quinta-feira, janeiro 26, 2006

As profundezas

Você já mergulhou nas profundezas dos mares que habitam a alma, e depois subiu seguindo uma luz distante?

O sol penetra o vidro vermelho da janela, o sol vermelho das frestas envolve o corpo de Cristo pendurado na parede. Posso sentir a minha respiração ofegante cantar para o Cristo de prata.

As pratas da minha avó, guardadas todas em seus devidos lugares. E as panelas? Eu nunca sabia onde colocar as panelas, e odiava lavá-las, cheias de sujeiras difíceis de tirar.

A sujeira. Tudo em mim parecia sujo. O corpo prateado de Jesus. Minha neta, leia este livro sobre um santo, você vai ser uma santa, Deus lhe faça uma santa, sim.

As portas se fechavam na noite e eu delirante em meus pensamentos, as imagens espectrais da casa escura me enfeitiçando. Angústia. Não posso dormir sozinha, e essa escuridão, acenda a luz do corredor pra mim, por favor? O corredor iluminado, e a sala lá longe onde a visão falecia pela lâmpada apagada.

O vento canta em sussurros a ânsia. Uma janela e tantas estrelas.

O enterro de um homem, eu nunca vi esse homem na minha vida. Eu, Roberta, Tiago, todos choramos a morte do homem azul, todos os mortos são azuis.

De repente, o homem se acorda. Vocês vão para o inferno, aguardem Roberta, Tiago, e Maria. Queimarão no fogo do inferno para todo sempre, eu guardo as suas almas em potes de prata num depósito de almas fechado por vidros vermelhos.

Minha mãe aparece no enterro. Maria, o demo se apossou do corpo do Zé, filha, é o demo!

Não, eu não vou arder nas profundezas do inferno, não, não!

Um comentário:

a mulher do lado disse...

belo texto!!!!