quinta-feira, novembro 20, 2008

Reencontro

Como é que a gente faz para voltar no tempo?

O tempo é o grande desafio da vida, não é? Havia planejado sair num determinado horário para chegar à entrevista pontualmente. Entretanto, isso não foi possível graças ao trânsito infernal da cidade e ao péssimo sistema de transporte público.

O calor da cidade era opressivo. Às vezes eu sentia como se minha mente ficasse ainda mais inquieta por causa desse clima. Logo no instante em que eu pedi para a moça dois cigarros, conferi se o ônibus ia aparecer, e, de fato, lá vinha meu ônibus, e, enquanto isso, a mulher olhava para as moedas e estendia a mão para mim devolvendo-as dizendo que o preço do cigarro havia aumentado. Deixei o cigarro, remédio contra o tempo, e corri até o ônibus. Só que as portas estavam fechadas. Aguardei a partida do carro. Ele se foi sem ao menos levar um passageiro.

Valia a pena esperar o próximo ônibus? O fiscal disse que outro ônibus só saria dali a vinte minutos. Não queria perder uma vaga por causa da passagem das horas. Calculei se tinha dinheiro suficiente para o táxi. Ainda restavam sete reais do dinheiro do ingresso que havia comprado há pouco no teatro próximo ao terminal. Acenei para o táxi. Ele não parou. Um homem parou o carro me oferecendo carona. Preferi esperar um outro táxi.

Eu não tirava o olho do relógio. No momento em que eu achava que não ia dar para seguir em frente com a partida, encontrei uma nota de dez na carteira, como uma bênção vinda dos céus.

Fiz a entrevista e depois sentei numa área de vivência para passar o tempo. Eu tinha um compromisso, e não ia voltar para casa, pois depois teria que regressar novamente, e aquele trânsito infernal.

Então eu passo pela frente de uma porta e vejo de relance quem eu penso que seria um rapaz com quem eu havia tido um breve envolvimento há um tempo atrás. Sentei-me. Acendi um cigarro que tinha comprado no terminal após o alarme falso do ônibus que acabou indo sem nenhum passageiro. Tomei água. Não, não era ele, eu devo estar vendo coisas, tenho essa mania de ver rostos de pessoas conhecidas em gente desconhecida.

- Como é seu nome?

- Dimitri.

- Dimitri o quê?

Nem esperei para ouvir o sobrenome. Quantos Dimitris havia naquela cidade? Segui até a recepção.

- Oi Dimitri, tudo bem?

- Oi Luiza, tudo bem!

Sentei-me novamente e voltei aos meus livros. Não consegui parar de pensar nele um segundo sequer. As palavras estavam numa escrita morta, soltas e sem significado, rabiscos diante de meus olhos analfabetos de tanta ansiedade. Quando ele voltasse, ia pedir para ele ficar ali um pouco comigo. Mas como eu ia fazer isso? Tá, eu ia dizer, oi senta aqui, vamos conversar. Não, não. Como vai? Quanto tempo!

Naqueles dez minutos se passaram lembranças avulsas que duraram algumas horas. Ele me pareceu um tanto nervoso ao me cumprimentar. Eu não conseguia agir naturalmente com ele. Quando ele saiu da sala, atentei para seu passo arrastado, seu impasse para chegar mais perto de mim. Ele não queria ir embora, pelo menos não naquela hora. Pedi para ele sentar para a gente conversar. Fazia tanto tempo!

Não o encontrava, sequer pensava nele, ou mesmo lembrava, mas reencontrá-lo sempre mexeu comigo, com as coisas mal resolvidas que eu tinha. Ficava envergonhada ao vê-lo na rua.

- Sabia que eu tenho vergonha quando te vejo?

- Ué, por quê?

- Você deve me achar uma louca!

- Não acho não.

- Acha sim. Ai meu deus, eu era tão tola naquela época!

Um dia aquele homem com jeito de menino esteve apaixonado por mim. Não fazia muito tempo desde que eu havia me afastado de um rapaz com quem eu não havia tido uma história – e talvez esse fosse o motivo de uma tristeza não ter se instalado em mim, afinal, não houve uma história. Olhei para ele e, por um momento, lembrei de todos os homens que havia conhecido desde então. Onde ele estava esse tempo todo? Eu sabia. E tinha plena consciência de que ele não podia ser meu.

Durante a minha espera, conversamos por horas e horas. Ele reclamou que estava com fome, e foi aí que percebi que ele havia deixado de passar em casa antes da aula, só para nesse intervalo passar um tempo junto comigo. E quando me vi falando como se ele nunca tivesse ficado longe de mim, conclui que eu confiava nele, mesmo que a gente nunca tenha sido amigos ou amantes por muito tempo. Apesar da brevidade das nossas aproximações, houve momentos em que ele se mostrou mais companheiro do que amigos de anos. Em volta dele havia uma áurea, uma energia boa que eu gostava de sentir. Eu precisava de um bocado daquela energia por perto. Poucas pessoas tinham o semblante tão puro quanto o dele.

Houve um instante em que o azul dos seus olhos vibraram. Queria tocá-lo, queria beijá-lo. Mas me segurei, eu precisava manter o controle. Conversamos como bons amigos, mas eu imaginava, mesmo que me faltasse um espelho, que algo na linguagem do meu corpo, da minha voz, revelava mais do que eu permitiria. Lembrei das mensagens dele, da lembrança que ele deixou na portaria do prédio. Como pude?

Ele encostou-se preguiçoso na cadeira. Eu me estendi sobre a cadeira com os pés em outra para descansar. Quando os dois estavam absortos no nosso mundo, como se estivéssemos num parque olhando pro céu, ele me fez uma confissão. Foi uma confidência sem nomes, sem fatos concretos. Ele apenas me falou de uma aflição. Eu nunca imaginei vê-lo angustiado.

- Sabe, tem uma coisa me remoendo. Faz alguns dias já. Hoje isso está mais forte. Estou assim o dia inteiro. Sabe quando você sente um frio na barriga?

- Do que você tá falando?

- É algo mal resolvido. Um conflito que se estende. Sabe, quando você não espera que uma coisa vai dar nisso, mas acaba acontecendo.

- E você se decepciona porque depositou suas expectativas naquilo.

- É, é isso.

- Mas eu fico assim quando estou esperando algo ou quando esse algo já aconteceu.

- Os dois. Já aconteceu e eu estou esperando no que isso vai dar.

Qual era o conflito dele? Com o quê ele havia se decepcionado? Um leve prazer tomou conta de mim, desses prazeres egoístas que não devemos sentir. É que eu queria muito acreditar que o relacionamento que ele levava há anos já não dava mais certo. Eu não o esperei durante todo esse tempo, mas sempre que o reencontrava algo me dizia que a gente ainda iria ficar juntos, seja de maneira efêmera, ou seja por muitos anos. Eu só não sabia como.

Ele se despediu dando um tchauzinho tímido, e eu não tive coragem de ter algum contato físico com ele, de abraçá-lo antes que ele fosse embora, mesmo que quisesse tê-lo só um pouquinho mais perto. Então ele relutou em partir. Esperava que eu tivesse tomado a grande decisão do dia – abraçá-lo. Ele veio no meio do nada -além de nós- me dar um abraço e um beijo no rosto. Eu não sabia quando ia revê-lo. Senti uma leve pontada no coração.

No nosso papo, ele havia falado em energia. Ele, ao contrário de mim, acreditava em alguma força que fazia as coisas acontecerem. Eu, que na nossa conversa defendi que vivemos a deriva, agarrava-me agora à crença de que o destino o havia colocado no meu caminho naquele dia. Por mais que eu não me lembrasse dele no cotidiano, assim que o avistava era como se eu sentisse saudade durante todo esse tempo.

terça-feira, novembro 18, 2008

A Mulher de Branco


Quando criança, eu morria de medo da Mulher de Branco, da novela Tieta. Assim que ela surgia iluminando a noite misteriosa do agreste, eu corria para o meu quarto, o que provocava muitos risos entre meus familiares. Aquela coisa "ô, criança tem cada uma né?". Não foram poucas as vezes em que meu tio vestiu um lençol branco e saiu correndo atrás de mim para me assustar. Mesmo desconfiando de que era ele, eu fugia, porque, na dúvida, podia ser a Mulher de Branco né!

Até que no final da novela, eu, criança ingênua, descobri que a Mulher de Branco não passava de uma viúva tarada que saía pela noite vestida de fantasma atrás de um homem que pudesse "tirar o seu atraso". Era Perpétua, aquela senhora pudica, que estava sempre usando roupas pretas, coitada, não conseguia esquecer o falecido marido - chegando ao ponto de guardar a coisa que ela mais gostava nele numa caixa (não vou dizer que coisa era, crianças).

Só posso dizer que foi uma decepção tremenda: tipo, oi, o que tenho eu a ver com uma velha tarada que assedia sexualmente homens? E eu achando que a Mulher de Branco era um fantasma que matava os moradores da pequena Santana do Agreste. Tudo bem, era tudo uma piada e eu não entendi. Achei que qualquer coisa com lençol branco envolvia terror.


Rappel muito louco

Tenho estudado algo sobre violência urbana e cinema brasileiro, etc. E visto e revisto alguns filmes nesse sentido.

Resultado: Peguei no sono e sonhei que via, da janela do meu quarto, o Capitão Nascimento escalar a parede do meu prédio, com a mesma feição angustiada que ele tinha em uma cena em que ele faz rappel em Tropa de Elite.

domingo, novembro 16, 2008

Versus

Eu queria desejar a paz ao mundo
mas tenho de admitir que
enquanto escrevo essa poesia
em algum lugar
alguém sofre uma punição
alguma injustiça é cometida
alguém tem que se calar
e a dor que mais dói é a dor a que a gente se acostuma
- a tudo nessa vida, a gente se acostuma -
só que agora essa dor me incomoda
e seguro no peito
um sentimento de que "não tem mais jeito"
só resta a mim viver
levar a vida como der
em alguns momentos esquecer
e em outros desejar a paz no mundo
a paz anula o conflito
mas anular o conflito terminaria em anular as duas partes
- é o fim?-

e esses que falam em inferno e fim do mundo
quero saber se eles desenham o inferno parecido com isso aqui
e o término de tudo
um ritual coletivo de morte

eu que luto com a minha própria sorte
já me despeço do mundo
como quem é só mais uma
-não, eu não fiz nenhuma revolução-

nunca quis ser uma mártir
apenas quero um pouco de paz
mas a paz é a anulação do conflito
e anular o conflito é anular as duas partes

afinal
mais com mais dá mais
menos com menos dá mais
agora,
mais com menos...

dá menos.

sábado, novembro 15, 2008

Antitrama

Tenho um amigo que conheci há algum tempo, mas que hoje em dia nosso contato é possível apenas através do mundo virtual. Não sabemos se um dia iremos nos reencontrar pessoalmente. Não que nossas conversas sejam impessoais. O que me chama atenção nesse amigo é o fato de que o contato que tivemos cara a cara foi muito breve, todavia estamos sempre nos entendendo de alguma forma. Só que sobre ele eu nada sei além de suas sensações. Isso mesmo, sensações.

É que ele não me conta histórias com início, meio e fim, não narra fatos mais concretos de sua vida. Seus relatos são cheios de incertezas, de vácuos de informação. Acostumei-me a isso. Se ele está confuso, eu sei como ele está confuso, mas não o porquê. Também conheço mais sua visão de mundo do que sua vida.

Às vezes converso com ele sobre as minhas impressões. Sinto que ele compartilha comigo algumas delas, e me entende mais do que a maioria das pessoas com quem convivo. Somos íntimos, mas também desconhecidos. A nossa relação é muito mais intimista do que narrativa. Nossas conversas são como aqueles filmes que preferem falar de sensações ao invés de fatos.

sexta-feira, novembro 14, 2008

Fiquei muito muito triste hoje.





















Velho, como assim que não tem o emoticon do capeta no novo messenger? Que porcaria é essa de Messenger Beta? Eu curtia tanto usar o emoticon do capeta! Po, isso deve ser reivindicação dos crentes ¬¬

Nesse mundo as pessoas adoram se juntar pra reclamar do que não vale a pena, vide abaixo-assinado por finais de novela.

Sorriso

Um sorriso mudou o meu dia
E esse dia mudou minha vida.
O sorriso me encheu de alegria
Mesmo vindo de uma desconhecida.

Foi tão forte, seguro e bonito...
Foi presente de Deus ou do acaso.
Acalmou o coração que era aflito
E me deu força pra mais um passo.

É provável que não mais a veja...
Não dará pra mostrar gratidão.
Mas desejo onde quer que ela esteja
Que lhe afaguem com amor o coração.

Foi depois desse dia sublime,
Do sorriso que a mim trouxe paz,
Duma estranha mudar meu destino
Que aprendi a sorrir muito mais.

Ícaro Olavo - o melhor amigo do mundo!

quinta-feira, novembro 13, 2008

Tô a fim de fazer uma revolução!

:D:D:D

;)

Doce infância

Um colega meu do curso de Cinema (ele leu esse blog uma vez, não sei se chegará a ver isso aqui) disse que estudou numa escola com educação do tempo da pedra: a professora chegava ao cúmulo de colocá-lo de joelhos em cima do milho. Detalhe: o nome da escola era Doce Infância. Tipo, doce o quê? oi?

Agora entendi o fato de ele ter concordado comigo na aula de Direção. Após o professor dizer que uma professora de um determinado roteiro estava "malvada demais", ele afirmou que "isso existe sim".

Essa história do meu colega dá um filme. Assim como a da minha professora querida que não me deixou sair da aula para fazer xixi (como alguém faz isso com uma criança do Jardim de infância?) , e eu acabei mijando nas calças ali mesmo. Garooooooooota! ;)

Esses adultos ficam com essa mania de "humanizar" tudo. Pra criança é mais fácil: ou tem aquele amor maternal ou não passa de uma maldita opressora.

PS: A história do meu colega parece conversa de pescador.

A canção tocou na hora "errada"

Há momentos em que uma pessoa fala meio mundo de besteira para moi, e nessas horas eu só penso o quanto seria belo e verdadeiro se eu apenas fizesse o seguinte gesto: respirar fundo e soltar um pum.

Sim, meus caros, um pum! Desculpem-me os leitores que esperam de mim uma dama (não devem ter lido muitos posts), mas quão estupenda seria a mais autêntica manifestação da minha irreverência diante de tamanha imbecilidade humana!

Meu pum soaria malandro, daqueles puns altos e sem fedor, uma resposta em flatulências ao que não merece os ouvidos - só uma mangação vinda do cu.
Fiz uma promessa. Antes de deletar a porcaria do meu orkut, imaginei quais possíveis utilidades ele teria em minha vida. Tá, eu tenho enorme apego por gente que sequer conheço pessoalmente, masss... essas pessoas (que não são muitas) estão no meu msn, hehe. Então quaaase apaguei meu orkut... Aí foi que eu atribui uma utilidade àquela coisa. O orkut seria o instrumento para que eu conseguisse concretizar um determinado objetivo... Dei poucos dias para que isso ocorra, caso não, deletarei aquela joça. Aguardem cenas dos próximos capítulos.

quarta-feira, novembro 12, 2008

Je suis très chiq

- Você não é nada burguesa - disse certa vez uma colega minha cujo sobrenome é Rochs.

Realmente, eu não sou nada burguesa. Há algo de plebéia em minha essência.

Lembro-me que, quando criança, eu adorava ir aos cafundós do sertão de Sergipe para visitar minha avó. Lá ela me deixava comer com as mãos, algo que minha mãe jamais permitiria. Eu dançava nos forrós pé-de-serra da vida, me enfiava no mato, e chegava ao cúmulo de correr atrás dos sapinhos.

Além de gostar do sertão, eu costumava dormir num cubículo onde a empregada doméstica morava, lá no Bairro América. Era um lar de apenas um cômodo, e o banheiro se situava num corredor, e era dividido com os demais moradores do lugar.

Não é que eu visse a pobreza como algo glamouroso, ou quisesse ser muito pobre, mas nunca tive muitas frescuras. Prova disso foi minha passagem pela aldeia hippie - pouquíssimas pessoas que conheço não pediriam arrego num local sem energia elétrica e água encanada. Só que eu me diverti a beça, e, caso haja outra oportunidade, estarei lá.

Comigo a diversão não precisa custar caro. Às vezes saio de casa com alguns trocados no bolso e garanto que posso até curtir mais do que certas pessoas que gastam 60 reais numa noite. Também não tenho frescuras de andar de ônibus, e mimimi. Eu sou uma "pobre" bem resolvida. Eu vou de ônibus mesmo e não tenho problema com isso. A noite é uma criança e quero mais é curtir!

Para completar a minha atitude "nada burguesa", eu não sei me equilibrar numa porcaria de um salto. Às vezes tento usar aquela joça, mas o desconforto é tão grande, e a dificuldade de se locomover também, que não tem essa de posh girl - ao chegar à festa de formatura de uma amiga fui logo tirando as sandálias para aproveitar os embalos de sábado à noite com os pés livres, leves e soltos. Sem perder o glamour, claro.

segunda-feira, novembro 10, 2008

Injeção na testa

Eu costumava dizer que "de graça, topo até injeção na testa". Acho que foi por isso que aceitei o convite da minha tia para viajar à praia do Conde, na Bahia, com tudo pago por ela. Está certo que as intenções dela foram boas (eu não pagaria 180 reais por más intenções), mas há um conflito gritante entre o que eu penso sobre diversão e o que ela imagina que isso seja.

Tudo começou quando, ainda no ônibus, o líder da excursão se mostrou quando falou ao microfone e, em seguida, percebi que aquele era um grupo da igreja do Grageru ao ver o microfone ser entregue nas mãos do padre Raimundo. Lembro muito bem daquele padre, ele foi responsável por um trauma de infância.

Todo santo ano novo, minha avó me obrigava a passar a virada numa missa dele, e recordo que o tal padre (espero sinceramente que ele não leia esse blog) além de cantar MUITO mal, GOSTAVA de cantar, e demorava HORAS discursando. A frase da minha avó, que fingia amar o discurso dele enquanto dava capengadas na cabeça como quem quer dormir, cai como uma luva neste momento: no discurso de um padre, nos primeiros 10 minutos quem fala é Deus. Após meia hora, quem fala é o homem. Depois de uma hora, quem tagarela é o diabo, que afasta o fiel da igreja. -Amém-

Quando o padre começou a discursar no ônibus, eu fiquei ansiosíssima torcendo para que ele não ficasse rezando uma missa ali mesmo. Sorte a nossa que ele só proferiu algumas poucas palavras desejando boa viagem a todos, e rezou um pai nosso e uma ave maria.

Está bem. Ajeito a cadeira para me deitar, na esperança de dormir durante toda a viagem, afinal, havia acordado muito cedo e dormido apenas três horas. Daí que ligam o bendito DVD. Quem inventou o uso de DVDs em ônibus? Quem disse que isso é legal? Num ônibus existem diversas pessoas com diversos gostos - digo, ou será que eu era a única ali que não estava nem um pouco a fim de ouvir o Belo numa telona cantando com o Padre Marcelo para uma multidão?

Isso mesmo: o BELO. Mal pude acreditar. Ao ver o padre Marcelo num show olhando com cara de santidade para o telão com a imagem do cantor Belo, eu fiz instantaneamente a seguinte observação: O BELO NÃO É TRAFICANTE? Ok. Pára o mundo que eu quero descer! Quase solto esse comentário aos ouvidos de uma católica que estava ao meu lado, até ver que ela estava adorando o showzinho do Belo. Aí o padre Marcelo disse para não sei quantas milhares de pessoas do espetáculo: Meus queridos, quem gosta do Belo? Então batam palmas para o Belo!

Como se não bastasse o Belo, depois vieram os cantores sertanejos Daniel e Leonardo. E ainda teve Paulo Ricardo cantando Deus é dez num ritmo que só me fazia crer que ele havia feito uma versão religiosa para Olhar 43.

Chegando ao hotel, os companheiros de excursão viraram pessoas normais - ou seja, pediram cerveja e mandaram o garçon aumentar o som. E, claro, reclamaram que a cerveja estava quente. Só que existe um limite na minha cabecinha com relação a aceitar a normalidade da minha tia. Explico. Havia um brinquedo lá chamado tirolesa, que consiste num banquinho em que a pessoa se senta para então colocar as mãos numa barra fixada a uma corda, e em seguida a pessoa desce a toda velocidade a alguns metros de altura sobre um rio. Pois então. Meu primo (de uns 13 anos), filho da tia em questão, decidiu brincar na tirolesa, mas não estava acertando subir no banquinho de madeira. Toquem os tambores para o comentário da minha tia.

- Filho, senta nesse pau direito! - e depois solta uma gaitada.

Atenção para o meu semblante de "q!". Para completar, a católica fervorosa que estava ao meu lado diz "É pra aprender desde pequeno né?", e dá boas risadas em uníssono com minha tia, o que comprovava aos meus olhos pasmos que minha tia não havia dito "senta nesse pau direito!" por inocência.

Na volta, alguns passageiros proferiram um "woo-hoo" ao ouvir soar no ônibus uma cantora que cantava algo como Quem for mulher bate no litro, quem for mulher levante o litro e dá uma golada. Essa cena era pura contradição para mim, que a montava na minha mente junto ao piti que minha tia deu por eu ter tomado caipirinha.

- Caipirinha? Quem foi que tomou isso? Isso faz mal!

- Faz é bem, minha senhora - interveio o recepcionista.

E olha que nem dei bafón, ao contrário de certos senhores que estavam lá, mas enfim... Não demorou muito para a oposição (da mesma religião) tirar o DVD da banda que falava do tal litro e substitui-lo por um video de uma missa do Padre Zezinho - que era até melhor do que aquela música horrível de banda de forró eletrônico.

Agora que já estou em casa só penso que nunca mais tomarei um gole de álcool na frente de familiares, nem nunca mais quero ouvir piadas da minha tia. Talvez sejamos todos conservadores, cada um a seu modo. Ela não quer me ver tomando caipirinha, e eu não quero ouvir suas piadinhas. Saldo positivo: pelo menos estive numa praia linda e deserta, e me banhei numa lagoa de águas gostosas e azuladas.

quarta-feira, novembro 05, 2008

Falei agora a pouco a uma amiga que gosto de fingir que tenho determinada coisa - não vou dizer o que é aqui no blog. Daí quando eu abri a janela do msn foi um tapa na cara virtual a frase dela. Algo como "você poderia ter essa coisa, ao invés de fingir que tem", o que associei instantaneamente ao que ela tinha falado antes, tipo "o que você ainda está fazendo nessa situação?".

terça-feira, novembro 04, 2008

Quem quiser que me critique

Certa vez, numa aula nos primeiros períodos da universidade, as pessoas discutiam sobre crítica de cinema. A maioria absoluta defendia que a crítica é uma prática completamente inútil. O crítico, como manda o senso comum, não passa de um criador frustrado. O próprio Truffaut chegou a afirmar isso em 1955, na revista Arts. Só que não demorou muito para o crítico Truffaut realizar filmes memoráveis, como Fahrenheit 459, Quem atirou no pianista?, Jules e Jim, Os incompreendidos, entre outros.

Além de criador frustrado, o crítico pode ser acusado de cabeçudo demais, teórico que vive no mundo das nuvens refletindo sobre coisas que não levam a lugar algum. Daí que a gente tem aqueles bons e velhos exemplos de críticos como André Bazin, fundador da revista Cahiers du Cinéma, a maior revista de crítica de cinema do mundo, e aqui no Brasil temos o Paulo Emílio Salles Gomes, que contribui e muito para a formação de uma cultura cinematográfica brasileira. Eles não realizaram filmes, entretanto, não foram poucos os cineastas que se inspiraram neles - dá-lhe Nouvelle Vague na França e Cinema Novo no Brasil.

Mas por que o crítico tem uma imagem tão negativa? Arrisco uma resposta: há pouquíssimos críticos que valham a nomenclatura que lhes é auferida. A maioria dos "críticos" é formada por pseudo-críticos. Vamos a alguns dos procedimentos desse tipo de crítica.

Antes de tudo, a fama que o crítico tem de ser uma pessoa ranzinza advém dos pseudo-críticos. Eles acham O MÁXIMO sair desferindo os mais duros impropérios contra os filmes alheios. Por isso que certa vez o crítico Jairo Ferreira fez questão de esclarecer em um texto seu - "não estou sendo irônico nem maldoso, estou sendo crítico". Para Jairo, sarcasmo barato é uma coisa e a crítica é outra, o que não funciona tendo em vista a maioria dos críticos. O sarcasmo é uma forma de argumentação bastante atraente às vezes, entretanto, os idiotas se utilizam dele a esmo. Não gostou do filme? Então lá vem uma enxurrada de piadinhas que não se baseiam em nada além do pretenso humor "inteligente" do pseudo-crítico, e que têm como critério apenas o "gosto" ou "não gosto".

Na hora de elogiar, os pseudo-críticos são mais imbecis ainda. Eles não se sentem seguros o suficiente para exaltar um filme - afinal, pega mal pra caramba dizer que tal obra é um dos melhores filmes do ano, e depois conferir a opinião da galera da crítica e ver que está todo mundo metendo o sarrafo - então o pseudo-crítico dá um saque nos textos do pessoal primeiro, e seguindo a levada dos críticos renomados reproduz a opinião deles, ou até mesmo algumas palavras. Como se não bastasse, na hora de elogiar o filme não faltam análises vagas, repletas de adjetivos - já disse que adjetivo é a principal arma dos estúpidos? Então o cara não sabe porríssima nenhuma do que está falando e entope o texto de observações brilhantes como "a fotografia é belíssima", "a atuação é bastante convincente" ou "a trilha sonora é tocante". Tais opiniões só evidenciam uma coisa: o quanto o pseudo-crítico não sabe sobre estética do cinema e fica rodopiando em adjetivos que não falam coisa com coisa.

Agora, se "os críticos" têm essa má fama, a gente sabe muito bem de onde ela vem. Então muita gente fala que a crítica é inútil e que prefere ver o filme sem influência de ninguém. Só acho que a função da crítica não é dizer a verdade, mas tão somente prolongar o debate, e assim o filme dura mais do que aquele tempo que passamos na sala de projeção. Acredito que a crítica não serve para "ensinar" a interpretação mais aprofundada do filme, todavia nos chama atenção para certos aspectos, e nós até podemos ir além das palavras do crítico a partir do incentivo da discussão e, destarte, indentificarmos outros tantos aspectos numa obra cheia de possibilidades.

Vou contar até sete...

Depois de contar a um amigo o fato de ter me decepcionado com determinada pessoa, assim que ele se pôs, como sempre faz, a defender a tal pessoa, sua namorada fez uma intervenção inusitada.

- Cuidado com o que você defende.

Essa frase sintetizava em poucas palavras a indignação que ela tinha por ele costumar ser tão complacente com aqueles que se encontram no banco dos réus. Não faz muito tempo desde que uma amiga dele desabafou sobre algumas atitudes impensadas do seu noivo, e ele ressaltou, entre outros pontos, quantas coisas eles viveram juntos, coisas que não são para jogar fora assim do nada. Não deu outra: logo depois o noivo dela aprontou de novo.

Destarte, diferente de outras ocasiões, dessa vez meu caro amigo proferiu uma frase que me pareceu deveras sensata.

- Se uma pessoa lhe faz mal uma vez, a culpa é dela. Se duas, a culpada é você.

Ora ora, veja só! Mas é claro! Essa frase um tanto quanto anti-cristã ensina algo que tem todo sentido seja em relacionamentos amorosos ou com amizades também. Acredito que não se trata de se tornar uma pessoa rancorosa, não obstante significa entender que quando uma pessoa comete uma falha grave com você é hora de você deixá-la se foder. As pessoas cometem erros na vida, é fato. Entretanto, se essa pessoa errou comigo, eu não tenho a obrigação de aceitá-la ainda. Ela pode seguir em frente e ver a merda que fez. Parece que quando perdoamos certas atitudes, as pessoas perdem o respeito e se sentem no direito de fazerem o que bem entendem. Há relações que ficam completamente esvaziadas, sem confiança e repletas de mágoas que só fazem atravancar a nossa vida.

Por isso que, se quando eu era uma boa cristã eu defendia que devemos perdoar "setenta vezes sete", e, depois de um tapa, "oferecer a outra face", hoje acredito que devo contar até sete para a pessoa sumir da minha frente e, após "baterem na minha face", devo fazer a egípcia.