quarta-feira, janeiro 12, 2011

Hades


Hoje choveu e trovejou, um dia propício para proporcionar o clima adequado para ler o sexto capítulo de Ulisses, de James Joyce. Este capítulo, como afirmam os seus comentadores, é uma referência ao Hades, o reino das sombras, em Odisséia. Nesta passagem, Leopold Bloom vai ao enterro de seu amigo, Paddy Dignam, e tal evento lhe proporciona o encontro com o medo da morte, questionamentos sobre o que é a morte, e também a dolorosa lembrança do falecimento de seu pequenino filho Rudy, que deixou a vida pouco tempo depois do nascimento, e a recordação do seu pai, que suicidou-se.

Leopold Bloom chega ao enterro de Dignam numa carruagem, onde estavam Simon Dedalus (o pai de Stephen Dedalus), o Sr. Power e Martin Cunningham. Da carruagem, Simon Dedalus vê Stephen Dedalus caminhar pela rua de luto, e se enfurece ao supor que ele estava acompanhando por Buck Mulligan, o estudante de Medicina que zombou da morte da mãe de Stephen Dedalus. Mas ele estava acompanhado pela tia Sally. Após Simon Dedalus ver Stephen Dedalus, Leopold Bloom rememora o seu pequeno Rudy e como ele veio ao mundo.

Meu filho. Eu em seus olhos. Sentimento estranho seria. De mim. Apenas uma chance. Deve ter sido naquela manhã no Raymond Terrance ela estava na janela, observando os dois cachorros observando aquilo junto ao muro do de deixar de fazer o mal. E o sargento sorrindo para cima. Ela estava com aquele vestido creme com o rasgão que ela nunca coseu. Vamos transar, Poldy. Meu Deus, estou morrendo de vontade. Como a vida começa. Ficou barriguda então. Teve de recusar o concerto de Greystones. Meu filho dentro dela. Eu poderia tê-lo ajudado a progredir na vida. Poderia. Torná-lo independente. Aprender alemão também.

Tudo neste capítulo é morte: o céu nublado, a proeminência dos tons cinzas. Na ocasião, Leopold Bloom vê Blayzes Boylan, homem que ele suspeita que tenha um caso com sua esposa. E pensa: "pior homem de Dublin". Na ocasião, também está presente John Henry Merton, homem com quem Bloom havia brigado numa partida de bocha e que tem interesse pela sua esposa, Molly Bloom. Leopold Bloom conta uma anedota para os colegas na carruagem, sobre Reuben J. e seu filho. Dizia-se que Reuben J. enviara o filho para a ilha de Man com o objetivo de afastá-lo de uma mulher... Ao que o filho se lançou do barco ao mar... Mas o pescador o trouxe de volta com uma vara, como se ele fosse um peixe.

Na carruagem, Martin Cunningam conta que Paddy Dignam morreu subtamente, do coração. Leopold Bloom opina que esta seria a melhor morte. Até que surge o enterro de uma criança, o que espanta os senhores na carruagem e faz Leopold Bloom lembrar do seu pequenino Rudy. Ao ver o enterro do bebê, o Sr. Power diz: mas o pior disso é o homem que tira a sua própria vida. A maior desgraça para uma família. Ele não sabia que o pai de Bloom havia se suicidado. Bloom se angustia: Eles não tem compaixão disso aqui ou de infanticidio. Recusam enterro cristão.

Durante o enterro, a carruagem passa por uma manada. Leopold Bloom sugere que construam uma linha de bondes até o cemitério, para não ter que seguir com o caixão numa carruagem. Martin Cunningham lembra do episódio de Dunphy, cujo cadáver rolou do caixão sobre a carruagem até o asfalto, assombrando os familiares e amigos presentes com o incidente sórdido.

No enterro de Dignam, que deixara cinco filhos e uma mulher sem dinheiro, o Sr. Dedalus assim saúda o amigo falecido:

- Embora longe dos olhos, perto do coração.

A carruagem onde se encontra Leopold Bloom, Power, Dedalus e Cunningham passa pelo terreno onde Childs foi assassinado. A ideia de morrer por assassinato assombra-os, e eles sentem uma agonia naquele lugar.

Começa a celebração religiosa. A missa do enterro é celebrada em latim. Faz eles se sentirem mais importantes ao serem encomendados em latim. Missa de requiém.

Durante a missa, Leopold Bloom se mostra incrédulo quanto ao paraíso. E um dos presentes, Tom Kernam, comenta: Eu sou a ressurreição e a vida. Isso toca o coração mais profundo do homem. Neste capítulo, que cita o episódio de Cristo e Lázaro, a religião é apresentada por James Joyce como uma espécie de ilusão acalentadora de uma vida após a morte. Leopold Bloom observa a morte como algo extremamente materialista:

Ouso dizer que o solo seria bem fértil com adubo de cadáveres, ossos, carne, unhas. Ossuários. Pavoroso. Ficando verdes e rosados ao se decompor. Apodrecimento rápido em terra úmida.

E Bloom não vê com encanto, não crê na eternidade de Dignam nem na memória. O barro caiu mais suavemente. Começar a ser esquecido. Longe dos olhos, longe do coração.

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