As cadeiras nas portas e os olhares seguindo os passos do meu grupo de amigos lembram muito a atmosfera do interior. Não, não é uma cidadezinha nos confins de Sergipe, é o bairro Augusto Franco. A maior parte de seus moradores se diverte como nos pequenos municípios, e as praças ficam cheias de gente à noite, cantando em videokê, tomando uma cervejinha, vendo jogo de futebol pelas lentes da Globo, ou comendo algum sanduíche vagabundo.
Passeio pela periferia de Aracaju e fico admirada com o ar de tranqüilidade dos moradores do bairro, tão indolentes em suas cadeiras no meio da rua falando da vida alheia e auscultando os que passam. Depois de algumas horas, lá pras duas da manhã, as ruas ficam vazias, com uma ou outra pessoa vagando nos bares das praças, e meus amigos dizem que está tudo sob controle, “estamos em Beverly Hills”. Beverly Hills? Sim, isso mesmo, eles comparam o Augusto Franco àquele bairro de ricos que teve até um seriado homônimo na TV.
Nessa hora eu me lembro dos ricos, não daqueles distantes de nós lá nos States, mas dos que ficam bem pertinho, aqui no eixo Luzia-Jardins-Grageru-13 de Julho, onde moro por atrevimento na Adélia Franco. Bem, eu diria que os ricos não vivem em paz. Nas minhas andanças madrugada adentro, o que vejo nas suntuosas casas na 13 de julho são cercas elétricas denunciando o medo, e cães de guarda furiosos ladrando em varandas como se fossem saltar sobre nossas cabeças.
Entretanto, engana-se quem pensa que estou dizendo que a periferia, até porque o Augusto Franco nem é a genuína periferia de Aracaju, é o paraíso, e o olimpo das elites é o verdadeiro inferno. Não me esqueço de quando estava no Terminal D.I.A. e, certa vez, escutei uma senhora suada e cheia de sacolas falando da barbárie que tomava conta do seu bairro, o Padre Pedro. Ela disse que quase toda noite ouvia falar de facadas, muitas vezes em conhecidos seus, e a calamidade chegara a tal ponto, que famílias eram brindadas com cabeças de parentes nas suas portas. Aquela mulher falava num tom de horror, indignação, e descrença, uma combinação bastante comum em gente tão sofrida e sem ter a quem recorrer.
Nos vãos das noites de Aracaju, os ricos se aprisionam a sete chaves diante da desigualdade irrefreável, alguns pobres se divertem em seu mundo fantasioso interiorano achando que não têm nada a perder, e outros vivem do medo das facas. Há portas onde há gente em cadeiras sentada, outras com grades e cercas de choques, e ainda aquelas presenteadas com cabeças. E tudo é Beverly Hills. Será?
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