sexta-feira, outubro 21, 2005
Ladrões de bicicleta, de Vittorio de Sica
Ricci precisa de uma bicicleta para conseguir um emprego e melhorar as condições em que sua família vive. Mas esse trabalho só lhe será dado se ele tiver uma bicicleta, pois assim não precisará pegar os bondes lotados de Roma, e chegará cedo no serviço. Entretanto, a bicicleta de Ricci está quebrada, e sua mulher vende os lençóis das camas para que seu marido compre uma. Só que Ricci dá de cara com a má sorte e sua bicicleta é roubada. Daí por diante, ele segue com seu pequeno filho Bruno atrás dela.
Ele recorre à polícia e se depara com um sistema obsoleto e impune. O policial chega ao ponto de lhe mandar procurar sozinho a tal bicicleta por toda a Roma, e avisa que ela já deveria estar desmontada a essas horas. Ricci e Bruno se metem em várias enrascadas para recuperá-la, e, no final, o primeiro acaba roubando uma de alguém tão pobre quanto ele, é pego por um bando de homens que havia testemunhado a cena, mas é perdoado pelo pobre velho dono da bicicleta.
O ponto alto do filme é a busca incessante de Ricci por algo praticamente impossível. Ele não questiona em nenhum momento, na falta de uma consciência de classe, as injustiças a que foi submetido, como seu salário de fome, as péssimas condições do transporte público, e o sistema arcaico da polícia italiana. É interessante ver os trabalhadores se unirem em duas cenas do filme, quando Ricci diz ser Alfredo o ladrão, e os vizinhos dele tomam partido para defendê-lo da acusação, e na última cena, quando ele é capturado logo após roubar a bicicleta. A questão é: e se esses trabalhadores se unissem por uma causa maior, contra as injustiças a que são submetidos todos os dias, ao invés de fazer como Ricci, que procura sozinho por sua própria bicicleta? É emocionante ver no fim que personagem principal acabou por roubar um homem tão pobre quanto ele, o que leva o espectador a perguntar se não seria o ladrão alguém tão desesperado quanto o protagonista.
A esposa de Ricci tenta fazer algo por sua família, mas se sente impotente, e tenta ajudar dentro do que lhe é possível em sua condição de mulher. É ela quem dá a idéia de vender os lençóis da casa, e é graças a ela que a bicicleta é comprada. Mas quando recebe a notícia do roubo, sua única forma de lidar com a tragédia é orar e recorrer a uma charlatã para saber do destino de sua família. Ela fica perdida, apática, como muitas mulheres de seu tempo.
Ricci e seu filho estavam numa missa numa instituição de caridade atrás de um velho que eles supunham conhecer o ladrão. Não se sabe se era ele cúmplice, mas a grande ironia é que o velho estava ali, numa instituição de caridade, orando junto com um monte de miseráveis, esperando pela ajuda de um Deus, e, principalmente, pela refeição ao fim da missa. E também não se sabe se foi Alfredo quem roubou a bicicleta, mas vê-se a pobreza em que ele vive junto com sua mãe.
Uma cena que ilustra perfeitamente os antagonismos entre as classes sociais é quando Ricci vai a um restaurante com o pequeno Bruno fazer uma farta refeição e tomar vinho, e a criança come inocentemente como se estivesse em
casa. Ele mostra a mesa ao lado, onde estão pessoas abastadas, e ensina: “Veja, você tem que comer como eles”. É só o que os mais pobres fazem em sua condição de alienados, procurar suas próprias bicicletas, e querer comer como eles.
Obs: Escrevi sem a intenção de fazer uma crítica de cinema, até porque não tenho cacife pra isso. Escrevi como mera espectadora cinéfila.
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