quinta-feira, julho 03, 2008

Cansaço...

Meu irmão costuma dizer que Fernando Pessoa era doido. Diz que o poeta tinha três personalidades: Álvaro de Campos, Ricardo Reis e Alberto Caeiro. Doido ou não, sei que sinto como se eu fosse uma reencarnação de Álvaro de Campos. Não é brincadeira - sempre vejo a mim mesma falando através de Álvaro de Campos. Quando eu morrer, podem colocar na minha lápide: íssima, íssima, íssima...

O que há

O que há em mim é sobretudo cansaço —
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.

A sutileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto em alguém,
Essas coisas todas —
Essas e o que falta nelas eternamente —;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.

Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada —
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...

E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço,
Íssimo, íssimo, íssimo,
Cansaço...

2 comentários:

Álvaro Müller disse...

Fernando Pessoa é o grande gênio da literatura mundial. Só ele mesmo pra nos mostrar que "metafísica é uma consequência de estar mal disposto", que "toda despedida é uma morte", que "as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria" e tantas outras coisas.

P.S.: Eu, poeta? Tá de sacanagem, né??? rsrsrsrs

e.m. disse...

Em Lisboa, quando sentei ao lado do Pessoa, perguntei: Oi quem és?
Logo dei um trago num tabaco e logo entendi que ele olhava para a tabacaria..
Neste momento era ele...

Identifico-me com todos os Pessoas e pessoas. Através dele pude ver meu semblante mudar. Uma vez o Reis falou: Tão cedo passa tudo quanto passa... Tudo é tão pouco. nada se sabe, tudo se imagina... E cala. O mais é nada.
Noutro momento disse: - Quer pouco: terás tudo. Quer nada: serás livre!

Depois conheci o Álvaro, logo ele disse: Aproveitar o tempo! Mas o que é o tempo, que eu o aproveite?

Por fim, o mais é nada, e o nada é tudo...