Certa vez eu critiquei minha mãe por estar assistindo a uma novela. Ao que ela me respondeu:
- Deixa eu ver minha novela em paz. Eu já aguento um monte de coisa ruim o dia todo, quando chego em casa quero mais é descansar.
Foi aí que eu pensei: que direito tinha eu de falar aquilo? Nenhum. Comentei o episódio com dois amigos ontem à noite, e então, entre doses de vinho, meu amigo disse assim:
- Mas é isso mesmo. Quem tá na realidade precisa de um pouco de fantasia.
E eu respondi:
- O mundo funciona assim: realidade para quem vive na fantasia, e fantasia para quem vive na realidade.
Falei em termos bem simplistas, deixando pra lá toda a discussão sobre o real, a fantasia e as relações entre eles. E me lembrei do semblante de minha mãe assistindo a uma cena bastante evasiva de novela: os olhos brilhando com tanta ingenuidade, olhos esses que eu nunca vi nela em qualquer ocasião da realidade.
4 comentários:
Acho que a discussão é um pouco mais séria do que esta dicotomia pretendida entre fantasia X realidade, visto que fantasia pode ser também algo realista e vice-versa.
Já tive vários problemas parecidos com minha mãe, geralmente assentados no fato de que eu precisava da TV para assistir a outro programa, mas... Ela tem direito de ver o que acha que quer, né? As mãe TÊEM O DIREITO DE SEREM ASSIM. Ponto!
Beijão.
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também acho que essa dicotomia não existe.
essa minha conclusão na verdade foi uma auto-crítica, visto que eu me considero extremamente fantasiosa, vivo no mundo da lua, e procuro às vezes realidades duras em filmes, enquanto minha mãe já se deparou com realidades das mais adversas (como plantão de enfermeira em hospital público, como cuidar de parentes com doenças terminais).
No meu caso (e de minha mãe) a diferenciação cai por terra por completo: trabalho no DAA (ou seja, ouço gritos de 10 em 10 minutos), tenho um irmão viciado (filho dela), sofro discriminação violenta desde cedo por causa de minha sexualidade tosca (e não só) e minha mãe foi empregada doméstica até poucos anos, quando supliquei que ela largasse o trabalho antes que meu irmão vendesse a casa toda para comprar drogas. Nos filmes que vejo, busco identificação (olha só)... Que dicotomia pode haver aqui? (risos)
WPC>
não seria por não viver coisas duras.
é que todas as vezes que entro em contato com coisas muito duras, eu invento um mundo à parte.
já tomei bronca da minha mãe por isso.
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