Desde criança minha mãe me ensinou a ter medo de borboletas. Então eu voava para capturá-las, e depois as comia. Ela também me disse para ter nojo de moscas. Então eu prendia duas no copo de vidro e ficava observando na esperança de serem macho e fêmea, querendo que elas fizessem coisas como o casal da novela da TV. Queria muito sentir as borboletas voando na minha barriga, mas nada. Eu esperava ver asas no meu cocô, todavia era sempre um cocô como qualquer outro. As moscas se debatiam sob o meu olhar de vigília, até que eu me cansava e as deixava lá, presas num copo em cima da minha janela.
Certa vez, quando eu era bebê, mamãe foi trocar minha fralda e saiu para atender ao telefone. Quando ela voltou, estava eu lá, todo maroto, brincando e me lambuzando com o cocô. Ela gritou “mas menino!”, e foi me dar um banho rindo daquela insólita situação que contaria mais tarde para as amigas. Depois de um tempo, não sei como, eu aprendi a ter nojo de cocô e gritava por mainha para vir limpar minha bunda. Foi duro, mas aprendi a me limpar sozinho quando certo dia eu chamei seu nome e não havia ninguém em casa. Esperei mais ou menos uma hora por ela sentado no troninho, até que, finalmente, olhando o papel com muita resistência, eu me limpei sozinho. Logo depois, mamãe chegou e eu fui correndo lhe contar cheio de orgulho as aventuras que me levaram a ser um hominho.
Às vezes eu brincava com meu pinto, e sentia uma vontade danada de fazer xixi, aí ele crescia, para meu espanto, eu ia até o banheiro, mas nada de fazer xixi. Era gostoso sentir o pinto crescer, então vez por outra eu brincava com ele, e de vez em quando alguém me surpreendia. Minha mãe me chamava de safado e meu pai dizia que eu era um machinho danado. Não sei como, mas aprendi a ter vergonha do meu pinto, e mais tarde fui fazer isso escondido no banheiro.
Certo bicho verde me causava um misto de admiração e medo, igual ao que a gente sente por Deus, então eu corria e pedia para minha mãe matá-lo. Mas ela nunca fazia isso, dizia que o tal bicho era bonito, inofensivo, e seu nome era esperança. Entretanto, eu nunca achei a esperança bonita, e sempre tive medo dela, corria por entre os móveis da casa enquanto minha doce mãe sorria e brincava com a criatura verde no braço.
Eu rezava todos os dias o Santo Anjo, o Pai Nosso, e a Ave Maria antes de dormir, porque quem não reza, dizia minha avó, o bicho papão pega de noite. Então eu falava com um Deus que eu não conhecia, e tinha medo do bicho papão, que eu não sabia exatamente o que era, assim como Deus. Mamãe dizia para eu não pecar porque senão Ele ia me castigar. Então eu achava que Deus era um guarda dela, sempre de vigília, esperando eu fazer alguma travessura para ir lhe contar. Mas eu fazia muitas coisas que minha mãe nunca percebia como comer doce escondido no quarto antes do almoço, e aí me dei conta de que Deus não existia, era só um jeito de ela me impedir de fazer coisas gostosas.
Deixo meu filho gritar meu nome até chorar, mas não limpo a sua bunda. Nunca o chamei de nome nenhum ao pegá-lo brincando com o pinto, mas ele, com o tempo, foi se esconder no banheiro. Não o ensinei a rezar, mas vez por outra ele chama o nome de Deus quando não estudou para a prova. Eu me perguntava por que minha mãe me ensinou a ter medo de borboletas, aí percebi que ela tinha pavor delas, não sei, nem ela, a razão. E meu pequeno corre pra mim e me abraça forte, com desespero, quando vê alguma bela esperança voando soberba e assustadora de um canto a outro da casa.
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