domingo, fevereiro 21, 2010

Voltei, Recife, foi a saudade que me trouxe pelo braço - parte 1

Quando me disseram que eu ia me arrepender de fazer uma viagem assim tão rápida pra Pernambuco numa folga de três dias, eu achei muito absurda tal afirmação. Com meu espírito aventureiro, só por entrar no ônibus às 23h partindo para Recife, numa viagem de 8h de duração, eu já estava satisfeita, pois meu lugar é a estrada. E lá vamos nós!

O ônibus atrasa um pouco, uma agonia danada, poucas pessoas embarcando. Afinal, já era domingo de carnaval. Quem tinha que ter ido, já havia partido, certo? Errado! Lá estava eu, depois de dar duro trabalhando de repórter no sábado e no domingo o dia inteiro, indo embora ansiosa e encantada pra minha verdadeira cidade: Recife.

No escurinho do ônibus, tentava me ajeitar na poltrona pra ver se tirava um cochilo. Entre um cochilo e outro, olhava pela janela as paisagens desse Nordeste do tamanho do mundo, ou reparava nas minhas coisas, afinal, estava viajando sozinha. Mas minha grande paixão era a janela do ônibus. Tenho essa relação conspícua com os espaços. Vivo buscando o paraíso por aí.

Também havia a preocupação com a estrada. Dizem que é muito comum assaltar ônibus à noite com destino a Recife, que ali é uma estrada perigosa. Então quando ônibus parava, eu tinha um sobressalto, ficava atenta... ainda mais quando vi o motorista parar o ônibus e sair correndo na estrada no meio daquela escuridão sem casas... mas provavelmente ele só tinha ido ver algo no motor, não sei...

Enfim chego a Recife! Foi algo inusitado. Estava dormindo, quando alguém me cutuca. Era um mudo apontando para a janela do ônibus e mandando eu sair dali. Fiquei confusa. Afinal, me disseram que eram 8h de viagem, e eu tinha saído às 23h e ainda eram 5h30. Olhei em volta e vi o ônibus vazio. Desci e tive vergonha de perguntar ao motorista se ali era mesmo Recife. Então resolvi perscrutar ao redor, até ver uma placa da prefeitura de Recife, o símbolo da bandeira de Pernambuco espalhado por diversos lugares da rodoviária. Sim, eu estava na terra prometida!

Ao entrar no táxi, o motorista me perguntou: qual o seu destino, moça? Eu respondi: Várzea! Com o gosto de quem conhecia aquelas bandas, e não de quem não sabe ao certo pra onde vai. Eu vou pra Várzea, e é na Várzea onde vai tocar a Nação Zumbi!

Bati na porta com medo de ficar trancada do lado de fora. Eu sabia que ia encontrar bêbados de ressaca, e deduzia que não iam abrir a porta pra ninguém às 6h da manhã. Mas bastou uma batidinha na porta para um rosto desconhecido aparecer com cara de interrogação e eu ver mais colchões e mais gente do que eu esperava espalhada pelo pequeno apê. Ele não perguntou nada, apenas esperava que eu me explicasse. Tava com cara de quem tinha acabado de chegar do Recife Antigo.

- Cadê Anderson?

- Acho que tá dormindo. Pode entrar, entra aí.

A partir de então soube que Anderson era a senha de acesso. Diante de caras de estranhamento que me olhavam como se eu fosse uma intrusa, bastava eu citar o nome dele que logo recebia um abraço e ouvia um "ah, então você é amiga de Anderson!".

Ajeitei-me num cantinho de um quarto entupido de gente pra tirar um cochilo. Eu queria mais era já ir direto pra Olinda, mas sabia que não ia arrumar nenhum bêbado pra ir junto. E quando já estava pegando no sono, alguém me cutuca. Era um menino ruivo, cabelos crespos grandes e barba, me avisando em linguagem embriagada que aquele era seu cantinho. Eu me fiz de desentendida e voltei a dormir. Ele foi se deitar na cama de um menina, que ao vê-lo ali deu um piti.

- Não tenho culpa se meu lugar de dormir era ali e roubaram meu canto.

E cochilei, ignorando toda a muvuca da casa.

Ao me acordar, eu já sabia que era de tarde, e precisava ir com urgência para a cidade dos sonhos: Olinda.

Um comentário:

guives disse...

é eu passei por isso tambem, cheguei depois e tive que dizer a mesma senha: "Anderson mora aqui?" ai entrei. :D