domingo, fevereiro 12, 2006

A bosta que veio do céu. É pau, é pedra, é o fim do caminho.

Nas minhas andanças em Aracaju City...

Gritos ininteligíveis no caos do pensamento. Bosta no chão do ônibus. Fecha, fecha tudo, fechem as janelas, eles podem mandar mais. Impactos de janelas se fechando. Como é que pode uma coisa dessa, ein? Tem que pegar um safado desse, quebrar os dentes, e fazer ele engolir a bosta. É bosta de gente, fede demais. O cara cagou na sacola e jogou pela janela de cima do ônibus.

Um homem esquálido, negro, com a feição extenuada, ergueu os braços se livrando da camisa azul melada de merda. Uma mulher chora depois de se contorcer e ver que suas costas estavam todas sujas de bosta. Olho mais atentamente, e percebo que era uma professora do CCPA, colégio onde estudei na infância. Sua filha estava no colo de uma amiga que estava sentada. Meu Deus, e se tivesse pegado na criança?

Alguns passageiros saltam no próximo ponto. E os que ficam aos poucos vão passando da indignação às pilhérias. Ah, tô na merda mermu! Ai caraio, que fedor, eu não agüento isso não! Todos já estavam rindo daquela insólita situação e achando tudo uma grande piada. Até que um homem tirou a bolsa cheia de merda do ônibus, e o fedor diminuiu, e as risadas diminuíram também.

Estava eu com Wenna e Ícaro esperando o Circular Shopping’s num ponto de ônibus lá no Augusto Franco. Dois homens segurando enormes pedaços de pau, dois homens segurando enormes pedaços de pau, eles correm, dois homens segurando enormes pedaços de pau vindo pra cá, o que eles querem? , pedaços de pau.

- Cadê o viadinho que tava aqui?- um homem negro, a boca cortada escorrendo sangue.

- Eu não vi, não- respondeu Ícaro.

- Não viu o quê, rapaz?

- Foi ele!- disse o homem branco que também segurava um pedaço de pau.

- Foi ele foi? Foi você o viadinho?- ele se aproximou de Ícaro erguendo o pedaço de pau, ele não vai bater em Ícaro, nós não vamos tomar uma surra, será que ele é tão imbecil? Ele está bêbado. Ícaro tá com medo, deu um passo pra trás, subiu na calçada.

- Eu não sei de nada, não, eu tava aqui- ele não consegue arranjar muitas palavras.

Encaro o homem branco que segurava o pedaço de pau. Um olhar que não era nem de ameaça nem de medo. Era uma ira plácida que intimida. Eu estava tranqüila, fria, porque não conseguia assimilar a cena que presenciava. O homem que acusou Ícaro percebeu que Wenna e eu éramos amigas dele, e sim, ele estava com a gente o tempo inteiro.

E se Ícaro estivesse sozinho naquele ponto de ônibus? E se Wenna e eu não estivéssemos lá? O que seria de Ícaro no meio de dois homens bêbados doidos pra bater no primeiro preto que aparecesse na frente? E daí se eles não sabem se é ele mesmo? Tome porrada!

Eles correm até se perderem da nossa vista. Tiros. Uns homens ao longe segurando pedaços de pau. Quem sabe?





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