Tava estudando uma apostila da disciplina eletiva que peguei, Introdução à psicologia do desenvolvimento, e achei uma coisa muito interessante.
Nosso pensamento funciona através de imagens e de signos adquiridos socialmente. Imagine a seguinte situação, você tá segurando um vaso prestes a cair e eu quero evitar que isso aconteça. O que deve ser dito?
a- NÃO QUEBRE O VASO!
B- SEGURE BEM O VASO!
E aí, escolheu qual alternativa? Vamos lá.
Já que nossas representações mentais são imagens, quando eu digo Não quebre o vaso, você já imagina, de forma muito rápida, que está quebrando. Se eu digo, Segure bem o vaso, você pensa que está segurando o objeto com força, e que não vai deixá-lo cair de forma alguma.
Daí pensei uma coisa. Tá aí porque costumamos adorar o que é proibido. Quando uma mãe fica enchendo o saco, filha, não dê não, não fume maconha, a menina vai e... ram ram, enfim.
sexta-feira, junho 30, 2006
segunda-feira, junho 26, 2006
Impressões de um filme
Um condenado à morte escapou, Robert Bresson, 1956
Os guardas de uma prisão na França durante a ocupação nazista avisam que irão recolher os lápis dos prisioneiros, pois eles estariam usando-os para se comunicar através de bilhetes. Durante todo o tempo, eles tentam manter os prisioneiros afastados.
Fountaine é um tenente da guarnição francesa, e recebe o aviso de um colega: Você é o único que pensa em escapar, veja esses muros, é impossível fugir daqui. Mas Fountaine não desiste, e está sempre tentando se comunicar com os prisioneiros para falar de liberdade.
Às vezes Fountaine escutava tiros e acreditava que um de seus colegas havia sido executado. Em alguns casos ele errava, e de uma hora para outra um companheiro seu nos surgia, e outras vezes ele acertava, e as imagens não nos davam explicações. Bresson nos deixa assim como Fountaine, que em determinado momento do filme diz, alguns desaparecem do nada, outros surgem do nada.
A prisão não comporta mais tantos prisioneiros, e alguns são aglomerados em dupla numa única cela. Não lembravam os opressores que aqueles homens deviam ser mantidos distantes uns dos outros?
No dia em que Fountaine recebe sua sentença de morte, Jost chega à sua cela. Fountaine o vê conversando com um dos guardas, e avisa a Jost que não é possível servir a dois mestres, e ele não deveria ficar do lado dos nazistas em troca de favores, pois no fim de tudo eles iriam perder. Fountaine se pergunta se deveria matá-lo para poder escapar, se Jost não seria um traidor. Mas aos poucos vai formando um laço com o menino de apenas 16 anos, que queria tanto voltar pra sua mãe e sua irmã. Assim como Fountaine, quando enquanto labora a corda com a qual vai fugir, percebe aqueles nós semelhantes às tranças que sua mãe fazia em sua irmã.
Fountaine e Jost se unem para tentar fugir, e cada passo dos dois é acompanhado pela nossa ânsia, mesmo que Bresson já nos tenha avisado de que Um condenado à morte escapou. E Bresson quer nos deixar claro de que o mais importante ali não é o suspense. Nós acompanhamos os passos de ambos pelos ruídos de seus pés sobre as pedras onde pisavam com todo o cuidado para não chamar a atenção dos guardas, ouvimos apitos, e Bresson prefere a sinfonia dos ruídos de uma realidade árdua à música extra diegética.
Alguns afirmam a extrema religiosidade de Bresson em seus filmes guiados pelo jansenismo, e que alguns de seus personagens são redimidos pelo amor, como em Pickpocket(1959). Apesar da influência da religiosidade do autor, não a vejo como um elemento central da obra. Bresson está muito mais para uma base materialista, há uma enorme perspicácia no seu tratamento das relações sociais. Em Um condenado à morte escapou, Bresson tece a consubstancialização entre Jost e Fountaine ( em Au hasard Balthazar(1966), Marie e o burrinho Balthazar também são consubstanciais), e há construção de laços entre os dois, mas Bresson não trata de redenção pelo amor. Ele nos fala de conflitos de classe, e da importância da união de uma classe em prol de uma insurreição.
Após pular os muros da prisão, Jost diz: Ah, como minha mãe iria se orgulhar de mim nessa hora! Os personagens de Bresson se conduzem para a ascese, ele que via o filme como um ritual sacro. Jost e Fountaine não podem correr, eles não nos parecem tão livres caminhando com medo das pedras e dos pés para fazer silêncio, pois a qualquer instante os guardas poderiam apanhá-los.
domingo, junho 25, 2006
Um pedido
Ando muito ocupada para essas coisas de poesia. Não, eu não queria isso. Mas veja só, ou vou viver no campo e plantar e matar bois com marteladas, ou fico por aqui, destinando tudo em volta de um doutorado. É, tudo agora é pesquisa, artigos, livros e papéis espalhados em cima da minha cara refletida na mesa. Acabaram as paixões infantis, a cachaça, a vagabundagem. É... Posso dizer que fantasticamente me sinto bem melhor assim. Adoro estar stressada. Ah, mas por tudo que há de mais profano: tirem tudo de mim, só não me tirem a poesia!
sábado, junho 24, 2006
Madonna
Sei que existe um consenso sobre o fato de que Madonna deveria voltar a ser puta. Há até comunidades no orkut dedicadas a isso. Mas eu só comecei a gostar da Madonna quando ela veio com aqueles papos de cabala, e lembro-me como hoje de que via infinitas vezes aquele clipe Frozen, em que ela parece uma águia num deserto de gelo (ui). Quando eu era criança, simplesmente achava a Madonna puta. Nem mais nem menos do que isso.
Eu me tornei fã dessa mulher. Não só porque ela é a rainha de grande parte dos gays, e toda hora muda de cabelo, e se contorce toda aos sei lá quantos anos. Mas porque ela canta Haven’t we met? You’re some kind of beautiful stranger, you could be good for me, I have a taste for a danger…
Sim, ela é um produto da indústria cultural estadunidense, mas adorei ver crianças mulçumanas num desfile de moda, o recanto da futilidade, e depois Madonna jogando uma bomba na cara de Bush, tudo isso num videoclipe da MTV. Madonna é a própria contradição, a mulher que critica a elite estadunidense e faz parte dela, que uma hora é devassa, e outra hora é mãe de família, tudo com muita sagacidade e estratégia de marketing.
Analise this...
Top 10
Beautiful stranger
Love profusion
American pie
Die another day
Like a prayer
The power of goodbye
Ray of light
Like a virgin
Holiday
Material girl
domingo, junho 18, 2006
Olando
O homem tem a mão livre para agarrar a espada; a mulher deve usá-la para impedir que as sedas escorreguem de seus ombros. O homem encara o mundo de frente como se ele fosse feito para seu uso e de acordo com o seu gosto. A mulher lança-lhe um olhar de esguelha, cheio de sutileza, e até de desconfiança. Se usassem as mesmas roupas, é possível que sua maneira de olhar tivesse vindo a ser a mesma.
Isso é a opinião de alguns filósofos e sábios, mas nós temos outra. A diferença entre os sexos tem, felizmente, um sentido mais profundo. As roupas são meros símbolos de alguma coisa profundamente oculta. Foi uma transformação do próprio Orlando que lhe ditou a escolha das roupas de mulher e do sexo feminino. E talvez nisso ela estivesse expressando apenas um pouco mais abertamente do que é usual- a franqueza, na verdade, era sua principal característica- algo que acontece a muita gente ser ser assim claramente expresso. Pois aqui de novo nos encontramos num dilema. Embora diferentes, os sexos se confundem. Em cada ser humano ocorre uma vacilação entre um sexo e outro; às vezes só as roupas conservam a aparência masculina ou feminina, quando, interiormente, o sexo está em completa oposição com o que se encontra à vista. Cada um sabe por experiência as confusões e complicações que disso resultam; mas deixemos aqui o problema geral, e observemos somente o seu singular efeito particular de Orlando.
Porque a mistura e alternada preponderância de homem e mulher é que frequentemente davam à sua conduta um giro inesperado. As mulheres curiosas perguntariam, por exemplo: se Orlando era mulher, como não levava mais de dez minutos a vestir-se? E não eram suas roupas escolhidas mais ou menos ao acaso, e às vezes estavam até um pouco gastas? E diriam ainda que lhe faltava um certo formalismo masculino e o amor que os homens têm ao poder. Seu coração era excessivamente terno. Não podia ver espancar um burro nem afogar um gatinho. Embora observassem ainda que detestava assuntos domésticos, levantava-se de madrugada e saía pelos campos, no verão, antes de raiar o sol. Nenhum fazendeiro conhecia melhor do que ela as coisas da colheita. Podia beber com os mais fortes e jogar jogos de azar. Montava bem, e era capaz de dirigir seis cavalos a galope pela Ponte de Londres. Embora ainda, apesar de audaciosa e ativa como homem, se notasse a vista de alguém em perigo lhe produzia palpitações das mais femininas. Rebentava em lágrimas à mais leve provocação. Não era versada em geografia, achava matemática intolerável, e sustentava certos caprichos mais comuns nas mulheres do que nos homens, como, por exemplo, que viajar para o sul é descer uma encosta. No entanto, se Orlando era mais homem ou mulher, é coisa difícil de dizer e não pode ser resolvida agora.
Virginia Woolf
Sobre o nobre Orlando, que se transforma em mulher. Sobre nós, que homens ou mulheres, acima de tudo somos humanos.
sábado, junho 17, 2006
Cada um na sua
Já ouvi muita gente dizer ah, não tenho problema nenhum contra gays, eu só detesto aqueles gays escandalosos, eles não se dão ao respeito, se pelo menos fossem homens, uma coisa é ser bicha outra coisa é ser homossexual, homossexual eu respeito. À merda! É cada uma, e daí se o cara quer botar silicone, pintar as unhas de vermelho, e botar um tamanco plataforma com um salto enorme? Deixe o cara! Ele veste o que ele quiser, não é da sua conta. Por que ele não merece ser respeitado? Por que imbecis como você se sentem incomodados com a homossexualidade dele? Homossexual tem que se comportar igual a hetero pra ser respeitado, por quê? Porque eles dão o cu e isso é feio? Que é que você tem a ver com o cu dos outros? Cuide do seu cu, porra!
sexta-feira, junho 16, 2006
Minha honey baby
Hoje estava conversando com pessoas queridas e percebi que há uma crise comum em gente da nossa idade. Vinte e poucos anos, já não somos adolescentes. E eu achava que era só eu. Mas certamente é algo que traz uma evolução através de muitos questionamentos. Digo, na verdade, ou você afunda, ou evolui. No caso, escolhi lutar. Elas também. Estranho é perceber que idéias que tínhamos sobre as pessoas, sobre o mundo, sobre nós, eram ilusões. Então relativizamos tudo, e aderimos ao ceticismo para, de certa forma, nos sentirmos pisando em chão seguro. Oh sim, eu estou tão cansado, mas não pra dizer que não acredito mais em você... É isso, parece que se encaixa na música. "Você" é qualquer coisa em que deixamos de acreditar. Como os caras pintadas que cantavam essa canção por não acreditar mais num determinado governo. E você? Tem a sua "honey baby"?
Vapor barato
Oh, sim, eu estou tão cansado
Mas não pra dizer
Que eu não acredito mais em você
Com minhas calças vermelhas
Meu casaco de general
Cheio de anéis
Vou descendo por todas as ruas
E vou tomar aquele velho navio
Eu não preciso de muito dinheiro
Graças a Deus
E não me importa, honey
Minha honey baby
Baby, honey baby
Oh, minha honey baby
Baby, honey baby
Oh, sim, eu estou tão cansado
Mas não pra dizer
Que eu tô indo embora
Talvez eu volte
Um dia eu volto
Mas eu quero esquecê-la, eu preciso
Oh, minha grande
Ah, minha pequena
Oh, minha grande obsessão
Oh, minha honey baby
Baby, honey baby
Oh, minha honey baby
Honey baby, honey baby, ah
Trilha sonora de Terra estrangeira, de Walter Salles
quinta-feira, junho 15, 2006
Ser gente
Toda essa gente
Eu como gente
Eu quero gente
Odeio gente
Eu amo gente
Filosofia, antropologia, sociologia
Psicologia, a gia a gia
A ciência
E a crença
Prosa, poesia
Eu como gente
Eu quero gente
Olhar nos olhos, chegar mais perto
Tenho mãos feitas para o afeto
Gosto do que sente e é humano
Do que inventa e não sabe
Profano
Eu tenho amor fati
Amo tudo o que está vivo
Até mesmo a dor
Até mesmo a dor
E alegria, alegria
Porque mais do que ser contente
Eu sou gente
Eu vivo, eu vivo
Quando eu morrer
Que me façam outra
Pra cair na terra saindo debaixo do chão
Porque não vou pro céu
Eu ser
Um ser vivo
Ser bruta
Todo ser vivo homem
É ser bruto: agressivo, atrevido, cavalo, desaforado
Bruto
E vivo
Eu como gente
Eu quero gente
Odeio gente
Eu amo gente
Filosofia, antropologia, sociologia
Psicologia, a gia a gia
A ciência
E a crença
Prosa, poesia
Eu como gente
Eu quero gente
Olhar nos olhos, chegar mais perto
Tenho mãos feitas para o afeto
Gosto do que sente e é humano
Do que inventa e não sabe
Profano
Eu tenho amor fati
Amo tudo o que está vivo
Até mesmo a dor
Até mesmo a dor
E alegria, alegria
Porque mais do que ser contente
Eu sou gente
Eu vivo, eu vivo
Quando eu morrer
Que me façam outra
Pra cair na terra saindo debaixo do chão
Porque não vou pro céu
Eu ser
Um ser vivo
Ser bruta
Todo ser vivo homem
É ser bruto: agressivo, atrevido, cavalo, desaforado
Bruto
E vivo
São tantas emoções
Faz tanto tempo que não me apaixono por uma banda. Fazer declarações de amor absurdas e dizer, essa é a música da minha vida, é pra sempre, eu sei. E que seja infinito enquanto dure.
Cara, eu quero me apaixonar por uma banda!
Cara, eu quero me apaixonar por uma banda!
Nunca mais
- Essa é a última vez que a gente vai ser ver. Tá ouvindo? A última! É a última vez que a gente se vê na vida!
Voltei os olhos para trás, e vi uma camisa laranja, mal perebi o rosto do homem, virei-me de novo, e permaneci esperando a minha amiga no terminal. A mulher nada disse. Que diálogo estranho de se ouvir. Coisas da vida.
Voltei os olhos para trás, e vi uma camisa laranja, mal perebi o rosto do homem, virei-me de novo, e permaneci esperando a minha amiga no terminal. A mulher nada disse. Que diálogo estranho de se ouvir. Coisas da vida.
terça-feira, junho 13, 2006
Radiohead
Estava pensando em como descobri o Radiohead e, veja só, não é uma história fabulosa. Eu simplesmente loquei The Bends na CD Club. Não, pior, a primeira vez que ouvi a banda foi num comercial, e quando a minha professora botou pra tocar na aula de inglês As long as you love me e Fake Plastic Trees, eu gostei mais da música dos Backstreet boys. Sim, eu me tornei fã dos Backstreet boys ouvindo a Jovem Pan, e tinha posters, vídeos, e sabia a comida preferida de cada um. Todo mundo já fez merda na vida, né?
Quando loquei The Bends, na época já começara a curtir rock graças a Jim Morrison, e me apaixonei de cara. Ouvir o dia inteiro, adormecia escutando Radiohead. Depois foi o Ok computer, e gostei mais ainda, prefiro a fase mais eletrônica da banda.
Dizem que Radiohead é "depressivo". As músicas podem até ser tristes, mas me sinto bem pra caramba quando escuto, e canto com os olhinhos brilhando.
Cinco anos depois, Radiohead ainda é minha banda favorita. E meu irmão só veio descobrir a banda agora, fuçando minhas MP3, mesmo ouvindo há anos a música deles aqui em casa.
Tom Cruise em Vanilla Sky, bota o CD pra tocar no carro e diz: "This is Radiohead". Everything is in its right place...
Lindo, gostoso! Tá, eu sou fútil :P
Top 11
*Let down
*Karma police
*Optimistic
*There there
*Exit music (for a film)
*How to desapear completely
*The National Anthem
*Paranoid android
*Nice dream
*Bullet proof... I wish I was
*You and whose army
De mulher pra mulher... Marisa!
Numa revista feminina da minha mãe...
“Venci o câncer duas vezes com cirurgias espirituais”
*
Você mede menos de 1,70m?
Corpo mais esbelto* Pernas mais longas* Auto-estima mais alta* Atreva-se a vencer nas melhores profissões* Vista com elegância* Conquiste a admiração e respeito das pessoas!
AUMENTE SUA ESTATURA
Se você não aumentar pelo menos 5 cm em 30 dias, eu devolvo seu dinheiro na hora.
Imagine-se com 15 cm a mais de estatura!
*
Solução definitiva para as rugas
Conheça a cirurgia que retira os músculos da testa e das laterais dos olhos.
*
SEDUÇÃO A FLOR DA PELE
Você sabia que a visão de uma imagem é o maior estímulo de um homem? E que eles não conseguem resistir a uma roupa sexy? Não deixe que ele VÁ BUSCAR EM OUTRA o que você já pode ter em sua casa. A linha de fantasias Mais Pimenta foi desenvolvida após anos de pesquisa em vários países.
*
FUI VÍTIMA DE UMA SUBSTÂNCIA MÁGICA
Veja estes depoimentos:
“Sentia que ele não me amava mais, e, apesar de todos os esforços que fiz, tinha a impressão de que ele era indiferente comigo, não percebia minhas novas roupas ou meu novo corte de cabelo. Uma amiga havia me dito desse perfume, quando recebi este perfume e coloquei algumas gotas em meu corpo... nunca pensei que um perfume fosse capaz de tal transformação, meu marido me desejava como em nossa lua de mel”.
Responsabilidade:
Você deve ser responsável pelo uso do perfume, nós não nos responsabilizamos por abusos ou violações pessoais, caso queira ter o poder da sedução.
Revista Malu, 8 de junho de 2006
segunda-feira, junho 12, 2006
A beleza do crime
Passo depois de passo ela desce rente aos meus olhos sem saber da vontade que me guarda. As escadas do meu prédio não têm fim ao meio dia, e ela, com seu corpo frágil deslizando na tarde quente, me parece um objeto inócuo perfeito para ser jogado escada abaixo. O meu pé nas suas costas, as coisas das suas mãos voando pro ar, e a saudade de toda a vida passando pelos olhos dela, que derramados no chão de sangue param de sonhar. Morte. Fim. Olá, boa tarde. De nada, não ia deixá-la com essas sacolas.
Não consigo entender esse meu desejo de matar. Nunca matei, homem covarde, reserva de peladas, menino protegido pela irmã, jamais me meti a espancar ninguém. Olhando para a faca que com o rapaz corta o coco, me dá uma gana de botar a cabeça dele na borda da mesa e corta-la como um coco, e ver sair água de sangue.
Sempre presto atenção quando as pessoas estão vulneráveis. Sabia que confiamos infinitas vezes uns nos outros todos os dias? Quando você entra num táxi, você confia no taxista, porque quem lhe garante que ele não vai estourar seus miolos e te deixar na casa de deus. Penso frequentemente sobre as minhas situações de vulnerabilidade. E imagino mil formas de matar.
O pânico guarda uma arma calibre 38 debaixo do meu travesseiro. Se for hora de acordar, eu me assusto com o despertador. Há tudo para temer. Só abro a porta olhando por entre a corrente. Talvez um dia me matem quando eu estiver desprevenido e aí vai ser a maior sacanagem da história.
A criança pequenininha me pede:
-Tio, dá pra você me ajudar - e me estende as mãozinhas enquanto a porta aberta do ônibus chama a rua para entrar.
Eu não poderia simplesmente empurrá-la escada abaixo?
Não consigo entender esse meu desejo de matar. Nunca matei, homem covarde, reserva de peladas, menino protegido pela irmã, jamais me meti a espancar ninguém. Olhando para a faca que com o rapaz corta o coco, me dá uma gana de botar a cabeça dele na borda da mesa e corta-la como um coco, e ver sair água de sangue.
Sempre presto atenção quando as pessoas estão vulneráveis. Sabia que confiamos infinitas vezes uns nos outros todos os dias? Quando você entra num táxi, você confia no taxista, porque quem lhe garante que ele não vai estourar seus miolos e te deixar na casa de deus. Penso frequentemente sobre as minhas situações de vulnerabilidade. E imagino mil formas de matar.
O pânico guarda uma arma calibre 38 debaixo do meu travesseiro. Se for hora de acordar, eu me assusto com o despertador. Há tudo para temer. Só abro a porta olhando por entre a corrente. Talvez um dia me matem quando eu estiver desprevenido e aí vai ser a maior sacanagem da história.
A criança pequenininha me pede:
-Tio, dá pra você me ajudar - e me estende as mãozinhas enquanto a porta aberta do ônibus chama a rua para entrar.
Eu não poderia simplesmente empurrá-la escada abaixo?
domingo, junho 11, 2006
O senhor é meu pastor, nada me faltará...
- Se você está sentindo dores de cabeça, insônia, ansiedade, se nada na sua vida parece ter solução, ah, meu amigo, você está com encosto. Venha para a sessão do descarrego nesse domingo na igreja...
Quantas pessoas no Brasil vivem ansiosas e passam a noite em claro pensando nas contas a pagar, têm dor de cabeça de tanta preocupação, e às vezes se sentem como se estivessem num beco sem saída? Me diga vá?
Seu Zé fica esparramado no sofá depois de um dia inteiro dando duro no batente e andando em transportes coletivos cheios de sovacos, quer qualquer diversão o mais imbecil possível, ou quer que dinheiro caia do céu, ou ir logo pro céu porque isso aqui é um inferno, Seu Zé pensa: Eu só posso estar com encosto! Claro que nem todo mundo é besta, mas Seu Zé está realmente, eu digo realmente desesperado, eu digo a ponto de vender o cu por cinco reais e um passe.
O que não falta por aí é Seus Zés. Dona Josefina diz que no seu bairro o povo adora deixar dinheiro nessas igrejas sem vergonha, ela esfrega esfrega a roupa, e passa a mão cheia de calos no rosto suado de cansaço. É, minha fia, eles mandam ir pra fila, quem for doar 50 reais... quem for doar 10... e quando você não paga o dízimo eles botam um risco vermelho no seu nome. Minha avó dá boas risadas e diz, mas repare, hoje em dia é tudo coisa do demônio, coitado, nem sabe de nada.
Quer ficar rico
faça uma igreja
nesse mundo capitalista
até Deus
até Deus, meu Deus!
é empresa.
quarta-feira, junho 07, 2006
Mestre Tom Zé
Oh senhor cidadão,
eu quero saber, eu quero saber
com quantos quilos de medo,
com quantos quilos de medo
se faz uma tradição?
*
De vez em quando
todos os olhos se voltam pra mim,
de lá do fundo da escuridão,
esperando e querendo
que eu seja um herói,
que eu seja um herói.
Mas eu sou inocente,
eu sou inocente,
eu sou inocente.
De vez em quando
todos os olhos se voltam pra mim,
de lá do fundo da escuridão
esperando e querendo
que eu saiba.
Mas eu não sei de nada,
eu não sei de nada,
eu não sei de nada.
De vez em quando
todos os olhos se voltam pra mim,
de lá do fundo da escuridão
esperando e querendo apanhar,
querendo que eu bata,
querendo que eu seja um Deus.
Mas eu não tenho chicote,
eu não tenho chicote,
eu não tenho chicote.
Mas eu sou até fraco,
eu sou até fraco,
eu sou até fraco.
*
Sobe no palco o cantor engajado Tom Zé,
que vai defender a classe operária,
salvar a classe operária
e cantar o que é bom para a classe operária.
Nenhum operário foi consultado
não há nenhum operário no palco
talvez nem mesmo na platéia,
mas Tom Zé sabe o que é bom para os operários.
Os operários que se calem,
que procurem seu lugar, com sua ignorância,
porque Tom Zé e seus amigos
estão falando do dia que virá
e na felicidade dos operários.
*
Na vida, quem perde o telhado
Em troca recebe as estrelas
*
Em muitos países do mundo a garota
Também não tem o direito de ser.
Alguns até costumam fazer
Aquela cruel clitorectomia.
Mas no Brasil ocidental civilizado
Não extraímos uma unha sequer
Porém na psique da mulher
Destruímos a mulher.
*
Filha da prática
Filha da tática
Filha da máquina
Essa gruta sem-vergonha
Na entranha
Não estranha nada
Meta sua grandeza
No Banco da esquina
Vá tomar no Verbo
Seu filho da letra
Meta sua usura
Na multinacional
Vá tomar na virgem
Seu filho da cruz.
Meta sua moral
Regras e regulamentos
Escritórios e gravatas
Sua sessão solene.
Pegue, junte tudo
Passe vaselina
Enfie, soque, meta
No tanque de gasolina.
*
O amor é velho, velho, velho
e menina.
O amor é trilha
de lençóis e culpa
medo e maravilha.
O tempo a vida lida
andam pelo chão,
o amor aeroplanos
O amor zomba dos anos,
o amor anda nos tangos,
no rastro dos ciganos,
no vão dos oceanos.
O amor é poço
onde se despejam
lixo e brilhantes:
orações, sacrifícios, traições.
*
Esta noite não quero saber de conselho
esqueça, deixe pra lá
me arranja um pecado
quente pra me consolar
pense bem que depois
tem o ano inteiro pra gente pagar
Cinqüenta gramas de amor
veja lá, é um bocadinho
vinte gramas até,
venha cá, é tão pouquinho.
Eu vou morrer se você
não quiser
me arranjar um pecadinho.
segunda-feira, junho 05, 2006
O amor é um fogo que arde sem se ver
Amor é um fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.
É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.
Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?
Luis Vaz de Camões
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.
É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.
Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?
Luis Vaz de Camões
O homem faminto
O poeta disse ao morador de rua
Que ia lhe escrever um poema
E lhe perguntou se tinha uma história de amor pra contar
O morador de rua disse que tinha fome
O jornalista disse ao morador de rua
Que estava fazendo uma matéria
E perguntou se foi ele quem roubou gente de bem, séria
Ele que vivia embaixo da ponte
O morador de rua disse que tinha fome
E ao ser preso o morador de rua pensou que não sabia
Não entendia esses homens
De letras, de armas, de bens
E disse que tinha fome
Todas as fomes.
Que ia lhe escrever um poema
E lhe perguntou se tinha uma história de amor pra contar
O morador de rua disse que tinha fome
O jornalista disse ao morador de rua
Que estava fazendo uma matéria
E perguntou se foi ele quem roubou gente de bem, séria
Ele que vivia embaixo da ponte
O morador de rua disse que tinha fome
E ao ser preso o morador de rua pensou que não sabia
Não entendia esses homens
De letras, de armas, de bens
E disse que tinha fome
Todas as fomes.
sábado, junho 03, 2006
Toda unanimidade é burra?
Na aula de redação na oitava série, a professora explica:
- Senso comum é o que todo mundo diz, é clichê, afirmação generalista e sem embasamento. Um exemplo é aquela velha frase "Políticos são todos ladrões". Para escrever uma boa dissertação, vocês devem fugir do senso comum, procurar se embasar para levantar argumentos fortes.
Depois de anos e anos de estudo, eu regresso à sabedoria popular.
Políticos são todos ladrões.
- Senso comum é o que todo mundo diz, é clichê, afirmação generalista e sem embasamento. Um exemplo é aquela velha frase "Políticos são todos ladrões". Para escrever uma boa dissertação, vocês devem fugir do senso comum, procurar se embasar para levantar argumentos fortes.
Depois de anos e anos de estudo, eu regresso à sabedoria popular.
Políticos são todos ladrões.
sexta-feira, junho 02, 2006
Penso, logo, existo
Eu me cansei da ciência,
e dos seus títulos, seu método,
e dos seus méritos.
Talvez não fosse necessário escrever.
Talvez.
Nem ler, nem ser nada além da paisagem.
Nada que se volte para dentro.
Nem pensar sobre as coisas do mundo.
Expressar todo o inconformismo contra as relações de poder em palavras escritas não é contraditório?
Bradar contra a racionalidade através da filosofia não é contraditório?
E o que tem o cão, a vaca, a rã, com a filosofia?
E como quer o homem melhorar o mundo com seu conhecimento
se o conhecimento é o câncer da humanidade e o que tornou a humanidade o câncer do mundo?
O conhecimento, com que nós edificamos o progresso, sim, nosso belo progresso,
Da alquimia que transformou o sangue em ouro
Esse conhecimento para nós, pequenos burgueses,
acharmos que fazemos alguma coisa.
Essa tal sabedoria, que se volta contra a falsa consciência,
mas não é ela mesma falsa consciência quando confunde o saber com agir?
Ela não se deita sobre um livro e dorme comida pelas traças?
Mas como destruir a razão usando a razão?
E o que estou fazendo dizendo essas palavras?
Queria ser bicho, coisa misturada à Natureza.
Mas já nasci homem.
No masculino é a espécie
E só sei de que nada sei
mas não seria preciso não saber de que nada sabe?
o rato não sabe de que nada sabe
a ele não interessa.
e dos seus títulos, seu método,
e dos seus méritos.
Talvez não fosse necessário escrever.
Talvez.
Nem ler, nem ser nada além da paisagem.
Nada que se volte para dentro.
Nem pensar sobre as coisas do mundo.
Expressar todo o inconformismo contra as relações de poder em palavras escritas não é contraditório?
Bradar contra a racionalidade através da filosofia não é contraditório?
E o que tem o cão, a vaca, a rã, com a filosofia?
E como quer o homem melhorar o mundo com seu conhecimento
se o conhecimento é o câncer da humanidade e o que tornou a humanidade o câncer do mundo?
O conhecimento, com que nós edificamos o progresso, sim, nosso belo progresso,
Da alquimia que transformou o sangue em ouro
Esse conhecimento para nós, pequenos burgueses,
acharmos que fazemos alguma coisa.
Essa tal sabedoria, que se volta contra a falsa consciência,
mas não é ela mesma falsa consciência quando confunde o saber com agir?
Ela não se deita sobre um livro e dorme comida pelas traças?
Mas como destruir a razão usando a razão?
E o que estou fazendo dizendo essas palavras?
Queria ser bicho, coisa misturada à Natureza.
Mas já nasci homem.
No masculino é a espécie
E só sei de que nada sei
mas não seria preciso não saber de que nada sabe?
o rato não sabe de que nada sabe
a ele não interessa.
quinta-feira, junho 01, 2006
Lisbon revisited
NÃO: Não quero nada.
Já disse que não quero nada.
Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.
Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!
Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) —
Das ciências, das artes, da civilização moderna!
Que mal fiz eu aos deuses todos?
Se têm a verdade, guardem-na!
Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?
Não me macem, por amor de Deus!
Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?
Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja da companhia!
Ó céu azul — o mesmo da minha infância —
Eterna verdade vazia e perfeita!
Ó macio Tejo ancestral e mudo,
Pequena verdade onde o céu se reflete!
Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.
Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo...
E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!
Álvaro de Campos
Já disse que não quero nada.
Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.
Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!
Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) —
Das ciências, das artes, da civilização moderna!
Que mal fiz eu aos deuses todos?
Se têm a verdade, guardem-na!
Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?
Não me macem, por amor de Deus!
Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?
Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja da companhia!
Ó céu azul — o mesmo da minha infância —
Eterna verdade vazia e perfeita!
Ó macio Tejo ancestral e mudo,
Pequena verdade onde o céu se reflete!
Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.
Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo...
E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!
Álvaro de Campos
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