“A criação de um mercado comum de imagens é um dos desafios da busca de uma cultura dita global” (Mattelart, 2002)
Costumamos ir ao cinema no shopping e assistir a filmes estadunidenses. Por trás dos cartazes e das grandes telas existe um imenso mercado cinematográfico em que são vendidos cerca de 10 bilhões de ingressos por ano.
Na indústria cinematográfica, normalmente as produções estadunidenses correspondem a 85% do público de cinema no mundo. Na América Latina não é diferente, e por volta de 85% dos filmes exibidos nos cinemas na região são produções vindas dos EUA. Em países como Costa Rica e Chile a dominação do cinema estadunidense no mercado é ainda maior, e as películas provenientes de Hollywood representam 95% do mercado.
A indústria cinematográfica faz parte dos intercâmbios de bens culturais. Três quintos dos fluxos de bens culturais provém de 13 países, sendo que 87% dos lucros produzidos através de bens culturais e meios de comunicação de massa se concentram na comunidade européia, no Japão, e nos EUA. Apenas 13% dos lucros pertencem aos demais países do mundo.
A atividade cinematográfica apresenta três fases: produção, distribuição, e exibição. Os estúdios são responsáveis pela produção do filme. As empresas distribuidoras promovem a publicização e comercialização das produções. As exibidoras projetam os filmes nas salas de cinema.
Os Estados Unidos dominam as três fases do mercado cinematográfico. Quanto à produção, os grandes estúdios se localizam em Los Angeles, e conhecemos os letreiros de Hollywood. Atualmente, existem sete grandes estúdios de produção: Disney, Warner Bros, MGM-UA, Sony Pictures, Paramount, Universal 20th Century Fox. Desses, Sony, Universal e Fox são propriedades, respectivamente, de companhias originárias do Japão, Canadá e Austrália. Segundo o inglês David Puttnam, antigo chefe da Columbia Pictures, pertencente à Sony, hoje em dia nenhuma companhia de entretenimento fora dos Estados Unidos é capaz de distribuir uma película em todas as nações da Europa.
As empresas que dominam a distribuição são as majors, ou distribuidoras filiadas aos estúdios estadunidenses que distribuem os seus produtos em todo o mundo. As maiores empresas do setor formam grandes conglomerados através da integração vertical entre produção, distribuição e exibição. Octavio Getino faz a seguinte classificação com relação às distribuidoras latino-americanas:
Distribuidoras estrangeiras: seriam filiais das majors e responsáveis pela comercialização apenas dos filmes dos estúdios a que estariam vinculadas. Algumas delas seriam UIP, Buena Vista, Columbia Tristar.
Distribuidoras locais de filmes estrangeiros: seriam conhecidas como “independentes” e, segundo a definição de Getino, são formadas por capital local e não teriam vínculo com nenhum estúdio, mas selecionariam os filmes a serem comercializados em festivais, como por exemplo, Lumière, Art films, Europa filmes.
Distribuidoras nacionais: são formadas por capital local e a maior parte dos filmes que comercializam é nacional. No Brasil, um exemplo desse tipo de distribuidora foi a Embrafilme, criada durante o governo militar.
As empresas exibidoras estrangeiras são donas das multiplex, ou salas múltiplas que ficam em shoppings e se localizam em centros urbanos. Elas costumam apresentar filmes blockbuster, que estream simultaneamente em centenas de cidades nos cinco continentes. O grande número de filmes blockbuster nas salas de cinema tem relação também com as estratégias de distribuição, pois 95% dos filmes comercializados pelas majors são dessa categoria.
Os números de salas e de espectadores vinham caindo vertiginosamente na América Latina, até que com a chegada das multiplex voltaram a crescer. Entretanto, as salas de cinema ficam concentradas nas grandes cidades, pois as grandes empresas exibidoras só se interessam pelas cidades com mais de 400 mil habitantes.
É importante salientar que a dominação dos Estados Unidos no mercado cinematográfico não é produto de forças do mercado que operam a favor de Hollywood. A atividade cinematográfica estadunidense nasceu com forte impulso estatal, dado que se mostrava um mercado promissor. O governo dos Estados Unidos apoiou o desenvolvimento de sua cinematografia nos mercados externos, especialmente através dos Departamentos de Comércio e de Estado.
Se em qualquer país latino-americano os filmes hollywoodianos representam de 70% a 100% das produções exibidas, nos Estados Unidos 93,9% dos filmes exibidos em 2002 eram daquele país.
O mercado doméstico de cinema dos EUA é o maior do mundo. Os Estados Unidos têm o maior número de salas por habitante, e há 26 mil salas e cerca de 1,2 bilhões de espectadores, sendo que 98% dos longas comercializados nesse país são ali produzidos . O preço do bilhete custava aproximadamente 6,03 dólares em 2004, e a arrecadação foi em média 9,491 bilhões de dólares nesse mesmo ano.
Em 2003, os EUA tinham por volta de 12,3 salas para cada 100 mil habitantes, e a freqüência dos espectadores era de em média 5,39 vezes ao ano . A arrecadação do mercado cinematográfico estadunidense em 2004 foi superior em 92% à arrecadação da União Européia, conjunto de países que ocupa o segundo lugar em ingressos em bilheterias de cinema.
Um dos elementos da concorrência desleal nos mercados cinematográficos na América Latina é o fato de que as empresas produtoras estadunidenses pagam os custos de seus filmes já no seu país, que apresenta um amplo mercado doméstico, enquanto que as latino-americanas terão ainda de conquistar seu mercado interno para obter algum lucro. O lucro das empresas produtoras estadunidenses nos países da América Latina é neto, menos os custos com publicidade e cópias.
A atividade cinematográfica no mundo apresenta grandes desigualdades quando, por exemplo, os Estados Unidos detém com a ajuda de diversos subsídios 10% da produção mundial, e 90% do mercado de distribuição . Dentro da América Latina também existem grandes desigualdades.
“Mas se a linha divisória Norte/Sul já não basta para definir o atual estado do planeta, as desigualdades estruturais das décadas anteriores não sumiram assim. O que perturbou a representação maniqueísta do mundo foi que o Norte descobriu seu próprio território dos Suis e que, no coração mesmo do Sul, emergiram Nortes que trazem consigo seus Suis” (Mattelart, 2002)
Num país como a Argentina, com 38,6 milhões de habitantes, e PIB de 249,9 bilhões de dólares, são feitos em média 90 filmes por ano com a ajuda de 25 milhões de dólares em subsídios estatais, enquanto que no Uruguai, com 3,4 milhões de habitantes, e PIB de 12 bilhões de dólares, a média é de 3 filmes por ano, e há escassos investimentos públicos.
Considerando que os filmes latino-americanos têm pouca aceitação no exterior e devem reverter os custos no mercado interno, enquanto que os EUA têm um amplo mercado interno e a produção cinematográfica estadunidense tem respaldo em todo o mundo, fica difícil para um país como o Uruguai ter atividade cinematográfica sem políticas públicas de incentivo à produção audiovisual. Sem incentivo, nem Brasil, Argentina, ou qualquer país latino-americano teria cinema.
A formação de leis audiovisuais nos países latino-americanos, além das iniciativas de co-produção são essenciais para o desenvolvimento da cinematografia da região.
Bibliografia:
MATTELART, Armand. A globalização da comunicação. Bauru: EDUSC, 2002. Cap. VI.
GETINO, Octavio. El cine en el Mercosur y países asociados.
MORAES, Denis. A hegemonia das corporações de mídia no capitalismo global.
ARAÚJO, Taíssa Helena de Barros e CHAUVEL, Marie Agnes. Estratégias de promoção no lançamento de filmes norte-americanos no mercado brasileiro: um estudo de caso.
ARIAS, Fernando. Diversidad cultural en la exhibición cinematográfica en la Argentina.
RUIZ, Enrique E. Sánchez. El empequeñecido cine latinoamericano e la integración audiovisual.
PERELMAN, Pablo e SEIVACH, Paulina. La industria cinematográfica en la Argentina: entre los limites del mercado y el fomento estatal.
ROVITO, Pablo. Reflexiones sobre la exhibición cinematográfica en la Argentina.
Tatiana Hora
Parte do meu relatório.
8 comentários:
Muito bom! Foi bem esclarecedor quanto aos porquês do sucesso Hollywoodiano. Parece que investir na produção filmes por conta do óbvio benefício cultural, não é suficiente aos Estados latino-americanos. Eu apoiaria, já que detesto boa parte dos filmes 'blockbuster'. Não por ideologia, mas pq acho-os muito xoxos, muito mais-ou-menos.
Só achei seu texto um pouco pesado ao público leigo - no qual me incluo. É uma pancada na cara, toda essa tijolada de dados. Enfim, eu até compreendo, porque é parte de um relatório... kkkkk!
pô, eu não curto muito dados também não, viu? mas nessa pesquisa eles eram essenciais. gostei de ter pesquisado sobre o assunto, apesar de não curtir números e tal.
ah sim, e obrigada por ter elogiado essa parte do meu trabalho. eu me fudi tanto pra fazer esse bendito relatório!
Eu também gostei das matérias anteriores: sobre o cinema em Sergipe, sobre doação de leite. É que não costumo comentar que só "gostei". Me parece um tanto superficial, ambíguo até. =)
eu acho que vc deveria publicar isso no overmundo. já está virando febre aquele troço lá. e diga-se de passagem, tem umas pessoas que adorariam comentar coisas do tipo: "é, mas como podemos constatar no livro 'A gênese do mundo capitalista na rota do cinema hollywoodianos na mente de kafka e james joyce' que a vida é uma caixinha de surpresas"
adoro o overmundo, pqp!
tá, nada a ver com o texto, so to tentando te incentivar :P
sim, sexta eu já chamei thiago e vou falar com debora e lu pra gente ir tomar umas no acapulco. bora?
ah. esqueci de dizer, mas ainda dá tempo: se achou, hein nega?
texto maravilhoso. vc se daria bem escrevendo artigos. e livros. ainda quero aquele "A soluçao do mundo é a putaria" autografado
:*
ah. esqueci de dizer, mas ainda dá tempo: se achou, hein nega?
texto maravilhoso. vc se daria bem escrevendo artigos. e livros. ainda quero aquele "A soluçao do mundo é a putaria" autografado
:*
kkkkkkkkkkkkk
essa débora...
oxe, minha fia, tá marcado!
agora, eu apareço depois da minha aula de psicologia, que vou apresentar um trabalho na sexta.
tô com saudades de vocês #)
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