domingo, julho 24, 2011

Os sonhadores


Assistir hoje a Os sonhadores (2003), de Bernardo Bertolucci, pela segunda vez foi uma experiência bastante inusitada. Já faz mais de uma hora que o filme acabou e ele ainda está aqui comigo. Cá estou eu ouvindo I'm a spy in the house of love, I know the dream that you're dreamin on..., depois de algumas músicas da Janis Joplin.

Dessa vez o filme Os sonhadores teve outro significado pra mim primeiro porque vi bem mais filmes do que na primeira vez em que o vi, e reconhecia imagens como aquela do final do filme e que pertence a Mouchette (1967), de Bresson. Ou mesmo entrava na brincadeira dos personagens, como quando Theo, o personagem interpretado por Louis Garrel, pergunta qual o personagem que morre em cima da sombra de uma cruz e eu logo reconheci o plano de Scarface (1932), do Howard Hawks. E inclusive me lembrei do filme do Phillippe Garrel lançado dois anos depois, Amantes constantes.

Mas a identificação definitivamente não para por aí. Todo aquele climão de anos 60, revolução cultural, Vietnã, bandas de rock, e etc, me fizeram rememorar a minha adolescência. Claro que eu não vivi essa época, mas digamos que na minha adolescência eu tinha uma pequena obsessão pelos anos 60. Movimento hippie, The Beatles, The Doors, Janis Joplin, Led Zeppelin me encantavam muito.

Lembro que eu andava por aí com o cabelão e uma camisa onde havia escrito Break on through to the other side. Claro que havia muito mais, mas minha vida era tomar vinho com meus amigos, tocar violão na Sementeira e bater cabeça em show de rock.

Recordo como hoje da experiência louca que foi passar uma semana na aldeia hippie de Arembepe andando quilômetros sobre dunas com uma mochila imensa nas costas, tomando banho em rio, esperando uma hora pro miojo ficar pronto esquentando num fogo improvisado. De um lado a praia, do outro o rio, no meio dunas, casas rústicas, um mundo à parte. Como se a gente tivesse criado uma diegese, uma ficção.

Tudo isso me dá muita saudade. E na verdade até hoje insisto em ser meio moleca. Não sei quando é que eu vou ter um estilo de adulta, se é que isso vai acontecer algum dia. É que a juventude é gostosa demais.

Como diria Jim Morrison: You're lost little girl...

segunda-feira, junho 27, 2011

Metade

Hoje uma amiga comentou no meu facebook perguntando se eu tinha abandonado o blog. Daí resolvi escrever este post.

Desde que cheguei aqui em Belo Horizonte, minha vida entrou num ritmo muito intenso. Muita gente nova, muitos lugares novos, algumas belas experiências, outras muito ruins. Em geral, uma dificuldade muito grande de lidar com o novo e o desencanto com alguns moinhos de vento...

Uma coisa engraçada é que eu só me tornei nordestina quando cheguei aqui. Para as outras pessoas, não tenho uma "identidade sergipana", mas sou vista como nordestina. Dizem que meu sotaque é carregado. Gosto disso. Apesar de ter pego algumas manias mineiras, como falar uai e nó, minha fala ainda é muito nordestina.

Sinto falta especialmente da praia. Na minha mente muitas vezes vem a imagem do mar, o barulho das ondas. Acho que quando eu observar o mar em Aracaju finalmente me sentirei em casa.

Gosto de Belo Horizonte, mas não me sinto em casa. Não sei se isso é passageiro, ou se é Belo Horizonte que é passageira na minha vida.

Amo muito o que estudo. Uma coisa interessante é ver como evolui, como minha pesquisa mudou completamente (até mesmo o objeto de pesquisa), e foi se tornando mais complexa, mais bonita. Dá trabalho, passei por muitas críticas e leituras, mas é gostoso ver as coisas mudando pra melhor.

Mas uma coisa da qual sinto falta é o tempo para leituras não-obrigatórias. Como essa aqui:

Metade

Que a força do medo que eu tenho,
não me impeça de ver o que anseio.

Que a morte de tudo o que acredito
não me tape os ouvidos e a boca.

Porque metade de mim é o que eu grito,
mas a outra metade é silêncio…

Que a música que eu ouço ao longe,
seja linda, ainda que triste…

Que a mulher que eu amo
seja para sempre amada
mesmo que distante.

Porque metade de mim é partida,
mas a outra metade é saudade.

Que as palavras que eu falo
não sejam ouvidas como prece
e nem repetidas com fervor,
apenas respeitadas,
como a única coisa que resta
a um homem inundado de sentimentos.

Porque metade de mim é o que ouço,
mas a outra metade é o que calo.

Que essa minha vontade de ir embora
se transforme na calma e na paz
que eu mereço.

E que essa tensão
que me corrói por dentro
seja um dia recompensada.

Porque metade de mim é o que eu penso,
mas a outra metade é um vulcão.

Que o medo da solidão se afaste
e que o convívio comigo mesmo
se torne ao menos suportável.

Que o espelho reflita em meu rosto,
um doce sorriso,
que me lembro ter dado na infância.

Porque metade de mim
é a lembrança do que fui,
a outra metade eu não sei.

Que não seja preciso
mais do que uma simples alegria
para me fazer aquietar o espírito.

E que o teu silêncio
me fale cada vez mais.

Porque metade de mim
é abrigo, mas a outra metade é cansaço.

Que a arte nos aponte uma resposta,
mesmo que ela não saiba.

E que ninguém a tente complicar
porque é preciso simplicidade
para fazê-la florescer.

Porque metade de mim é platéia
e a outra metade é canção.

E que a minha loucura seja perdoada.

Porque metade de mim é amor,
e a outra metade…
também

Ferreira Gullar


sábado, junho 25, 2011

Se te queres

Se te queres matar, por que não te queres matar?
Ah, aproveita! que eu, que tanto amo a morte e a vida,
Se ousasse matar-me, também me mataria...
Ah, se ousares, ousa!
De que te serve o quadro sucessivo das imagens externas
A que chamamos o mundo?
A cinematografia das horas representadas
Por atores de convenções e poses determinadas,
O circo policromo do nosso dinamismo sem fím?
De que te serve o teu mundo interior que desconheces?
Talvez, matando-te, o conheças finalmente...
Talvez, acabando, comeces...
E, de qualquer forma, se te cansa seres,
Ah, cansa-te nobremente,
E não cantes, como eu, a vida por bebedeira,
Não saúdes como eu a morte em literatura!

Fazes falta? Ó sombra fútil chamada gente!
Ninguém faz falta; não fazes falta a ninguém...
Sem ti correrá tudo sem ti.
Talvez seja pior para outros existires que matares-te...
Talvez peses mais durando, que deixando de durar...

A mágoa dos outros?... Tens remorso adiantado
De que te chorem?
Descansa: pouco te chorarão...
O impulso vital apaga as lágrimas pouco a pouco,
Quando não são de coisas nossas,
Quando são do que acontece aos outros, sobretudo a morte,
Porque é coisa depois da qual nada acontece aos outros...

Primeiro é a angústia, a surpresa da vinda
Do mistério e da falta da tua vida falada...
Depois o horror do caixão visível e material,
E os homens de preto que exercem a profissão de estar ali.
Depois a família a velar, inconsolável e contando anedotas,
Lamentando a pena de teres morrido,
E tu mera causa ocasional daquela carpidação,
Tu verdadeiramente morto, muito mais morto que calculas...
Muito mais morto aqui que calculas,
Mesmo que estejas muito mais vivo além...
Depois a trágica retirada para o jazigo ou a cova,
E depois o princípio da morte da tua memória.
Há primeiro em todos um alívio
Da tragédia um pouco maçadora de teres morrido...
Depois a conversa aligeira-se quotidianamente,
E a vida de todos os dias retoma o seu dia...

Depois, lentamente esqueceste.
Só és lembrado em duas datas, aniversariamente:
Quando faz anos que nasceste, quando faz anos que morreste.
Mais nada, mais nada, absolutamente mais nada.
Duas vezes no ano pensam em ti.
Duas vezes no ano suspiram por ti os que te amaram,
E uma ou outra vez suspiram se por acaso se fala em ti.

Encara-te a frio, e encara a frio o que somos...
Se queres matar-te, mata-te...
Não tenhas escrúpulos morais, receios de inteligência! ...
Que escrúpulos ou receios tem a mecânica da vida?

Que escrúpulos químicos tem o impulso que gera
As seivas, e a circulação do sangue, e o amor?

Que memória dos outros tem o ritmo alegre da vida?
Ah, pobre vaidade de carne e osso chamada homem.
Não vês que não tens importância absolutamente nenhuma?

És importante para ti, porque é a ti que te sentes.
És tudo para ti, porque para ti és o universo,
E o próprio universo e os outros
Satélites da tua subjetividade objetiva.
És importante para ti porque só tu és importante para ti.
E se és assim, ó mito, não serão os outros assim?

Tens, como Hamlet, o pavor do desconhecido?
Mas o que é conhecido? O que é que tu conheces,
Para que chames desconhecido a qualquer coisa em especial?

Tens, como Falstaff, o amor gorduroso da vida?
Se assim a amas materialmente, ama-a ainda mais materialmente,
Torna-te parte carnal da terra e das coisas!
Dispersa-te, sistema físico-químico
De células noturnamente conscientes
Pela noturna consciência da inconsciência dos corpos,
Pelo grande cobertor não-cobrindo-nada das aparências,
Pela relva e a erva da proliferação dos seres,
Pela névoa atômica das coisas,
Pelas paredes turbihonantes
Do vácuo dinâmico do mundo...

Álvaro de Campos

segunda-feira, abril 04, 2011

Notícias de casa (1977), Chantal Akerman


A cidade se transfigura a partir das elaborações de espaços produzidas pelos seus passantes. A cidade é concebida como "um lugar de passagem", redesenhada pelas práticas de espaço de seus habitantes e mesmo pelos translados realizados através dos transportes coletivos, como já disseram certa vez Michel de Certeau, Walter Benjamin e Canclini.


É esse olhar de passagem que a cineasta belga Chantal Akerman apresenta em seu filme, que percorre as ruas de Nova Iorque em grande parte a partir de delicados travellings, com a câmera situada em automóveis, metrôs... E os passantes atravessando sinais, esperando o transporte coletivo, ou mesmo dentro do próprio metrô envolvidos no tédio, na espera pela chegada a algum lugar. Em outros momentos essa câmera, em plano geral, permanece estática, situada ao centro da rua, com o enquadramento a enfatizar um horizonte que se configura como uma estrada em direção a uma espécie de infinito.


Um filme, uma carta. Ouvimos uma voz over ler uma correspondência destinada a uma personagem com o mesmo nome da cineasta, Chantal. É sua mãe quem lhe envia cartas, sempre se queixando de uma imensa saudade que ela sente desde que sua filha foi embora para Nova Iorque. Sua mãe pergunta sempre como, afinal, é a cidade de Nova Iorque. Pede por imagens, fotografias da cidade. Conta que ouviu dizer que essa metrópole é muito perigosa.


Mas o que vemos no filme de Chantal nada tem a ver com os filmes mais violentos ou mesmo românticos filmados em Nova Iorque, nem com as mais comuns imagens midiáticas que expõem aqueles lugares típicos da propaganda elaborada pelo turismo. Antes uma rua suja, uma porta de metrô pichada, arranha-céus atrás de passantes indiferentes. É antes um capitalismo decadente, contradições sociais, tédio daqueles que não contemplam a cidade. Uma incomunicabilidade entre a cidade e os homens, e os homens entre si.


E a cidade só se torna uma paisagem urbana quando a câmera se situa a partir do ponto de vista do rio. Um leve travelling, para depois pausar diante dos altos edifícios que convivem lado a lado com os pássaros, com o rio... e também um céu acizentado, poluído. Um olhar melancólico, eu poderia dizer. Mas também um olhar contemplativo que, talvez, só tenha encontrado a possibilidade de contemplação nesse lugar entre a natureza e o urbano.

quinta-feira, março 31, 2011

Intuição - parte 3

Nossa, eu ando publicando por aqui uma vez na vida e outra vez na morte. Não por acaso, pois o mestrado tem consumido minha vida, minhas emoções, meus neurônios. Mas dei uma pausa num texto que estava lendo para fazer um pequeno e misterioso desabafo.

Durante muito tempo, acreditei que a intuição era uma coisa superticiosa. Tratava-se de uma forma de apreender o mundo baseada em sentidos por demais subjetivos e até mesmo fruto de uma percepção embaçada da realidade.

Mas a cada dia que passa me convenço mais e mais de que, em verdade, a intuição é uma forma de compreender os acontecimentos à luz de uma racionalidade que se baseia em ínfimas pistas dispostas em gestos, palavras, ações das outras pessoas com quem convivemos. A intuição é talvez uma capacidade de análise minuciosa mesmo que, todavia, se baseie em pequenas provas e em equações subjetivas.

Hoje em dia prezo e respeito minha intuição. Ela é uma espécie de guia da minha ação no mundo. E se tantas e tantas vezes eu a ignorei no decorrer da minha vida, por creditar a ela adjetivos como "noia" ou "viagem", hoje ela me permite controlar, dentro dos meus limites, a minha relação com as pessoas, e até mesmo me livra de maus bocados.

sexta-feira, março 18, 2011

Mudanças

Nesses dias em Belo Horizonte, algo muito ruim aconteceu. Chorei, fiz meu pequeno escândalo, e logo depois, como de costume devido ao meu cinismo, fazia piada com a minha própria desgraça. Por fim me dei conta, sorridente, de que "se não fosse difícil não era eu". Minha eterna vida a la novela mexicana! Sim, pois herdei de minha mãe isso de sempre me deparar com enormes contratempos, de ter de lidar com situações extremamente duras. E foi aí que eu me dei conta de que tudo de ruim que me acontece é quem sabe para aprender cada vez mais a respeitar a dor do outro, os sentimentos do outro, e a apreciar aquilo que se regozija em simplicidade. Diante das dificuldades, como diria Manuel Bandeira, "agora o que nos resta é dançar um tango argentino!". E vou vivendo, tendo por incubência essa necessidade de amar cada vez mais esse lugar...

quarta-feira, fevereiro 23, 2011

Lost book found (1996), Jem Cohen



Se, de acordo com Nelson Brissac Peixoto, as cidades são as paisagens contemporâneas, as paisagens urbanas se revelam de forma afetiva através da arte. Mais especificamente, o lugar dos documentários poéticos, desde as vanguardas das primeiras décadas do século passado, é o espaço urbano. Poderíamos citar vários exemplos, como Berlim, sinfonia de uma metrópole (1926), de Walter Ruttman, Apenas as horas (1926), de Alberto Cavalcanti, ou Chuva (1929) e A ponte (1928), ambos de Joris Ivens. Assim, os documentários poéticos desvendam as imagens esquecidas pelo nosso olhar cansado, preso a uma rotina atribulada, ou mesmo propõe imagens que divergem daquelas do sensacionalismo midiático e da efemeridade dos ícones publicitários.

Sempre vinculado a certa marginalidade do capitalismo em seus filmes, Jem Cohen lança um olhar de flâneur sobre a cidade através da perspectiva de um trabalhador, um vendedor ambulante que descobre na invisibilidade de sua condição social (ele se torna invisível para os passantes situado detrás de seu carrinho), o mistério das coisas, das pessoas, dos lugares da cidade. Tudo isso após ler um livro de bolso que obtém junto a outro vendedor ambulante, que sequer fala a mesma língua.Um homem, um livro perdido, a poesia das paisagens urbanas reencontrada nas imagens do documentário poético.

Todo o documentário é conduzido pela voz over que, muito longe de produzir um relato sociológico, oferece uma perspectiva íntima e confessional da relação desse homem com a cidade. Lugar de arranha-céus, de vitrines, da sujeira das sacolas de plástico pelas ruas, dos mendigos dormindo nas calçadas, de pessoas que dormem no trem. Uma câmera que, se olha para cima, para o topo dos altos edifícios, também tenta penetrar vitrines e mesmo investigar esgotos. Câmera que percorre o céu e o chão da cidade. Câmera que às vezes se assemelha às câmeras de vigilância, ou às vezes parece o olhar de um observador qualquer.

E se Michel de Certeau acredita que os habitantes da metrópole produzem práticas de espaço em suas caminhadas, transformando lugares homogêneos em espaços incertos e construídos na indeterminação, é possível olhar para essa geografia cinematográfica produzida por Jem Cohen como um relato de espaço, desse de que Certeau fala como sendo uma produção e eterna reinvenção da cidade de um pólo a outro de suas extensões. Metaphorai são como os gregos chamam seu transporte coletivo – e Certeau nos revela que nossas metáforas sobre o espaço urbano são também construtoras de cidade. Destarte, Jem Cohen finaliza o seu média-metragem com planos de pessoas comuns olhando para a câmera, estes que em seus caminhos incertos desenham múltiplas cidades.

O gado do sol

O décimo quarto capítulo de Ulisses, de James Joyce, denominado O gado do sol, traz uma ode ao parto, utilizando-se para tal da metáfora do gado, símbolo da fertilidade em A Odisséia, de Homero. Tal capítulo se passa numa maternidade, onde jovens estudantes de Medicina fazem bagunça enquanto mulheres sofrem com as dores de dar a luz, tendo o públicitário Leopold Bloom, ao contrário, uma conduta bastante respeitosa com aquele momento pelo qual tais mulheres passavam.

A maternidade era gerida por A. Horne, e contava com setenta leitos, vigiados por duas freiras insones. Na maternidade, encontrava-se uma antiga vizinha de Leopold Bloom, Sra. Purefoy, que sofria em trabalho de parto já há três difíceis dias. Joyce não introduz logo o nome de Bloom, apresentando-o primeiro como um misterioso viajante que durate tanto tempo por terras e mares vagou, fazendo uma brincadeira com o fato de ele ser judeu, o povo da terra prometida. Ao ver Leopold Bloom adentrar o quarto vestido de preto (ele havia antes ido ao enterro de seu amigo Paddy Dignam), a Sra. Purefoy em trabalho de parto teme que ocorra uma desgraça, mas ele logo lhe esclarece o motivo de estar vestido de preto. Viúva, a Sra. Purefoy conta que seu marido havia morrido de câncer no estômago há três anos.

Joyce utiliza elementos fantásticos para descrever a maternidade, tomando-a como um castelo

E no castelo estava posta uma mesa que era de madeira de vidoeiro da Finlândia e era sustentada por quatro anões daquele país, mas eles não ousava se mexer mais por encantamento. E sobre esta mesa estavam espadas e facas assustadoras feitas numa grande caverna por demônios trabalhadores saídos de chamas brancas que eles fincam nos chifres de búfalos e cervos que ali existem maravilhosamente em abundância.

Diante dos jovens estudantes que fazem bagunça na maternidade, a irmã enfermeira pede para que eles respeitem as mulheres que se encontram em intenso trabalho de parto enquanto eles se embebedavam. Era eles Dixon, chamado júnior de Santa Misericórdia, Crothers de Alba Longa; Lynch e Madden, os estudantes de medicina, o liberal Lenehan e o jovem poeta Stephen Dedalus.

Numa discussão sobre nascimento e justiça, o jovem Madden afirmou que seria mais penosa a morte da mulher, e o jovem Madden, já que a mulheria dava à luz sentindo dor, seria difícil deixá-la morrer, sendo assim mais justo escolher a mãe ao bebê. Os gritos das mães em trabalho de parto prosseguem, e Leopold Bloom se recorda mais uma vez do seu pequenino Rudy.

Mas sir Leopold estava muito circunspecto apesar de suas palavras porque ele ainda estava com pena da gritaria aterrorizante das mulheres estridentes em seu trabalho de parto como ele se lembrava de sua boa dama Marion que tinha parido para ele um único filho-homem o qual no décimo primeiro dia de vida tinha morrido e arte alguma de homem pudera salvar tão sombrio é o destino.

E, enquanto os jovens se envolviam com a bebedeira e a gritaria, Leopold defendia que aquele era um momento sagrado e que deveria ser respeitado, e na casa de Horne devia o repouso reinar. Na reunião com os amigos, Stephen Dedalus fala sobre o problema da febre aftosa, doença que havia contaminado o gado na Irlanda e que havia sido tema de um artigo do seu chefe, o Sr. Deasy. Ao adentrar no tema, James Joyce cria personagens-monstros, que assumem características de touro durante a discussão, utilizando expressões como "ele tinha chifres em abundância" ou "olhardetouro".

Já o estudante de Medicina Malachi Mulligan afirmava que havia imprimido diversos cartões com o anúncio de Lambay Island, um projeto seu de fertilizar mulheres com um fertilizante chamado Omphalos. E então os jovens recebem a notícia de que a mulher que a Sra. Purefoy finalmente havia tido o seu herdeiro, após três dias sofrendo para dar à luz.

O capítulo finaliza com uma rodada de bebedeira dos estudantes, que brindam enquanto discutem sobre a vida, as mães, os bebês, o leite materno, a morte, debate esse que Joyce apresenta sem travessões e sem indicar qual o interlocutor da fala.

terça-feira, fevereiro 22, 2011

Intuição - parte 2

Certa vez escrevi no blog sobre a minha intuição. Acredito muito nela, mas tantas vezes teimo em não segui-la e me ferro logo depois. Então... O caso é que minha intuição está apitando agora e dizendo: Tatiana, cuidado com isso aí, não vá por aí, vai dar merda...

Será que eu devo segui-la? Ou esnobá-la mais uma vez?

sexta-feira, fevereiro 18, 2011

King of limbs


Radiohead lançou CD novo. Assim como aconteceu com In rainbows, fiquei meio pé atrás de que este álbum não fosse tão genial quanto os outros, ou até fosse ruim. Foi aí que eu baixei King of limbs e putz! Radiohead continua uma banda fantástica!

Fã do Radiohead há 10 anos, considero essa sem dúvida a minha banda favorita. Penso seriamente em tatuar algo como uma capa de cd deles, ou alguma frase de uma música... Sei que meu amor pela banda, que já vem de longa data, vai durar pra sempre, então me sinto segura pra fazer isso.

E hoje me peguei pensando que com certeza não quero morrer sem ver um show dos caras. Seria uma experiência linda, hipnótica, mágica. Penso que é muito bom ter uma relação afetiva com uma banda como a que eu tenho com o Radiohead e melhor ainda ver um sonho como esse realizado.

Só posso desejar que venham mais e mais álbuns do Radiohead. E se um dia quem sabe eu tiver um filho, ah, ele vai ouvir Radiohead desde a gestação!

E apesar de o primeiro hit lançado pela banda ser Lotus flower, que tem aquele clipe com o Thom Yorke dançando todo esquisito, a música que mais curti foi Little by little... Identificação!

I’m such a tease
And you’re such a flirt
Once you’ve been hurt
You’ve been around enough

quinta-feira, fevereiro 17, 2011

Eu sou uma sereia?


Um dos filmes que eu mais gostei na minha infância, quando sempre que chegava em casa eu almoçava e depois ia assistir aos filmes da saudosa Sessão da Tarde, foi Minha mãe é uma sereia. Lembro que fiquei com a imagem fixa da personagem da Cher. Adorava o seu jeitinho nômade, as guloseimas que ela cozinhava, a espontaneidade e ousadia. E foi aí que eu tomei a Cher, veja que coisa engraçada, como exemplo de vida. Não que eu tenha sido alienada pelo filme, longe disso. Mas digamos que ela era o que havia em mim: essa vontade de sair errante pelo mundo. E daí rolou a identificação. E hoje retomei a vaga imagem lá no cantinho da memória em que ela está.

Agora cá estou eu indo morar em outra cidade. E, para além da maravilha que é viver experiências novas em outro lugar, eu me pego preocupada com acertos de mudança. No fim das contas, penso que se mudar é muito complicado e talvez eu não queira fazer isso de novo.

Algo inquietante que envolve uma mudança de cidade é, afinal, o que fazer com as coisas? Isso mesmo. Meus livros, meus filmes, minhas roupas... Hoje separei as roupas que ainda quero usar daquelas que não utilizo mais e juntei em várias sacolas para entregar a alguém que precise. Havia muita, mas muita roupa que não me servia mais. Roupas de anos atrás, que hoje estão desgastadas ou que eu simplesmente julgo bregas. Ao observar as minhas roupas, descobri o quanto eu mesma mudei nesse tempo. Meu gosto, meu corpo estão diferentes.

E os livros, o que fazer com eles? Penso que nessa remessa só levarei os livros de cinema e os demais que envolvam minha pesquisa. Apenas um com grande valor emocional e que quero reler em breve, mas não tem nada a ver com o mestrado: Orlando, de Virginia Woolf. Mas fica também uma dorzinha de ter que abandonar por um tempo O Amor nos tempos do cólera, de Gabriel García Márquez, ou mesmo Lavoura arcaica, de Raduan Nassar.

Nessas horas, eu fico pensando se vou querer comprar dvds, diferente de como faço agora, que apenas gravo os filmes, ou se sequer vou gravar, já que depois terei trabalho de levar caso eu me mude, e então o mais adequado seria baixar de novo quando tivesse vontade de rever um filme.

Mas aí eu também fiquei me questionando se eu não estaria entrando numa onda de não construir nada para não ter de me separar daquilo ou não ter o trabalho de levar comigo. Essa noia torna tudo muito "descartável". Então eu não sei onde estarei depois do mestrado, se continuarei lá no doutorado ou irei pra outro lugar, não sei se algum dia vou voltar a me fixar numa cidade, e aí deu a doida não vou sequer comprar livros pra não ter de carregá-los?

Pois é. Espero que eu não aja assim também com as pessoas que encontrar pela estrada.

segunda-feira, fevereiro 14, 2011

Nausicaa

Anteriormente eu havia dito que o 13° capítulo de Ulisses, de James Joyce, começava de maneira bastante sedutora. A tarde de verão começara a envolver o mundo num misterioso abraço. E de fato este é talvez o capítulo mais belo e gostoso de ler do Ulisses. Nesta passagem, James Joyce apresenta o flerte entre Gerty MacDowell e Leopold Bloom em plena tarde na encantadora praia de Sandymount. O capítulo se inicia a partir do ponto de vista de Gerty, que contempla um misterioso homem, para depois ser elaborado na perspectiva de quem mais tarde descobrimos que é nosso protagonista Leopold Bloom.

Nas passagens narradas a partir do ponto de vista de Gerty MacDowell, James Joyce adota um estilo que parodia os romances folhetinescos. E o romantismo, mesmo que clicheroso, de Gety é simplesmente encantador. Já a linguagem de Leopold Bloom é bastante sexualizada, e, enquanto Gerty tem devaneios românticos sobre quem seria o misterioso homem, Bloom discretamente masturba-se na praia olhando para ela.

Gerty MacDowell vai à praia acompanhada por duas amigas, Cissy Caffrey e Edy Boardman, que trazem consigo dois pequeninos gêmeos, Tommy e Jack Caffrey, e um bebê. Os dois gêmeos tem um breve desentendimento porque Tommy havia implicado que o castelo de areia de Jack estava mal construído e, por fim, dirimi-o, para raiva de Jack.

E então James Joyce introduz os clichês românticos de folhetim na descrição da aparência de Gerty e de seus pensamentos. Gerty era aquela típica leitora de literatura romântica, uma espécie de Madame Bovary, atraída por poesias como És real, meu Ideal? A palidez do seu rosto era quase espiritual em sua pureza ebúrnea embora sua boca como um botão de rosa fosse um genuíno arco de cupido, de perfeição grega. (...) Talvez fosse isso, o amor que podia ter sido, que conferia por vezes aos traços suaves de sua face uma expressão, tensa de sentido reprimido, que emprestava aos seus belos olhos uma propensão a um estranho enternecimento, um fascínio ao qual poucos poderiam resistir. Por que as mulheres tem olhos tão feiticeiros?

Em dado momento, Cissy, Edy e as crianças saem para ver os fogos que estouram no céu, deixando Gerty e Leopold Bloom a sós, numa paquera à distância, quando Leopold Bloom se masturba. Por um momento ela olhou para ele, encontrando o seu olhar, e uma luz a invadiu. Havia uma paixão ardente naquele rosto, paixão silenciosa como um túmulo, e fez com que ela se tornasse dele. (...) As mãos dele e o rosto se moviam e um tremor a percorreu toda.

Após se masturbar contemplando Gerty MacDowell, Leopold Bloom, ao vê-la se levantar para ir embora, percebe que ela é coxa, assim como ocorre em Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis. Botas apertadas? Não. Ela é aleijada! Ó! O Sr.Bloom a observa enquanto ela partia mancando. Pobre moça! Esta era a razão pela qual era deixada de lado enquanto as outras corriam a toda velocidade. Achei que alguma coisa estava errada por uma mulher. Mas as torna educadas. Contente por não o saber enquanto ela estava se mostrando. Diabinha fogosa no entanto. Eu não me importaria.

quarta-feira, fevereiro 09, 2011

Ciclope

Há pessoas cujos pontos de vista são deveras limitados. Tais pontos de vista são marcados pelo preconceito e a intolerância. E é sobre isso e outras coisas que fala o décimo segundo capítulo de Ulisses, de James Joyce. Na Odisséia, de Homero, Odisseu é aprisionado por Polifemo, um gigante de um olho só. Já em Ulisses o gigante de um olho só é uma metáfora para o Cidadão, personagem sem nome que tem um desentendimento com Leopold Bloom, e o ofende por ser judeu. O Cidadão detesta os povos estrangeiros que habitam a Irlanda e trava um intenso debate com Bloom sobre o que é Nação. O ápice da discussão acontece quando Leopold Bloom afirma que homens como Marx, Espinoza e Jesus Cristo eram judeus.

- Deus de quem? - diz o cidadão.
- Bem, seu tio era um judeu - diz ele. - Seu Deus era um judeu. Cristo era um judeu como eu.

Nossa, o cidadão deu um mergulho dentro da loja.

- Por Cristo - diz ele - eu vou partir o crânio desse maldito judeu por usar o santo nome. Por Cristo, eu vou crucificá-lo, sem dúvida que vou. Me dêem aqui essa caixa de biscoito.

No momento em que o Cidadão lança um biscoito na cabeça de Leopold Bloom, James Joyce introduz, sarcasticamente, a narração de um distúrbio císmico.

A catástrofe foi terrível e instantâneo o seu efeito. O observatório registrou ao todo onze choques, todos do quinto grau da escala de Mercalli, e não há registro existente de um distúrbio sísmico semelhante em nossa ilha desde o terremoto de 1534, o ano da rebelião de Silken Thomas.

Esse capítulo, por sinal, é narrado por um estranho narrador, desconhecido na verdade, que conta as peripécias em primeira pessoa, uma tremenda ousadia estética do James Joyce.

Num pub, Alf Bergan, Joe e Bob Doran começam a ler cartas, até quando Joe comenta sobre a morte de Paddy Dignam e Alf, assustado, afirma que o havia visto há pouco. Logo após essa parte, James Joyce introduz descrições sobre um universo sobrenatural.

Indagado por meio de seu nometerrestre quanto ao seu paradeiro no mundocelestial ele declarou que estava agora a caminho do prãlãyã ou retorno mas ainda estava submetido à prova nas mãos de entidades sedentasdesangue nos níveis astrais inferiores. Em resposta à pergunta quanto às suas primeiras sensações para lá das fronteiras do além ele declarou que previamente ele tinha visto como se num espelho obscuramente mas que aqueles que já tinham passado para o outro lado tinham possibilidades máximas de desenvolvimento átmico à disposição deles. Indagado se a vida ali se assemelhava à nossa experiência corporal ele declarou que ouvira de seres mais favorecidos agora em seu espírito que suas habitações eram equipadas com todo o conforto de uma casa moderna (...)

Uma carta lida por Joe no pub era uma redação impressionante. Havia sido escrita por Rumbold, um carrasco que havia escrito ao xerife de Dublin oferecendo seus serviços e afirmando ter uma excelente técnica para amarrar o nó do réu. Ao que James Joyce introduz a narração de um dia em que Rumbold enforcou um homem...

Tranquilamente, despretensiosamente Rumbold subiu ao patíbulo num traje matinal impecável e usando sua flor favorita, a Gladiolus cruentus. (...) A chegada do carrasco de renome mundial foi saudada por um estrondo de aclamação da enorme multidão (...)

Após ler esta carta, Joe e os demais colegas entram numa discussão sobre o que ocorre aos homens durante o enforcamento: dizem que eles tem uma ereção. Esta seria a contradição máxima entre morte e vida, entre libido e a falência dos sentidos, mas que Leopold Bloom descreve em termos meramente biológicos.

Agora parto para o 13° capítulo, que se inicia com uma frase deliciosa: A tarde de verão começara a envolver o mundo num misterioso abraço.

Pipe dreams

I read it all
every word
and I still don't understand a thing
What had you heard..
What had you heard

Was it love
Was it take another walk in the dark
You'll never learn

I'd pray to God if there was heaven
but heaven seems so very far from here
And it all boils down to the same old thing
Just a yin and a yang or a couple of pipe dreams
And it all boils down to the same old pain
Whether you win or you lose isn't gonna change a single thing
(...)

música do Travis

terça-feira, fevereiro 08, 2011

Vida louca, vida breve

Hoje fiquei sabendo que um amigo meu, que não era íntimo, suicidou-se com uma overdose. Ele inclusive acompanhava este blog e eu lia o dele. E pensar que há dois meses eu estava na sua festa de aniversário, quando ele celebrou a própria vida. Lembro-me de tê-lo encontrado há pouco mais de uma semana num bar, ele falou comigo bastante animado, com muita afetividade, diria que mais do que o normal. Ele também insistiu muito para que eu o avisasse caso rolasse uma despedida minha. Ele prometeu de pés juntos que iria. E agora, puf, ele não está mais aqui. E, por mais que ele não fosse muito próximo de mim, era uma pessoa que eu achava muito bacana. Custa-me acreditar que ele, em nenhum lugar, não exista mais. Ele ainda está muito vivo nas suas fotografias e nos seus escritos... A sensação que eu tive hoje? A de que a vida é tão banal. Descanse em paz.

E, assim como ele escreveu sobre si mesmo certa vez, citando Neil Gaiman...

Histórias, assim como pessoas, borboletas, ovos de aves canoras, corações humanos e sonhos, também são coisas frágeis, feitas de nada mais forte ou duradouro do que 26 letras e um punhado de sinais de pontuação.

A tristeza do outro

Há pessoas cuja tristeza me incomoda mais do que a minha própria tristeza. Digamos que, quando fico triste, eu posso lutar pela minha felicidade. Depende de mim. Mas, quando vejo certas pessoas que amo infelizes, eu me sinto impotente. Assim como, quando maltratam alguém que amo muito, eu fico puta. É que quando as pessoas me atingem, eu posso me defender. Mas o que dizer de certas pessoas que amo? Algumas delas não sabem se defender. E isso é tão injusto. E faz eu me sentir péssima. Nessas horas eu queria ser gigante pra lutar contra todos esses que fazem mal à pessoa que amo, ou ser gênio da lâmpada e realizar os seus sonhos. Mas não dá pra ser assim.

Escolhas

Sabe o que mais? Eu me dei conta de que certas coisas das quais me lamento, por mais que eu tantas vezes tenha atribuído à má sorte, ao destino gozador, e etc e tal, na verdade foram frutos única e exclusivamente de escolhas minhas. Sim, porque oportunidades não faltaram para que eu escolhesse outras coisas. Chances bateram muitas na minha porta para que eu vivesse outras situações. Mas eu escolhi o caminho errado, não foi má sorte, não foi o destino contra mim. Pense nisso, Tatiana.

segunda-feira, fevereiro 07, 2011

"Sinceridade"

E desde quando falar esclarece? Falar tantas e tantas vezes só obscurece as coisas.

domingo, fevereiro 06, 2011

Dumb

I'm not like them
But I can pretend
The sun is gone
But I have a light
The day is done
But having fun
I think I'm dumb
Maybe just happy
Think I'm just happy
Think I'm just happy
Think I'm just happy

My heart is broke
But I have some glue
Help me inhale
And mend it with you
We'll flow around
And hang out on clouds
Then we'll come down
And I have a hangover
Have a hangover
Have a hangover
Have a hangover

Skin the sun
Fall asleep
Wish away
The soul is cheap
Lesson learned
Wish me luck
Soothe the burn
Wake me up

I'm not like them
But I can pretend
The sun is gone
But I have a light
The day is done
But having fun
I think I'm dumb
Maybe just happy
Think I'm just happy
Think I'm just happy
Think I'm just happy

I think I'm dumb
I think I'm dumb
I think I'm dumb
I think I'm dumb
I think I'm dumb
I think I'm dumb
I think I'm dumb
I think I'm dumb
I think I'm dumb
I think I'm dumb
I think I'm dumb
I think I'm dumb

Kurt Cobain

Legião


Quando eu era criança, minha tia era adolescente e andava com uns caras cabeludos que gostavam de rock. Minha tia era fã de Legião e às vezes eu a via chorando deitada na cama ouvindo as músicas de Renato Russo. Pra mim Legião era a banda que minha tia gostava, a banda dos vinis do amigo da tia. Depois vi minha prima em prantos porque Renato Russo havia morrido de AIDS. E continuei indiferente à Legião Urbana.

Só depois, muito tempo depois, eu resolvi ouvir Legião. Foi justamente quando eu descobri o meu primeiro amor. Um outro tipo de amor diferente dos de outrem, um amor construído com o tempo, tijolinho após tijolinho. Foi uma fase de muitas descobertas, uma delas foi Legião Urbana. O meu amado era fã da banda e deixou esse legado para mim. Acho muito bonito quando duas pessoas se amam e uma apresenta algo para outra - como uma banda, um filme, um livro, sei lá...

E Legião, por mais que para muitos tenha virado a banda pop clichê de adolescentes, para mim continua sendo a banda dos muitos momentos da minha vida. A banda que tem um monte de músicas com as quais eu me identifico. Fora a admiração imensa que tenho pelo Renato Russo. E é por isso que eu dedico o meu domingo a ouvir umas músicas do Legião... A sensação é de que minha vida está passando em flashback!

Somos pássaro novo
longe do ninho...

sábado, fevereiro 05, 2011

Migalhas

Ouvi um desabafo que me chamou muito a atenção. Uma pessoa que me contou ter dito certa vez a alguém: Migalhas dormidas do teu pão, raspas e restos me interessam. Foi aí que eu completei: Pequenas porções de ilusão, mentiras sinceras me interessam.

Eu já vivi de migalhas, assim como já viveram de migalhas por mim. E você?

Sombras


Nossa, mais uma personagem encantadora do John Cassavetes, dessa vez em Sombras (1959), seu primeiro longa-metragem. É a Leila, uma mulher que vive rodeada de homens, diz ser dona de si mesma, não baixa a cabeça para homem nenhum, e no entanto se revela tão frágil na belíssima cena em que perde a virgindade com Tony e tem conflitos de culpa ainda deitada na cama junto ao amante, dividindo-se entre lamúrias pelo nojo do sexo e sugestões de que os dois se casassem. O filme tem muito a ver com Les cousins, lançado no mesmo ano e dirigido por Claude Chabrol, no sentido de que ambos versam sobre jovens perdidos no mundo, unidos por fortes laços, e que se encontram em sérios conflitos morais - não só isso, como também a narrativa fragmentada e frouxa, a atmosfera boêmia, a iluminação de penumbra, as situações a la minitrama, a câmera que perscruta os espaços da cidade (seja Paris ou Nova Iorque) numa relação contemplativa. Um momento marcante para mim no filme é quando David, um homem interessado em Leila, que no entanto é apaixonada por Tony, pede-lhe com a pequena agressividade de quem suporta a rejeição e conhece profundamente o objeto de seu amor:

- Tudo que eu queria era que você dançasse e fosse amável como parece ser.

Pra você eu digo sim

na voz da Rita Lee...

Se eu me apaixonar
Vê se não vai debochar
Da minha confusão
Uma vez me apaixonei
E não foi o que pensei
Estou só desde então...

Se eu me entregar total
Meu medo é!
Você pensar que eu
Sou superficial...

Se eu não fizer
Amor assim sem mais
Se você brigar
E for!
Correndo atrás de alguém
Não vou suportar
A dor de ver
Que eu perdi
Mais uma vez meu amor

Mas se eu sentir
Que nós estamos juntos
Longe ou a sós
No mundo e além
Pode crer que tudo bem
O amor só precisa de nós dois
Mais ninguém

Se você quiser
Ser meu namoradinho
E me der o seu carinho
Sem ter fim
Prá você eu digo:
Sim!...

quinta-feira, fevereiro 03, 2011

Mas agora eu vou recomeçar


Quem estiver lendo este post, pode me julgar como for, mas sabe do que estou falando e já passou por isso, assim como passei. Sabe quando você acha que sua felicidade depende de uma pessoa? Que se você não tiver essa pessoa por perto tudo ficará vazio e sem sentido? Quando você sente que a falta é tanta que chega a parecer doença e você acha que nunca conseguirá se afastar da pessoa? E você acha que se é difícil com essa pessoa, muito, mas muito mais difícil e doloroso sem ela?

Pois então. Você pensa tudo isso até o momento em que, por milagre, finalmente consegue excluir essa pessoa da sua vida. E se no começo era tão árduo esse afastamento, aos poucos você vai se dando conta de que foi tão melhor para você. Liberdade! É essa sensação que você tem. Você se livrou das amarras do que, apesar de parecer ser o centro da sua felicidade, só te empurrava sempre direto para o fundo do poço. Você era infeliz e não sabia. Agora sim você sente que, apesar de toda a dor e ausência, você é uma pessoa nova, você está em outra. Tudo está mais leve e menos complicado.

É nessa hora que você deixa os seus cabelos ao vento e canta a música do Roberto Carlos (pensando na voz gostosa da Gal):

Não sei porque razão eu sofro tanto em minha vida
A minha alegria é uma coisa tão fingida
A felicidade é já é coisa esquecida
Mas agora vou recomeçar

Não vou ser mais triste
Vou mudar daqui pra frente
E a minha escrita vai ser muito diferente
A filosofia vou mudar em minha mente
Pois agora eu vou recomeçar

Quero amor e quero amar
Quero a vida aproveitar
Talvez até arranje alguém
Alguém que eu possa acreditar
Pois agora eu vou recomeçar
E daqui pra frente eu vou mudar

O sacrifício


O que me impeliu foi o tema da harmonia que nasce apenas do sacrifício, da dupla dependência do amor. Não se trata de amor mútuo: o que ninguém parece entender é que o amor só pode ser unilateral, que não existe outra espécie de amor, que, sob qualquer outra forma, não é amor. Se não houve entrega total, não é amor. É impotente, e no momento, é nada. Acima de tudo, estou preocupado com o indivíduo capaz de sacrificar a si mesmo e a seu modo de vida — sem se preocupar em saber se sacrifício é feito em nome de valores espirituais, pelo bem do próximo, para sua própria salvação, ou em nome de tudo isso. Tal comportamento exclui, por sua própria natureza, todos aqueles interesses egoístas que constituem uma base lógica "normal" para a ação; recusa as leis de uma visão de mundo materialista. (...) Parece-me que, atualmente, o indivíduo se encontra em uma encruzilhada, confrontado com a opção de uma existência fundamentada em um consumismo cego, sujeito ao avanço inexorável da nova tecnologia e à infinita multiplicação dos bens materiais, ou, então, de buscar um caminho que conduza à responsabilidade espiritual, um caminho que, enfim, pode significar não apenas sua salvação pessoal, mas também a salvação da sociedade como um todo; em outras palavras, voltar-se para Deus. Esse é um problema que ele tem que resolver sozinho, pois só a ele cabe descobrir uma vida espiritual equilibrada para si mesmo. Ao resolvêlo, ele pode se aproximar do estado em que pode ser responsável pela sociedade. Este é o passo que se transforma num sacrifício, no sentido cristão de auto-sacrifício.

Andrei Tarkovsky em Esculpir o tempo.

As sereias


Há um episódio bastante conhecido da Odisséia, de Homero, em que Ulisses pede para que seja acorrentado com o intuito de não ser seduzido pelo canto das sereias e assim evitar se lançar ao mar. Em Ulisses, de James Joyce, o décimo primeiro capítulo se dedica a parodiar as sereias de Homero. É quando diversos personagens que haviam aparecido anteriormente se encontram no bar Ormond, que conta com duas garçonetes, Mina Kennedy e Lydia Douce, que representam as sereias.

Ao ver Leopold Bloom se aproximando do bar, Douce comenta com Kennedy que o considera asqueroso. E desabafa: Ó meu Jesus! Os homens não são mesmo uns tremendo idiotas? Apesar da demonstração de desprezo por Bloom da parte de Douce, fica evidente que ela o admira a partir de um comentário da senhorita Kennedy: Será que algum dia você vai esquecer o olho esbugalhado dele?

No bar, surge o sr. Lenehan perguntando às garçonetes se Blazes Boylan lá esteve à procura dele. Lenehan encontra Simon Dedalus no bar, e comenta sobre Stephen Dedalus. Simon demonstra que não está feliz com o fato de o filho andar na companhia de Buck Mulligan.

Na porta do bar, há uma clara referência à Odisséia. Enquanto Leopold Bloom se lembra da correspondência enviada pela sua amante Martha ao seu pseudônimo Henry Flower, ele avista um cartaz. O sábio Bloom vislumbrou na porta um cartaz, uma sereia ondulante fumando no meio de ondas atraentes. Fumem, sereias, a baforada mais fresca de todas.

O garçom Pat canta, sussurando, para a garçonete Douce: As estrelas brilhantes empalidecem... desponta a manhã... A chegada de Blazes Boylan é narrada fazendo referência à sua riqueza e seu charme para com as mulheres. Os elegantes sapatos castanho-amarelados de Blazes Boylan rangeram no chão do bar ao caminhar. Sim, ouro de perto ao lado de bronze de longe.

Tão logo Blazes Boylan canta a garçonete Douce, mas lamenta o fato de ela ser tão pequena. Ao que ela responde: Os melhores perfumes nos menores frascos. Para seduzir Blazes Boylan e Leneham, Douce ergue a ponta da saia e solta a liga de elástico sobre sua coxa... Depois diz para Boylan: O senhor é a essência da vulgaridade. Diante desta cena, Blazes Boylan tem uma ereção em pleno bar.

E então o padre Cowley começa a tocar piano, enquanto ressoa a voz de Ben Dollard: A tristeza parecia me abandonar... Cheio de esperança e todo encantamento... Mas, ai de mim, era um sonho vão... Enquanto ouve a canção, Leopold Bloom tem pensamentos eróticos com Martha: Tocando-a, atochando-a, tamponando-a, trepando nela. Trepar. Poros a se dilatar se dilatando. Trepar. A alegria, o sentir calor o. Trepar. Derramar por sobre as comportas jatos torrenciais. Inundação, jato, fluxo, jatodealegria, tremulardecópula. Aí está! Linguagem de amor.

Bloom se divide entre o desejo por Martha e o ciúme de Molly Bloom, sua esposa. Recorda um momento em que estava num teatro assistindo a uma ópera, quando Molly Bloom se reclinou para olhar o concerto e um cavalheiro se deteve sobre o seu decote através de um binóculo. Assim, sabemos que as sereias que realmente envolvem Leopold Bloom não são Mina Kennedy e Lydia Douce, mas sim Molly Bloom e Martha, que se encontram distantes do bar, porém tatuadas no seu espírito.

Imagem: Ulisses e as sereias, de Herbert James Draper, de 1909.

Noites traiçoeiras

Quando tentei entender o porquê de tantas pessoas se entregarem completamente à religião justo nos momentos de maior fragilidade, eu lembrei dessa música e compreendi tudo:

Noites traiçoeiras

Deus está aqui neste momento.
Sua presença é real em meu viver.
Entregue sua vida e seus problemas.
Fale com Deus, Ele vai ajudar você.

Deus te trouxe aqui
Para aliviar o teu sofrimento.
É Ele o autor da Fé
Do princípio ao fim,
De todos os seus tormentos.


E ainda se vier noites traiçoeiras,
Se a cruz pesada for, Cristo estará contigo.
O mundo pode até fazer você chorar,
Mas Deus te quer sorrindo.

Seja qual for o seu problema
Fale com Deus. Ele vai ajudar você.
Após a dor vem a alegria,
Pois Deus é amor e não te deixará sofrer.

terça-feira, fevereiro 01, 2011

Tão só

Nesta madrugada de insônia, após assistir ao filme O sacrifício, resolvi mergulhar no universo das redes sociais. Qual surpresa não tive ao me deparar com um status no orkut de um conhecido que achei deveras inusitado: Alguém aí está se sentindo tão só hoje? Quero conversar!

Pensei em responder: Engraçado. Estou sempre me sentindo "tão só", por mais que na maior parte do tempo eu não esteja sozinha. Mas eu não disse nada.

Achei interessante o apelo do moço. Vindo de quem veio, pareceu-me sincero. E nas redes sociais, onde todo mundo quer aparentar ser cheio de amigos e super bem resolvido, foi no mínimo curioso ver alguém dizendo que está se sentido "tão só".

Nesta madrugada, quando todo está dormindo aqui em casa, é que eu penso: e como é necessário e gostoso estar sozinha às vezes!

Paixão por Tarkovsky


Hoje assisti a O sacrifício (1986), de Andrei Tarkovsky, e depois de ter visto O espelho (1974), Solaris (1972), Nostalgia (1983) e Stalker (1979), restando-me ainda ver alguns filmes, penso que Tarkovsky é, sem dúvida, um dos meus cineastas favoritos. Pois por mais que os filmes desse cineasta russo sejam muito difíceis de digerir, eles são bastante auto-biográficos, poéticos e políticos - uma tríade maravilhosa e bastante difícil de encontrar por aí. Algo que me chamou a atenção e que está presente em todas estas obras que vi foi a crítica às ideologias tecnicistas de defesa do progresso. Tarkovsky, cineasta soviético que viveu os dilemas da Guerra Fria, pareceu-me bastante atingido por uma melancolia diante da paixão pelo progresso tecnológico existente tanto no mundo capitalista quanto no mundo socialista.

Na crítica à civilização elaborada pelo protagonista de O sacrifício e alter-ego de Tarkovsky, Alexander, ela é descrita como regida pelo poder, dominação e destruição. Alexander tem essas reflexões sentado junto a uma árvore, numa paisagem bastante bela de uma vegetação movida pela invisibilidade do vento (por que me lembrei tanto de Johannes em A palavra (1955), de Carl Theodor Dreyer?). Tarkovsky mostra, utilizando travellings bastante delicados e em plano sequência, o ator e estudioso de literatura e filosofia tão solitário em suas divagações, enquanto seu pequeno filho escapa brincando pelo mato. E é esse pequeno que faz o gesto de regar uma árvore, no último plano do filme (e também da carreira de Tarkovsky), gesto esse que remonta à parábola que Alexander havia contado no início do filme, sobre praticar um mesmo ato ritualmente todos os dias para que o mundo mude.

Assim como é uma criança quem cria aos poucos um novo mundo, é com uma mulher, a empregada Maria (justo o nome da mãe de Jesus!), que Alexander deve fazer amor para encontrar a salvação. Não foi Alexandre quem abandonou o teatro por vergonha de incorporar os sentimentos alheios, por ver como uma fraqueza, como algo feminino sentir tão intensamente? Como diz a patroa de Maria, Quem mais ama é o mais fraco, aquele que está mais aberto a sentir. Mas é com uma mulher que ele tem que se deitar para obter sua ascese! É no amor onde ele vai buscar algum sentido num mundo que, como o próprio Alexander disse, conquistou um excessivo desenvolvimento material em detrimento do desenvolvimento espiritual. A mulher seria tão somente uma metáfora dessa espiritualidade...

E, se como afirma Andreas Huyssen, o Titanic seria uma espécie de metáfora da modernidade, dado que a modernidade trouxe a promessa de evolução da humanidade, mas, assim como o Titanic submergiu logo no primeiro dia, o mundo tão logo afundou em guerras mundiais, é possível crer que Tarkovsky, através dos personagens do filho e de Maria, concorda com Ana Cristina César =)

As mulheres e as crianças são as primeiras que
desistem de afundar navios.


O plano do filho de Alexander, que havia sofrido uma cirurgia de garganta, deitado junto à árvore que volta a crescer, balbuciando as frases No princípio era o Verbo e Pai, por quê? Por quê?, representa o fim e o começo. O começo, como no Gênesis, e o fim, como no sacrifício de Jesus Cristo, que pregado na cruz olha para os céus e suspira: Pai, por que me abandonastes? Assim como Alexander teve de se livrar de sua casa incendiando-a diante da iminência de uma guerra nuclear, seria preciso dirimir os pilares da civilização tecnocrata para alçarmos um novo mundo? No princípio era o Verbo - ou quem sabe uma Imagem.

Fugazzi: Instrument (2006), Jem Cohen


Há momentos de determinados filmes que estão lá para que o cineasta delimite junto ao espectador qual o seu lugar na representação. Peguemos como exemplo o documentário Nelson Freire (2003), do João Moreira Salles. Há uma cena em que o pianista Nelson Freire está concedendo uma entrevista à televisão, e, diante dos pedidos e perguntas frívolas da equipe de TV, o pianista lança um olhar cúmplice para a câmera da equipe de João Moreira Salles. Este momento é bastante especial no filme, pois conota uma relação íntima e mesmo afetiva entre cineasta e o entrevistado.

Assim ocorre em Fugazzi (2006), de Jem Cohen, só que a encenação é elaborada num programa de TV utilizado como material de arquivo de Cohen. Após fazer algumas perguntas aos integrantes do Fugazzi, a apresentadora de televisão olha para a câmera e diz: Vamos agora assistir ao videoclipe da banda Fugazzi. Vemos a apresentadora parada e sem saber o que fazer durante alguns segundos, envolvida numa situação nitidamente constrangedora. O motivo: a banda independente de hardcore Fugazzi, vinda da cena underground de Washington D.C., não realiza videoclipes simplesmente por ser contra as grandes gravadoras e o mainstream típico de emissoras como a MTV. É nessa cena em que Jem Cohen revela que a sua elaboração fílmica passa longe das estéticas dos documentários e videoclipes feitos para a televisão.

Buscando o que há de punk e sujo na banda Fugazzi, Jem Cohen filma com câmeras digitais que mostram imagens bem caseiras, valendo-se também do super 8. O filme apresenta muitos cortes (remetendo ao ritmo do próprio hardcore), e no entanto os seus cortes são não para entreter o espectador, mas para hipnotizá-lo, e também traz imagens fora de foco e nenhuma glamourização de um integrante em particular. A banda Fugazzi e o cineasta Jem Cohen tem ambos consciência de que tanto um show quanto um documentário são pura encenação, algo revelado numa entrevista em que um dos músicos afirma que nos seus espetáculos "tudo é encenação e nós manipulamos as pessoas".

No entanto, assim como a realidade foge ao controle do cineasta, também as pessoas que vão aos shows do Fugazzi entram em conflito com a banda e não são tão manipuláveis assim. Em um dos shows representados no documentário, há um confronto entre os integrantes da banda e o público. Quem já foi a shows de hardcore sabe que é comum a prática do pogar - ou seja, homens ficam se esmurrando numa espécie de dança violenta do punk rock. Essa prática para mim sempre me pareceu muito machista, pois já tentei diversas vezes pogar e os homens ou batiam em mim (o que parecia uma brincadeirinha, na verdade é violência pura), ou mandavam eu sair da roda. O Fugazzi é contra essa prática, mas muitas pessoas que vão aos seus shows insistem em querer pogar, o que gerou um conflito exibido no documentário. A agressividade do hardcore estimula encenações de verdadeiros "clubes da luta", não aceitos pelo Fugazzi.

O documentário Fugazzi é interessante por revelar uma paixão do cineasta pela banda, um completo envolvimento que beira à agressividade dos espectadores dos shows de rock. Um filme que apresenta as imagens a favor do fascínio da música, em que os corpos possuídos pelo som hardcore é que guiam a câmera.