, era maravilhoso que pudessem discutir suas idéias entre si. E que editassem o trabalho um do outro.

Relações abertas não eram incomuns. O que fez com que a de Sartre e Beauvoir fosse tão diferente e famosa? É verdade, relações abertas não eram particularmente incomuns naquele tempo. Muitos amigos do casal levavam o mesmo tipo de vida. Hoje é algo incomum. O mundo se tornou mais conservador, em parte por causa da Aids. Porém, a maioria das pessoas que vivem relacionamentos abertos não conta tudo um para o outro, e com detalhes em technicolor! Mas Sartre e Beauvoir contavam tudo um para o outro. Isso lhes dava um sentimento de cumplicidade. Para escritores, isso era maravilhoso. Era quase como se cada um deles vivesse duas vidas. O que os tornou também famosos foram as memórias de Beauvoir. Ela despertou ainda mais o interesse sobre a vida dos dois escrevendo memórias sem fim sobre a vida do casal.

Qual é o principal legado de Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir para os casais atuais?

Acho que eles eram um modelo de generosidade. Um nunca impedia o outro. Eles se encorajavam no verdadeiro sentido da palavra : dando coragem e liberdade um ao outro. E, como sabemos, não é fácil amar uma outra pessoa com a liberdade deles. Simone de Beauvoir trabalhou com afinco para controlar seu ciúme. Isso era algo admirável. Eles acreditavam que o ciúme é uma emoção natural, mas isso não quer dizer que o ciúme seja bom para uma relação. Como existencialistas, eles acreditavam que temos força de vontade para lutar contra certas emoções ou tendências negativas. As pessoas dizem: “Sou preguiçoso por natureza ”. Como existencialistas, Sartre e Beauvoir diriam: “ Ser preguiçoso é uma escolha sua!”.

Certa vez Beauvoir comentou que Sartre adorava as mulheres complicadas, e acabava levando-as à loucura. Beauvoir tinha razão? Beauvoir e Sylvie Le Bon [filha adotiva de Simone] estavam brincando com Sartre quando disseram isso. É verdade que Sartre gostava de mulheres jovens, vulneráveis e neuróticas. Acredito que ele sofria do complexo de salvador. Ele se imaginava no comando de um grande cavalo branco, um cavaleiro numa armadura brilhante salvando pequenas mulheres indefesas. Esta fantasia o fazia se sentir poderoso, necessário. Mas no fundo disso tudo havia a insegurança de Sartre. Ele se sentia tão feio que sequer gostava de abordar as pessoas na rua para lhes pedir informações. Ele não queria impor seu corpo às pessoas. Suas namoradas eram com freqüência bem loucas. Elas já seriam loucas de início ou ele as tornava assim? Eis uma boa pergunta. Acho que ele gostava de fazer com que mulheres jovens ficassem dependentes dele, e a dependência não é boa para ninguém. Ele também gostava de provocar ciúmes em suas amantes.

Acho que é neste ponto que Simone de Beauvoir é tão admirável. Em suas memórias ela escreveu que, por algum tempo, ela também se tornou dependente. Ela escreve com grande inteligência sobre a “mulher apaixonada” cuja vida gira em torno do seu homem. Mas, depois de alguns anos nessa condição, Beauvoir tomou as rédeas da situação. A longo prazo, ela não permitiu que Sartre a enfraquecesse. Ela preparou as coisas de modo que Sartre a tornasse forte. Muito habilidoso da parte dela, acho.


Agora sabemos que Beauvoir mantinha relações com mulheres, as quais ela sempre negou. Não é uma postura surpreendente, dadas suas idéias filosóficas?

É verdade, e eu não sei porque ela negou seus relacionamentos com mulheres. Isso é um pouco decepcionante. Acho que, em parte, porque ela via a si mesma fundamentalmente como heterossexual, e era assim que também se viam as mulheres com quem ela teve relações. Próximo do fim de sua vida, Beauvoir disse que gostaria de ter sido mais honesta sobre sua sexualidade, mas não poderia porque outras pessoas estavam envolvidas, e ela não se sentia livre para contar tudo. Tinha que ser discreta.

A senhora teve acesso a cartas inéditas que lhe forneceram muito material para o seu livro. Muitas, porém, ainda não estão disponíveis. A senhora já imaginou que tipo de Sartre poderia estar oculto nessas cartas? É possível mudar o ponto de vista sobre ele com a leitura desse material inacessível? Examinei cartas de Sartre para quase todas as suas namoradas, e tenho certeza de que não restou nenhum Sartre oculto para ser descoberto. Vi centenas e centenas de cartas não publicadas, e acredito que agora conheço bastante bem o íntimo de Sartre.
Imagine que Beauvoir e Sartre ainda estivessem vivos. Como eles enfrentariam alguns desafios atuais como o terrorismo, a Aids ou mesmo a revolução da vida virtual? Boa pergunta. Também me pergunto sobre essas coisas. Eles nunca usaram nem máquinas de escrever, imagine computadores! Sempre escreveram tudo à mão, e a vantagem é que podiam escrever em qualquer lugar : sob uma árvore, num café barulhento, qualquer lugar. Eles escreveram muitas cartas.


Será que teriam freqüentado cibercafés em suas férias?

Imagino que sim. Mas eles também apreciavam a sensualidade das canetas, da tinta, do papel. Cibercafés não são lugares sensuais. Isso teria sido uma perda para eles. Sobre a Aids : eles usariam preservativos. Uma amiga minha negra sul africana, de 30 anos de idade, leu meu livro e ficou enormemente chocada com a vida sexual deles. Ela me disse: “Fico me perguntando se eles usavam preservativos!” A resposta é não, não usavam. Sobre o terrorismo : havia bastante terrorismo durante a Guerra da Argélia. Sartre não gostava do terrorismo, mas afirmava que entendia porque pessoas que têm uma causa justa, e não têm grandes exércitos ou equipamento militar, têm que recorrer a esta estratégia contra pessoas que têm essas coisas e que estão colonizando-as ou atacando-as injustamente.


Não parece incrível que eles fossem tão vulneráveis em suas relações, apesar da força de suas idéias filosóficas?

Sim. Tanto Beauvoir quanto Sartre eram estranhamente inseguros à maneira deles. Beauvoir muitas vezes afirmou que achava difícil combinar amor com independência. Estar apaixonada a tornava vulnerável, dependente do outro, atemorizada pela perda do amor daquela pessoa. Tanto ela quanto Sartre se sentiam agradecidos às pessoas que os amavam.


A senhora estudou o existencialismo durante muito tempo. Como o livro a ajudou a compreendê-lo mais?

Qual foi a importância de tê-lo escrito? Escrevi minha tese de doutorado sobre o existencialismo e Simone de Beauvoir nos anos 1970. De fato, sou interessada por esse assunto há muito tempo. É muito bom ter retornado a um tema que foi uma paixão anos atrás. Senti-me como se estivesse voltando para casa. Nunca gostei tanto de ter escrito um livro. Mesmo estando perfeitamente consciente de suas falhas, eu ainda admiro Sartre e Beauvoir. Ainda consigo aprender com eles. Simone de Beauvoir, em particular, me faz querer viver com mais coragem, engajamento e paixão. Ela me faz querer ler mais livros, viajar pelo mundo, me apaixonar de novo, assumir posições políticas mais firmes, escrever mais, trabalhar mais, atuar com mais intensidade e olhar com mais carinho para a beleza do mundo natural. Ela amava a natureza, era uma mulher muito sensível.


A senhora esteve recentemente no Brasil para pesquisar sobre Cristina Tavares, a amante brasileira de Sartre. O que descobriu sobre ela?

Eles não foram amantes. Cristina nunca dormiu com Sartre. Ele a cortejou vigorosamente. Tenho certeza que ele teria gostado de dormir com ela. Mas ela tinha 25 anos, era uma boa moça católica. Ele tinha 55 anos, e estava longe de ser bonito. Ela admirava Sartre e Beauvoir, não há dúvidas quanto a isso. Logo depois que deixou o Brasil, Sartre escreveu uma carta de onze páginas para ela, com uma longa lista de livros para ser lidos, a maioria sobre política. Cristina os encontrou de novo, diversas vezes, em Portugal e na França, permanecendo em contato com eles. Acho que Sartre podia perceber que ela era uma jovem especial, mesmo com apenas 25 anos. E ela provou ser muito especial, tornou-se uma importante congressista, uma pioneira da questão feminina no Brasil. Ela nunca se casou, era muito independente, atlética, tinha muitos amigos, e era fortemente engajada na política progressista brasileira. Tragicamente, morreu de câncer com apenas 50 anos.

Sartre costumava terminar um relacionamento quando deixava de amar suas namoradas, embora continuasse ajudando-as financeiramente durante muito tempo. Esse comportamento não era uma espécie de machismo?

Sim, acho que Sartre estava cheio de machismo. Mas, por mais estranho que pareça, não com Simone de Beauvoir! Eis mais uma razão porque sua relação é única e tão interessante.


Se a senhora tivesse que escolher um livro de Simone de Beauvoir, qual seria? Por quê?

Prefiro as memórias, mas, como são quatro volumes, não posso escolhê-las, mesmo achando o segundo volume especialmente interessante. Imagino que escolheria seu livro mais curto, Uma morte muito suave, no qual ela fala da morte da sua mãe. O livro mostra a suavidade e sensibilidade de Beauvoir, algo que ela geralmente escondia.

A dualidade “amores contingentes” e “amores necessários”, idealizada por Sartre, explica a relação dele com Beauvoir e deles com os outros? Não, não explica. Às vezes fico pensando que essa foi a forma que ele “vendeu” seu estilo de vida a Beauvoir, para torná-lo mais saboroso. Outras mulheres eram necessárias para Sartre, mas, conforme se revelou com o tempo, ninguém durou tanto ou foi tão íntimo quanto a relação de cinqüenta anos de Sartre com Beauvoir. E ninguém mais foi um par intelectual para eles, da forma que um foi para o outro.
Sartre trouxe glamour para a filosofia, conduzindo-a a um nível importante no século 20. A filosofia ainda é necessária nos dias de hoje? Muito menos. Naquele tempo, os melhores e mais inteligentes alunos da França estudavam filosofia. Nos dias atuais a filosofia não tem o mesmo status. Naquela época, os filósofos acreditavam sinceramente que podiam mudar o mundo. Não acredito que os intelectuais tenham mais essa ilusão. Sartre tornou a filosofia “sexy” porque o existencialismo não era uma filosofia de torre de marfim. Era uma filosofia para ser aplicada à vida diária, uma filosofia que falava de liberdade, escolhas e auto-ilusão. Na época, era uma filosofia muito estimulante para as pessoas. São coisas ainda muito interessantes para nos fazer pensar.

Sartre viveu muitas vidas, e se tornou mais engajado nos problemas do seu tempo à medida que envelhecia. Ele apoiou o movimento da independência da Argélia, e rompeu com o Partido Comunista Francês depois de 1956, quando a União Soviética invadiu a Hungria. Ele e Beauvoir se sentiram muito isolados naquela época, mas permaneceram lutando.


Intelectuais como Sartre não são mais possíveis hoje?

O mundo hoje está numa desordem desastrosa, e mais do que nunca precisamos de intelectuais públicos corajosos.


Sartre viveu seus últimos dias dependendo das pessoas, aparentemente dominado pelas idéias do então jovem intelectual Benny Lévy. E de acordo com Beauvoir, em suas memórias, ela se sentiu enganada por Sartre. Eles fracassaram?

Sartre estava dependente no final de sua vida porque estava cego. De 1973 até sua morte, em 1980, ele não podia ver. Isso significava que não podia ler, nem escrever. Ele precisava de pessoas que lessem para ele, e esse foi amplamente o trabalho de Benny Lévy. Eles tiveram longas conversas, que foram gravadas e publicadas por Lévy. Beauvoir sentiu que Lévy se aproveitou de um homem frágil e cego, e publicou idéias que não eram as de Sartre. Não sei se ela se sentiu enganada por Sartre, porém muito magoada com a hostilidade de Benny Lévy com ela. E com a hostilidade da jovem Arlette Elkaïm, que Sartre tinha adotado legalmente. Receio que o final do livro seja um pouco triste. Muitas pessoas me dizem que choraram quando leram sobre o funeral de Sartre. Beauvoir estava tão devastada, tão perdida, tão frágil. Eu mesma chorei, admito.
Entrevista publicada na revista Caros Amigos